31 julho 2024

“Estranho Caminho" - Com mineiro de Santa Tereza, obra é poesia sobre caos

O roteiro de Guto Parente habilmente mescla elementos dramáticos, psicológicos e fantásticos (Fotos: Sinny Assessoria)


Silvana Monteiro


Chega aos cinemas nesta quinta-feira (1⁰ de agosto), o longa "Estranho Caminho", do diretor Guto Parente, vencedor de 16 prêmios nacionais e internacionais, com destaque para o Festival de Tribeca 2023 (EUA), onde conquistou as estatuetas de Melhor Filme, Melhor Roteiro para Guto Parente, Melhor Fotografia para Linga Acácio e Melhor Performance para Carlos Francisco. 

Também venceu os prêmios de Melhor Roteiro (Guto Parente) e Melhor Ator Coadjuvante para o ator mineiro Carlos Francisco no Festival do Rio, e Melhor Filme da Mostra Autorias da 27ª Mostra de Cinema de Tiradentes 2024 (Brasil). O filme está em exibição no Centro Cultural Unimed-BH Minas e no Cine Una Belas Artes.


Com uma história que se passa em meio à turbulência da pandemia que assolou o mundo, o diretor cearense Guto Parente fez um filme inspirado em sua trajetória pessoal. "Estranho Caminho" permite que o espectador entre de cabeça no caos e na poesia da busca pela realização de sonhos, das conexões e relações familiares, das adversidades e do autoconhecimento.

O protagonista David, interpretado por Lucas Limeira, é um jovem cineasta que retorna à sua cidade natal, Fortaleza, para apresentar seu filme em um festival. Porém, sua chegada é no famoso estilo expectativa x realidade. Seu caminho é repleto de percalços - desde o momento em que põe os pés na cidade, até não encontrar acolhida entre amigos, sofrer com a violência do lugar e se ver perdido em meio às restrições de uma crise sanitária. 

Esse desencontro com o seu lugar de origem e com o sonho de levar a público sua arte, é o ponto de partida para um enredo dramático com toques de fantasia e trama psicóloga. 


Ao se ver forçado a reencontrar o pai, Geraldo, interpretado por Carlos Francisco, com quem não fala há anos, David enfrenta seus próprios demônios e questionamentos sobre seu passado e sua carreira artística. 

O roteiro de Parente habilmente mescla elementos dramáticos, psicológicos e fantásticos, criando um universo compativelmente estranho com o fato de tentar entender o que é uma pandemia, ao mesmo tempo, instigante e intimista, páreo para uma convivência forçada. 

O ator Carlos Francisco, mineiro de Belo Horizonte, nascido e criado no bairro de Santa Tereza, interpreta Geraldo com tanta maestria que recebeu os prêmios de melhor ator coadjuvante no Festival do Rio 2023; melhor performance no Festival Tribeca, EUA, 2023, e melhor atuação no Festival da Fronteira, no Brasil em 2023. 


Em relação à fotografia, Linga Acácio, com seus jogos de luz e sombra, contribui para a atmosfera onírica e perturbadora do filme. Já a trilha sonora de Uirá dos Reis e Fafa Nascimento adiciona camadas de profundidade e reflexão à narrativa. O elenco, composto majoritariamente por atores cearenses, entrega performances impactantes e repletas de nuance.

"Estranho Caminho" é uma obra que desafia os gêneros convencionais, trazendo uma experiência cinematográfica estranha e provocativa. Parente consegue falar sobre temas universais, como as complexidades da família e da identidade, por meio de uma lente altamente pessoal e poética. 


É um filme que eu resumiria com os versos de um poeta, não do sertão cearense, mas do sertão mineiro, João Guimarães Rosa, em "Grande Sertão: Veredas": “Todo caminho da gente é resvaloso. Mas; também, cair não prejudica demais – a gente levanta, a gente sobe, a gente volta! (...) O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem.”


Ficha técnica
Direção: Guto Parente
Produção: Tardo Filmes
Distribuição: Embaúba Filmes
Exibição: Centro Cultural Unimed-BH Minas e Cine Una Belas Artes
Duração: 1h23
Classificação: 14 anos
País: Brasil
Gêneros:
drama, documentário

27 julho 2024

"Deadpool & Wolverine" - um filme feito para os fãs dos super-heróis da Marvel

Ryan Reynolds e Hugh Jackman protagonizam o longa recheado de sarcasmo, piadas e violência
(Fotos: Marvel Studios)


Jean Piter Miranda e Maristela Bretas


Sarcástico, divertido, violento (e põe violento nisso) e nostálgico. Tudo isso numa só produção e ainda por cima, de super-heróis muito queridos. Este é "Deadpool & Wolverine", um filme feito para delírio dos fãs do Universo Cinematográfico da Marvel (MCU). 

O longa faz a gente pular na cadeira cada vez que um personagem icônico ou uma cena que remete a filmes passados dos dois heróis aparece na tela. Quem não assistiu aos anteriores e também às séries não terá condições de entender o que se passa. 


E não são poucas as referências, cada uma melhor que a outra, bem saudosistas e com comentários no estilo do anti-herói que conquistou o público. Os dois primeiros filmes dele - "Deadpool" (2016) e "Deadpool 2" (2018) foram produzidos pela 20th Century Fox. Em 2019, a Disney adquiriu a produtora e com isso o personagem passou a integrar o MCU. 

Nessas duas primeiras produções, Deadpool já fazia diversas brincadeiras sobre pertencer ao MCU e às questões de direitos autorais. Um humor peculiar que foi muito bem aceito e ganhou milhares de fãs. Agora, ao lado de Wolverine, essas piadas estão ainda mais ácidas e feitas bem na medida.


As cenas de ação são bem coreografadas e contam com ótimos efeitos especiais. Inclusive nas cenas de câmera lenta. A sincronia com as músicas e o sangue completa o espetáculo. Sim, tem muito sangue. O que justifica a classificação indicativa de 18 anos, o primeiro dessa faixa no MCU. 

A trilha sonora é imbatível, trazendo clássicos que vão de AC/DC, NSYNC, Avril Lavigne, Green Day, The Platters, Fergie, Huey Lewis & The News aos sul-coreanos Stray Kids, além de outros sucessos do passado. 

Mas o grande e esperado momento, apresentado nos primeiros trailers do filme, é "Like a Prayer", de Madonna, num dos melhores momentos do longa.


"Deadpool & Wolverine" aborda o multiverso e a trama é toda em cima disso, deixando clara a ligação com o Universo Marvel. O mesmo multiverso aberto por "Homem-Aranha: Sem Volta pra Casa" (2021) que criou a possibilidade de interação com outras obras. Ou seja, qualquer filme pode ser retratado como outro universo e interagir com o heróis da produtora. 

Cada personagem pode ter outra versão de si em outro mundo. Esses outros mundos foram muito bem explorados em "Doutor Estranho no Multiverso da Loucura" (2022), com várias participações especiais. Uma produção que trouxe inclusive ingredientes de filmes de terror para o MCU. 


De novidade, "Deadpool & Wolverine" leva o humor da Marvel para outro nível. Super escrachado, debochado, irônico e com piadas metalinguísticas, que fazem referências a outros filmes. Além disso, o longa frequentemente “quebra a quarta parede”, quando o personagem olha para a câmera e conversa com o público. Isso é mantido de forma bem acertada. 

Na trama, Deadpool precisa recrutar Wolverine (que morreu em "Logan" - 2017) para salvar seu mundo e seus amigos dos dois filmes anteriores, incluindo a amada Vanessa (Morena Baccarin) de ser destruído. 

A vilã da vez é a bela e cruel vilã Cassandra Nova (Emma Corrin em ótima interpretação), que comanda uma gangue de excluídos de vários mundos - novamente várias referências ao MCU e aos X-Men.


O longa também traz boas surpresas para os fãs, especialmente sobre super-heróis do passado, o que o torna ainda mais interessante. É daqueles filmes que você quer assistir mais de uma vez para relembrar as histórias ou matar a saudade. Tem tudo para ser o melhor dos três de Deadpool e um dos melhores de Wolverine. 

Pelo desempenho já na pré-estreia, o filme promete ser o novo sucesso de bilheteria da Marvel e bater recordes, como aconteceu com "Vingadores: Ultimato" (2019). 

Segundo previsões, o valor gasto de US$ 300 milhões com a produção (US$ 100 milhões só de cachê de Hugh Jackman) poderá ser compensado já neste primeiro final de semana, tornando-se a maior estreia global para um filme indicado para maiores de 18 anos.


Ryan Reynolds definitivamente nasceu para o papel de Deadpool/Wade Wilson e além de produtor, ele também é autor de algumas das frases usadas pelo personagem (a cara dele). Ganha inclusive mais tempo de tela que seu parceiro, proporcionando os momentos mais divertidos, chocantes e sem noção.

Já Hugh Jackman será eternamente o Wolverine/Logan dos X-Men que todos curtem nos filmes, mas resgatando o herói dos quadrinhos, com o uniforme azul e amarelo. 

Não podia ser outro ator para interpretar o super-herói mal-humorado com uma raiva latente e sempre pronto a explodir ou cortar alguém com suas garras de adamantium, especialmente se for Deadpool. Os dois em tela se completam e dão show. 


Comédia, violência para uma classificação 18 anos, multiverso, novos mundos e novos personagens. Definitivamente, o MCU não está acabado, saturado ou em decadência. Há bons filmes, outros medianos e uns bem fracos. Sim, a Marvel errou e acertou ao longo dos anos. Mas não se esgotou e segue firme e forte. 

Muitos achavam que a Disney iria mudar o super-herói mais polêmico e escrachado do cinema, que choca quem não está preparado para tanto palavrão, frases de sacanagem e lutas com mortes violentas. 

Mas "Deadpool & Wolverine" mostra que é possível o MCU trazer novidades e criar mais e mais filmes, interligados ou não. Os milhões de fãs pelo mundo esperam por isso e agradecem.


Ficha técnica:
Direção: Shawn Levy
Produção: Marvel Studios, 20th Century Fox Film
Distribuição: Disney Pictures
Exibição: nos cinemas
Duração: 2h07
Classificação: 18 anos
País: EUA
Gêneros: comédia, ação, ficção

25 julho 2024

"Teca e Tuti: Uma Noite na Biblioteca" - uma aventura pelo mundo mágico da leitura

Animação infantojuvenil começou a ser feito em 2012, utiliza técnicas de live-action e de animação em stop-motion (Fotos: Rocambole Produções)


Felipe Matheus


Diversão e a paixão por livros. Estes são os maiores atrativos da animação “Teca e Tuti: Uma Noite na Biblioteca”, que estreia nos cinemas nesta quinta-feira (25), sob a direção de Diego M. Doimo, Eduardo Perdido e Tiago Mal. Ele pode ser conferido no Una Cine Belas Artes, na Sessão Vitrine às 15 horas, com ingressos a R$ 20,00 (inteira) e R$ 10,00 (meia)

O filme aborda a importância da leitura nos dias atuais e a necessidade de incentivar as pessoas a voltarem a ler livros, deixando um pouco de lado o mundo digital.


Na trama, a traça Teca (voz original de Luy Campos), vive com sua família e seu fiel ácaro de estimação, Tuti (Hugo Picchi), em uma caixa de costura. O que eles mais gostam é devorar papel, mas quando Teca aprende a ler, percebe que os livros não podem ser comidos, pois guardam as histórias que ela adora. 

Decididos a resolver um grande mistério, Teca e Tuti partem para a biblioteca, em busca da história mais importante de suas vidas.


O longa, que começou a ser feito em 2012, utiliza técnicas de live-action e de animação em stop-motion. Cada boneco é único, e com o uso de fotografias e cenários diversos, a mágica do filme ganha vida nas telas. Eduardo Perdido, roteirista e diretor, animou cerca de 75% das cenas. 

Foram necessárias quase 30 mil fotos para fazer os bonecos se movimentarem, cantarem e andarem. Tudo acontece por meio de sequências de fotografias, usando bonecos articulados em cenários construídos e montados dentro de um estúdio.


Produzido pela Rocambole Produções e lançamento pela Sessão Vitrine Petrobras, o filme conta com canções inéditas e originais de Hélio Ziskind, que compôs temas de programas como Cocoricó e Castelo Rá-Tim-Bum, e de Ivan Rocha. A direção de arte é de Mateus Rios, ilustrador de livros infantis, como “Ela Tem Olhos de Céu”, de Socorro Acioli.

Em “Teca e Tuti: Uma Noite na Biblioteca”, cada personagem tem uma história diferente e essa conexão traz uma narrativa dinâmica e alegre para os espectadores que embarcam nessa grande aventura. Afinal, nunca é tarde para conhecer grandes obras da literatura e viver aventuras, seja com “Dom Quixote” ou com “Alice no País das Maravilhas”.


Ficha técnica
Direção: Eduardo Perdido, Tiago MAL e Diego M. Doimo
Produção: Rocambole Produções
Distribuição: LPB Content e codistribuição com a Vitrine Filmes
Exibição: Una Cine Belas Artes, na Sessão Vitrine às 15 horas, com ingressos a R$ 20,00 (inteira) e R$ 10,00 (meia)
Duração: 1h15
Classificação: Livre
País: Brasil
Gêneros: animação, infantojuvenil, aventura

23 julho 2024

"Como Vender a Lua" é o marketing bem feito para manter um sonho americano

Comédia romântica tem ótimo elenco e bons efeitos especiais que seguram o roteiro (Fotos: Sony Pictures)


Maristela Bretas


Quem hoje está na faixa acima dos 60 anos e acompanhou com olhos colados na tv a famosa imagem do primeiro homem a pisar em solo lunar, vai sentir uma pontinha de saudade no peito ao rever. 

Pois esta cena e muitas outras marcantes estão no longa "Como Vender a Lua" ("Fly Me to the Moon"), filme em cartaz nos cinemas que tem como protagonistas Scarlett Johansson e Channing Tatum. Quase uma homenagem aos 40 anos do evento, ocorrido em 20 de julho de 1969.


Dirigido por Greg Berlandi, o longa explora o marketing montado para divulgar a importância de se manter o projeto espacial Apollo para os Estados Unidos melhorarem a imagem pública da NASA. Somente com o pouso na Lua o governo norte-americano conseguiria recuperar a liderança da corrida espacial, perdida para a Rússia na década de 1960.

Johansson é Kelly Jones, a especialista em marketing de passado nebuloso convocada para este difícil trabalho. E para evitar mais uma falha (outros lançamentos terminaram em destruição e tragédia), ela é convocada pelo assessor do governo Moe Berkus (Woody Harrelson) a criar um Plano B - encenar um pouso na Lua fake com transmissão ao vivo.


Essa é inclusive uma das maiores teorias da conspiração, que vem atravessando décadas: o homem realmente pisou na lua ou foi tudo uma grande produção cinematográfica no estilo Hollywood, que teria sido filmada por Stanley Kubrick? 

O filme é uma aula de marketing da enganação e convencimento, que chega a colocar novamente esta pulga atrás da orelha do espectador.

O que Kelly não esperava era conhecer o diretor de lançamento da Apollo 11 e ex-piloto de combate, Cole Davis (Tatum), que vive a vida pelo sucesso da missão e não aceita sofrer mais uma falha. 

Especialmente agora que o mundo inteiro estará acompanhando pela TV. Ele terá de se unir à marqueteira para garantir que tudo dê certo e o plano seja bem convincente.


Além das armações, mentiras e situações engraçadas, "Como Vender a Lua" também pincela questões delicadas da época, como a Guerra do Vietnã, as missões à Lua desastrosas, inclusive com mortes de tripulantes, e a Guerra Fria, mas sem aprofundar em nada. 

O roteiro é simples, sem muitas novidades, mas o emprego de imagens antigas, os ótimos efeitos visuais e sonoros e as interpretações seguram o longa.

O elenco está bem afinado, com Scarlett (que também é produtora do filme) e Tatum entregando interpretações simpáticas e divertidas em algumas situações. Harrelson também não fica para trás como o agente inescrupuloso do governo, assim como Anna Garcia, como Ruby, assessora de Kelly, e Jim Rash, como Lance, da equipe de lançamento de Cole.    


Destaco (por gostar muito do tema) do filme as imagens dos lançamentos de foguetes que tomam a tela, e a famosa frase dita pelo astronauta Neil Armstrong: "esse é um pequeno passo para o homem, mas um gigantesco salto para a humanidade".

"Como Vender a Lua", assim como seus protagonistas, é simpático, leve e bom de ser assistido no cinema. Uma viagem no tempo que ainda emociona aqueles, como eu, que acompanharam os fatos na época. Vale conferir.


Ficha técnica
Direção:
Greg Berlandi
Produção: Apple Original Films
Distribuição: Sony Pictures
Exibição: nos cinemas
Duração: 2h12
Classificação: 12 anos
País: EUA
Gêneros: comédia, romance

21 julho 2024

"Eu Sou: Celine Dion" um relato da fragilidade e dos dias sombrios da artista

Documentário mostra o amor da artista em se apresentar em público, o desejo de voltar aos palcos e a paixão por sapatos (Reproduções Prime Video)

 

Marcos Tadeu


"Eu Sou: Celine Dion" é um dos bons documentários que vale a pena ser assistido no Prime Video. A produção revela um lado desconhecido da cantora canadense, mostrando sua rotina diária entre os afazeres de uma estrela, a vida doméstica, os momentos de vulnerabilidade. Além da paixão por sapatos - mais de 10 mil pares de diversos tamanhos -, guardados num depósito em Las Vegas, cidade onde a artista mora.


Celine Dion alcançou fama mundial nos anos 1990 com sucessos como "My Heart Will Go On" (da trilha sonora de "Titanic”), "The Power of Love" e "Because You Loved Me". Ganhou cinco Grammys Awards, incluindo Álbum do Ano e Melhor Performance Vocal Pop Feminina. 

E foi na entrega do Grammy de 2024, no dia 4 de fevereiro, que ela fez uma aparição surpresa ao anunciar o prêmio de Melhor Álbum do Ano, conquistado por Taylor Swift.

Conhecida por sua poderosa voz e emocionantes baladas, Dion vendeu mais de 200 milhões de álbuns globalmente. Além de sua carreira musical, realizou uma bem-sucedida passagem por Hollywood, com participações no cinema, como em "Era uma Vez... Deadpool" (2018)


Dirigido por Irene Taylor, o documentário nos apresenta a artista em seus dias comuns e como ela se tornou o sucesso atual, sem seguir uma linha cronológica. Conhecemos o auge de sua carreira, a relação com a família, e descobrimos que Céline Marie Claudette Dion é a mais jovem de 14 irmãos, todos com um amor pela música.

René Angélil, seu marido, também tem um papel importante no documentário, mostrando como o casal lidou com o nascimento de seus filhos em meio à fama e aos holofotes.


O documentário apresenta um dos aspectos mais comoventes da vida da cantora e compositora: seu diagnóstico de Síndrome da Pessoa Rígida (SPR), uma doença neurológica rara e autoimune, que causa rigidez e espasmos musculares dolorosos. 

Celine fala abertamente sobre suas dificuldades e sentimentos, contrastando com suas palavras de gratidão por tudo o que conquistou. Ela brilha e comove o público, especialmente quando vemos como a doença afetou o instrumento mais potente de sua vida - a voz.


Apesar da força do documentário, senti falta de depoimentos de pessoas próximas a Celine. Ouvir a família e amigos que a acompanham poderia reforçar a mensagem de que, mesmo sendo uma grande estrela, ela é frágil em seus momentos e não precisa ser forte o tempo todo. 

"Eu Sou: Celine Dion" é um convite para conhecer os dias sombrios da artista de maneira crua, forte e bela, impactando profundamente seu público e oferecendo a oportunidade para novos fãs conhecerem mais de sua história. Emocionante!


Ficha técnica:
Direção e roteiro:
Irene Taylor
Produção: Amazon MGM, Sony Music Entertainment, Vermilion Films
Exibição: Prime Video
Duração: 1h42
Classificação: Livre
Países: Canadá e EUA
Gêneros: documentário, musical

18 julho 2024

Minissérie “Ripley”, da Netflix, nos dá o direito de torcer pelo vilão

Andrew Scott interpreta o protagonista que vive de aplicar golpes, mas também tem um passado sombrio
(Fotos Netflix)


Jean Piter Miranda


Para quem gosta de torcer pelo vilão, está disponível na Netflix a minissérie “Ripley”. A obra tem como protagonista Tom Ripley (Andrew Scott), um homem que vive de aplicar pequenos golpes na Nova York dos anos 1960. Ele é recrutado por um empresário muito rico para uma missão: viajar para a Itália e convencer o filho desse milionário a voltar para casa. 

Tom aceita. Além de ter todas as despesas pagas para passear pelo país europeu, a proposta inclui um bom pagamento em dinheiro. Nesse cenário, ele vê uma ótima oportunidade de ter ganhos ainda maiores. 


O filho do milionário é Dickie Greenleaf (Johnny Flynn), que vive na pequena e bela cidade de Atrani, no sul da Itália. Ele passa os dias com a namorada Marge Sherwood (Dakota Fanning), em uma rotina de muita tranquilidade. Entretanto, tudo muda com a chegada de Tom. 

Ao longo da trama, o golpista contratado usa mentiras e mais mentiras, se comportando como uma pessoa sensata, calma e centrada. Faz encenações e consegue disfarçar muito bem a pessoa fria, cruel, manipuladora e calculista que realmente é. Assim, aos poucos, se aproxima de Dickie e vai ganhando a confiança do jovem. Isso enquanto sua presença incomoda cada vez mais a bela Marge. 


A minissérie tem apenas oito capítulos e um poder enorme de prender a atenção do espectador. É um suspense psicológico. A dúvida é saber se Tom vai ser pego nessa vez ou na próxima. Ele parece ter sempre uma carta na manga e estar um passo à frente. Mesmo assim, a todo o momento fica a dúvida se deixou pistas, rastros, vestígios e como vai reagir se for pego de surpresa. 

Em um determinado momento, a obra vira uma trama policial. Investigação, corrida de gato e rato, sem deixar o suspense de lado.E no meio disso tudo, é supernormal torcer pelo vilão só pra ver onde tudo vai dar. 


Os oito capítulos são todos em preto e branco, o que deixa a ambientação ainda mais perfeita. As roupas, os carros, os cenários, tudo é feito com muito cuidado. Reproduzem com perfeição os anos 1960. Andrew Scott está impecável. Dakota Fanning também tem muita presença. Johnny Flynn destoa e entrega atuação bem sem graça. 

Coco Sumner, cantor e ator britânico, interpreta Freddie Miles de forma brilhante. Um personagem muito chato e bem arrogante que, quando está em tela, rouba as atenções. 

O elenco ainda é composto por vários atores italianos, falando o idioma local, o que traz um realismo ainda maior à minissérie. Não é como aqueles filmes em que todo mundo, convenientemente, fala inglês fluente onde quer que esteja. É um detalhe que faz muita diferença. 


Vale destacar que, mesmo com imagens monocromáticas, os cenários são lindos. Veneza, Nápoles, Roma e Sicília. Igrejas, esculturas, obras de artes, casarões, praias, paisagens, viagens de trem. Uma riqueza cultural sem tamanho. Dá muita vontade de viajar pela Itália. 

E para deixar a obra ainda mais rica, a trama amarra bem a história de Tom com a do grande pintor Caravaggio. É uma minissérie para maratonar e contemplar. 

Música

A trilha sonora está simplesmente perfeita. Não há outra forma de descrever o trabalho de Jeff Russo. Canções que podem ser ouvidas clicando nesta playlist


Adaptação

“Ripley” é baseado no livro “O Talentoso Ripley”, de Patricia Highsmith. A direção é do armênio-americano Steven Zaillian, que atuou como roteirista de grandes produções como “O Irlândês” (2019), “Millennium - Os Homens Que Não Amavam as Mulheres” (2011) e “Gangues de Nova York” (2002). 

A obra, de 1955, considerada um clássico da literatura policial,já foi adaptada para o cinema em “O Sol por Testemunha” (1960), com Alain Delon como protagonista. 

Em 1999, outra versão foi lançada, mantendo o título original: “O Talentoso Ripley”. O filme tem Matt Damon como Ripley, Jude Law e Gwyneth Paltrow formando o casal Dickie e Marge, com a ótima direção de Anthony Minghella.


Ficha técnica:
Direção e roteiro: Steven Zaillian
Produção: Netflix e Filmrights
Exibição: Netflix
Duração: 8 episódios
Classificação: 16 anos
País: EUA
Gêneros: drama, suspense, policial
Nota: 4,5 (0 a 5)

15 julho 2024

“O Sequestro do Papa” busca fato do passado para falar de fundamentalismo e intolerância religiosa

Atual e sensível, filme é baseado em uma história verídica que chocou a Itália no século XIX
(Fotos: Pandora Filmes)


Mirtes Helena Scalioni


Que ninguém se engane. Embora o título possa induzir, “O Sequestro do Papa” ("Rapito") não é uma comédia. Ao contrário, trata-se de um filme denso, sério, questionador e, acima de tudo, atual. 

Com uma reconstituição perfeita do século XIX, conta a história do garoto Edgardo Mortara, que, aos seis anos, foi raptado de sua casa em Bolonha, para ser criado num seminário em Roma. O longa entra em cartaz nos cinemas nesta quinta-feira (18).


Com muita coragem e um elenco afiado, o diretor Marco Bellocchio coloca o dedo na ferida, relembrando um tempo em que Estado e religião se misturavam. 

Na época em que se passa o filme, em 1858, a Itália era comandada com mãos de ferro por Pio IX e, apesar da carolice, faltava compaixão e sobrava a arrogância típica dos donos da verdade.


No auge da autoridade do Papado, a família judia de Momolo Mortara é surpreendida um dia com a chegada dos agentes do Estado/Igreja para levar Edgardo, um de seus oito filhos. 

O menino é retirado à força dos braços dos pais em cumprimento a uma denúncia de que ele havia sido batizado. De acordo com a lei vigente, cristãos não podiam ser criados por judeus pagãos.


A partir desse sequestro, o espectador acompanha a luta de Marianna e Momolo Mortara para reaver o filho, enfrentando viagens a Roma, humilhações e processos até o julgamento do caso, em 1860. A história deles revela um capítulo sombrio da tirania histórica na Igreja tendo como pano de fundo uma nação à beira da revolução. 

Cabe ressaltar a atuação, convincente e comovente, do menino Enea Sala como Edgardo. Aliás, todo o elenco merece aplausos: Leonardo Maltese como Edgardo adulto, Paolo Pierobon como o arrogante Papa Pio IX, Filippo Timi como o cardeal Giacomo Antonelli, Fabrizio Gifuni como o advogado Jussi, Anna Morisi como a babá, Bárbara Ronchi como a mãe Marianna Padovani, Fausto Russo Alesi como Momolo Mortara e outros.


Enfim, “O Sequestro do Papa” é, antes de tudo, um filme político como outros de Marco Bellocchio, que antes dirigiu, por exemplo, “Bom Dia, Noite” (2003).

O longa tem tudo para prender a atenção do público e é uma ótima oportunidade de reflexão para esses tempos de moralismo, lavagem cerebral, intolerância religiosa, investidas fundamentalistas e perigosas misturas de religião e Estado.


Ficha técnica:
Direção: Marco Bellocchio
Distribuição: Pandora Filmes
Exibição: nos cinemas
Duração: 2h14
Classificação: 12 anos
Países: Itália, França, Alemanha
Gêneros: drama, história

11 julho 2024

"Twisters" estreia nos cinemas com tornados em dobro e mais arrasadores

Longa reúne elenco simpático e faz uma linda homenagem a dois clássicos do cinema (Fotos: Universal Pictures)

Maristela Bretas


Passados 28 anos, os tornados estão de volta, mais violentos por causa das mudanças climáticas, e continuam sendo caçados, agora por um elenco de novas estrelas. Entrou em cartaz nos cinemas o longa "Twisters", dirigido por Lee Isaac Chung. A produção emprega o que há de mais moderno em tecnologia para mostrar a força e a destruição causada por estas tempestades. 

Além dos ótimos efeitos visuais, o filme também faz uma homenagem a dois clássicos do cinema: o antecessor "Twister" (1996), mostrando os equipamentos empregados pelas equipes, e "O Mágico de Oz" (1939), com seus personagens icônicos. Dá até um quentinho no coração!


Três grandes estúdios de Hollywood - Warner Bros. Pictures, Universal Pictures e Amblin Entertainment (de Steve Spielberg, um dos produtores executivos) - se uniram neste longa, que teve um orçamento de US$ 200 milhões, incluindo os efeitos de CGI e o elenco. Como protagonistas temos Daisy Edgar-Jones ("Um Lugar Bem Longe Daqui" - 2022) e Glen Powell ("Top Gun: Maverick" - 2022), que formam um casal simpático e com boa química, e o indicado ao Globo de Ouro, Anthony Ramos.

A expectativa é grande quanto ao faturamento desta segunda produção, especialmente se compararmos com a primeira, que custou US$ 92 milhões e atingiu US$ 495 milhões de bilheteria. No elenco principal estavam Helen Hunt e Bill Paxton, falecido em 2017. 

Uma curiosidade: nos anos de 1990 havia o brinquedo Twister no Universal Park, em Orlando, que simulava um tornado atingindo uma cidade, com direito a ventania, queda de raios em postes e explosões de fios, como no filme. Era bem divertido e fez bastante sucesso. Até hoje, o longa atrai fãs e pode ser assistido no Globo Play e Telecine.  


"Twisters" não perde em nada para seu antecessor e foi considerado por muitos espectadores que assistiram a pré-estreia, até melhor. Especialmente porque, como o próprio nome diz, agora os tornados estão em dupla e mais devastadores. São eles as verdadeiras estrelas do filme e que deverão atrair boa parte do público para os cinemas. Como no primeiro longa, as locações foram em Oklahoma, estado com a maior taxa de grandes tornados super destruidores dos Estados Unidos. 

Agora, os efeitos visuais e sonoros foram trabalhados juntamente com imagens reais filmadas por caçadores de tornados durante a temporada dos fenômenos e usadas pelo diretor. Segundo o roteirista Mark L. Smith, ele se inspirou em algo real, nas mudanças no comportamento do clima que tem ficado mais severo e extremo. Para a forte ventania, o diretor utilizou ventiladores gigantes e os atores tiveram que filmar com vários objetos sendo jogados contra eles.


Na história, Daisy Edgar-Jones é Kate Cooper, uma ex-caçadora de tempestades que teve uma experiência assustadora quando estava na faculdade. Largou tudo e se mudou para Nova York onde estuda padrões de tempestades em uma agência meteorológica. Até que é chamada de volta a Oklahoma por seu amigo Javi (Anthony Ramos) para testar um novo sistema revolucionário de rastreamento de tornados.

Lá, ela fica conhecendo Tyler Owens (Glen Powell), o charmoso e imprudente astro das redes sociais que se diverte postando aventuras de caça a tempestades com sua equipe barulhenta. No entanto, os fenômenos estão ficando cada vez piores, colocando Kate, Tyler e as demais equipes diretamente no caminho de múltiplos tornados que atingem tanto a área rural quanto as cidades. 


O elenco conta também com David Corenswet (próximo Superman em "Legacy"), Brandon Perea de Nope, Sasha Lane, Daryl McCormack, Kiernan Shipka, Nik Dodani e a vencedora do Globo de Ouro e estrela da série "E.R.", Maura Tierney.

Infelizmente não temos vaca voando, mas os tornados arrastam muito mais objetos e pessoas, proporcionando cenas bem eletrizantes e tensas. "Twisters" é ação do início ao fim, especialmente quando a natureza mostra a sua força. Vale muito a pena ser conferido nos cinemas, especialmente em Imax, para aproveitar melhor os efeitos especiais.


Ficha técnica
Direção: Lee Isaac Chung
Roteiro: Mark L. Smith
Produção: Amblin Entertainment, Warner Bros. Pictures, Universal Pictures, The Kennedy Marshall/Company
Distribuição: Warner Bros. Pictures
Exibição: nos cinemas
Duração: 2h13
Classificação: 12 anos
País: EUA
Gêneros: aventura, ação, suspense

10 julho 2024

"Ninguém Sai Vivo Daqui" - dramatização não aprofunda realidade cruel do Hospital Colônia

Longa em preto e branco aborda o tratamento desumano dado a pacientes internados em unidade psiquiátrica de Barbacena, na década de 1970 (Fotos: Gullane) 


Silvana Monteiro


Saúde mental, política manicomial, machismo, exclusão, segregação, padrões sociais, abusos e maus-tratos são alguns dos temas abordados no longa "Ninguém Sai Vivo Daqui", distribuído pela Gullane+, que chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (11). Em BH ele está em exibição no Cine Una Belas Artes. 

Inspirado no premiado livro "Holocausto Brasileiro", da jornalista Daniela Arbex, o filme, dirigido por André Ristum, apresenta uma história impactante, apesar de algumas falhas.  


O foco principal da trama é em Elisa, uma jovem saudável que, por quebrar alguns dos padrões sociais mais defendidos da época, a tal honra feminina, é internada à força pelo pai no hospital psiquiátrico Colônia, em Barbacena (MG), no início dos anos 1970. 

Apesar de hoje esta prática causar espanto em muitas pessoas, era comum no passado, quando uma jovem engravidava sem estar casada e passava a representar "uma desonra" para as famílias.


A fotografia em preto e branco, fruto da parceria entre Ristum e o diretor de fotografia Hélcio Alemão Nagamine, é sim um personagem fundamental no filme. E claro, cumpre a missão de destacar a falta de vida e alegria na experiência dos internos. Contudo, essa escolha estilística, embora dramática, não consegue sustentar alguns trechos rasos da obra. 

A ausência de cor simboliza a desumanidade e o sofrimento dos pacientes do Colônia, mas se o filme fosse colorido e mais profundo, detalhando alguns acontecimentos à cor, talvez seu impacto fosse ainda maior. 

A paleta monocromática tenta reforçar a atmosfera sombria e opressiva, mas em alguns pontos a narrativa acaba se tornando uma miscelânea, que desvia o foco de um tema sério, necessário e pouco explorado no Brasil.


A trilha sonora, composta por Antônio Pinto, é notável. O uso de ruídos e texturas sonoras cria uma ambiência inquietante que se funde perfeitamente com as imagens em preto e branco, nesse ponto, a obra se torna diferenciada. As imagens do “trem de doido” são um ponto alto da produção ao mostrar como as pessoas eram levadas para o local. 

Ristum, que assina o roteiro com Marco Dutra e Rita Gloria Curvo, poderia ter explorado mais histórias para humanizar melhor o contexto da política manicomial da época. A experiência cinematográfica é impactante, mas em alguns momentos, o sofrimento dos personagens, especialmente das mulheres, se dilui. 


É o caso de Vanda, magistralmente interpretada por Rejane Faria. Vale destacar também as interpretações de Bukassa Kabengele, no papel de Raimundo, um interno que demonstra bem como aquele ambiente desconcerta e causa ira. Além de Augusto Madeira, como Juraci, um verdadeiro crápula. 

O elenco, liderado por Fernanda Marques no papel de Elisa, entrega performances memoráveis. Ela transmite, com maestria, a dor, a angústia e a luta de sua personagem, representando a luta de tantas outras mulheres internadas injustamente no Colônia. 


Um dos grandes trunfos da obra é a demonstração de que sororidade é algo sublime em qualquer situação e contexto. "Ninguém Sai Vivo Daqui" expõe a podridão da política manicomial na história do Brasil. Contudo, carece de uma abordagem mais visceral que corresponda à sua estética impactante, tal como é a marca da história do Colônia.

Cidade dos Loucos

O Hospital Colônia de Barbacena, fundado em 1903, foi inicialmente construído para tratar pacientes com tuberculose. Conhecido como "Cidade dos Loucos" por abrigar sete instituições psiquiátricas, tornou-se notório pelo tratamento desumano aos pacientes, sendo comparado a um campo de concentração nazista. 


Em 1961, contava com cerca de cinco mil pacientes, muitos sem diagnóstico de doença mental, incluindo opositores políticos e grupos marginalizados. 

Estima-se que 70% dos internos não possuíam transtornos de saúde mental, eram enviados por não se adequarem aos padrões da época, tais como políticos, prostitutas, homossexuais, mendigos, pessoas sem documentos, entre outros grupos marginalizados na sociedade. Dados levantados à época mostram que pelo menos 60 mil pessoas tenham morrido no Hospital Colônia de Barbacena.


Ficha técnica:
Direção e roteiro: André Ristum
Produção: Sombumbo, TC Filmes, coprodução Gullane, Geração Entretenimento, Canal Brasil e Karta Film
Distribuição: Gullane+
Exibição: Cine Una Belas Artes, sala 2, sessão Às 18h40 e sala 3, às 13h50
Duração: 1h26
Classificação: 16 anos
País: Brasil
Gênero: drama