07 maio 2025

"Virgínia e Adelaide" traz à tona a coragem e o pioneirismo de mulheres lutadoras

Longa-metragem é tão delicado, eficaz e didático que funciona quase como um documentário
(Fotos: Fábio Rebelo)
 
 

Mirtes Helena Scalioni

 
Adeptos da Psicanálise - sejam eles profissionais, pacientes ou meramente curiosos - certamente vão tirar proveito maior de "Virgínia e Adelaide", longa de Yasmin Thayná e Jorge Furtado produzido pela Casa de Cinema de Porto Alegre. 

Com roteiro enxuto e certeiro de Furtado, o filme que conta a trajetória da pesquisadora negra Virginia Leone Bicudo e da médica alemã Adelaide Koch estreia dia 8 de maio nos cinemas, prometendo esclarecer e resgatar o pioneirismo de duas mulheres visionárias e lutadoras.


São apenas duas atrizes em cena - Gabriela Correa, como Virgínia, e Sophie Charlotte, como Adelaide - o que leva o espectador a se sentir, em alguns momentos, como se estivesse num teatro. Não há ação, suspense nem tramas, mas o filme é tão delicado e didático que funciona quase como um documentário. 

Quem não sabe, vai ficar sabendo, minimamente, como funciona uma sessão de psicanálise, com seus silêncios, divã, sonhos, transferência, tempo lógico e palavras. Muitas palavras.


Tudo começa quando a paulista Virgínia Leone Bicudo, talvez paralisada e traumatizada após anos de enfrentamento de preconceito racial, procura a médica alemã Adelaide Koch, judia que chegou a São Paulo fugida da perseguição nazista de Hitler. 

Depois de muitas dúvidas e senões, Adelaide topa aceitar a nova cliente e, ao longo das sessões, o espectador vai descobrindo que há muito mais em comum entre elas do que se imagina. 


E é assim, lentamente, durante longos cinco anos, que a relação entre elas vai sendo transformada. As duas se tornam amigas, Virgínia ganha forças para enfrentar tudo e todos, faz também sua formação em Psicanálise, vive um tempo em Londres e se torna a primeira psicanalista brasileira.

No início, o público pode até estranhar o sotaque de Sophie Charlotte como Adelaide, mas a interpretação da atriz é tão convincente e natural que os diálogos passam a transcorrer naturalmente. 

Os diretores Jorge Furtado e Yasmin Thayná

Não se pode esquecer que embora tenha vindo para o Brasil aos sete anos, ela nasceu em Hamburgo, na Alemanha, e alguma coisa deve ter ficado com ela - no inconsciente?  Confira o vídeo do making off do filme clicando aqui

Gabriela Correa também brilha numa interpretação contida de mulher negra vítima de racismo disposta a mostrar ao mundo do que é capaz enquanto seu tratamento vai evoluindo, palavra por palavra, como convém à Psicanálise. Destaque para os figurinos irretocáveis de época, que ajudam a criar o clima para a história.


Como o filme se passa em sua maior parte na década de 1930, em alguns momentos fatos históricos como a ascensão do nazismo e do Estado Novo no Brasil são mostrados, levando o espectador a, quem sabe, traçar alguma similaridade ou paralelo entre eles. 

"O ódio é uma doença contagiosa", uma delas sentencia num dos diálogos. E a certa altura, Adelaide conclui: "Cada um sabe a hora de lutar ou correr". Elas lutaram. 


Ficha técnica:
Direção e roteiro: Yasmin Thayná e Jorge Furtado
Produção: Casa de Cinema de Porto Alegre, coprodução Globo Filmes e GloboNews
Distribuição: H2O Films
Exibição: nos cinemas
Duração: 1h35
Classificação: 14 anos
País: Brasil
Gênero: drama

05 maio 2025

"Screamboat - Terror à Bordo": uma canoa furada de muito sangue e violência e pouco riso

Willie, o rato assassino, é a versão repaginada para o terror de "O Vapor Willie", primeira animação do personagem Mickey com imagem e som sincronizados, lançada há 97 anos (Fotos: Imagem Filmes)
 
 

Maristela Bretas

 
Imagine a inocência dos primeiros desenhos animados do Mickey sendo brutalmente subvertida por uma onda de terror slasher. Essa é a premissa ousada e mal-sucedida de "Screamboat - Terror à Bordo", uma reimaginação sombria e sangrenta do clássico curta de animação "O Vapor Willie" ("Steamboat Willie"), que caiu em domínio público e deve estar fazendo o criador, Walt Disney, revirar no túmulo. Especialmente por ser primeira animação do personagem Mickey com imagem e som sincronizados, lançada há 97 anos.

O filme, feito para transgredir o original, do qual ele utiliza imagens até mesmo de Walt Disney, navega por águas turbulentas de violência gráfica, entregando uma experiência chocante, mas ruim. Daquelas produções que dá vontade de parar de assistir nos primeiros 10 minutos de projeção. 


E não porque muda a proposta da animação de 1928, mas por oferecer um protagonista que enjambrado, que parece um boneco de marionete dos Muppets. Só falta aparecerem as cordinhas. Uma figura mal feita, mesmo sendo o rato maligno interpretado por David Howard Thornton, conhecido por seu papel como Art, o Palhaço, da franquia “Terrifier”. 

A atuação de Thornton é boa e salva a produção em parte, mas o personagem é difícil de engolir. Ele não é aterrorizante, é somente muito feio. A maquiagem e as próteses usadas no ator não causam medo, apenas conseguem deixá-lo repulsivo. A produtora de "Screamboat - Terror a Bordo", a Fuzz on the Lens Productions, também é responsável por "Terrifier 2" (2022) e "Terrifier 3" (2024), além de outros longas do gênero. 


Na trama, vários passageiros e tripulantes da última balsa Staten Island da noite em Nova York são caçados pelo rato Willie, que transforma a travessia em um massacre sangrento, matando um a um dos ocupantes das formas mais bizarras e diferentes. Cercados pela água e pelo medo, eles precisam encontrar um jeito de sobreviver até que chegue o socorro. 

O diretor Steven LaMorte (sobrenome bem apropriado) tentou ousar, como seu colega Damien Leone, responsável pelos filmes de Art, o Palhaço, mas errou feio. A proposta de transformar Mickey, um ícone da infância, em uma criatura sinistra com sua inconfundível silhueta, perseguindo um grupo de jovens desprevenidos em um barco a vapor isolado, poderia ser muito melhor aproveitada. 

Mas a condução do roteiro não foi bem sucedida, nem mesmo quando cria familiaridade do cenário de horrores com as cenas infantis do original.


Um ponto que pode ser chamado de positivo é a trilha sonora. Ao remeter para as melodias alegres de "Steamboat Willie", ela ganha tons ameaçadores, reforçando a perversão da inocência. E só.

Os próprios personagens, ao se depararem com a ameaça, parecem conscientes daquela situação absurda. Tomam atitudes tão bobas que chegam a ser cômicas, ideais para uma produção do tipo terror/comédia, que tornam os acontecimentos previsíveis, tirando o suspense e fazendo o longa ficar ainda mais difícil de ver. Além de não provocar risos.

A narrativa, focada na perseguição e nos assassinatos, não aprofunda nos personagens e menos ainda na transformação do Mickey no malvado Willie. O filme parece mais interessado na violência absurda do que em construir um suspense psicológico. 


O roteiro é ruim do início ao fim, mesmo quando brinca com a nostalgia, transformando o inocente em algo brutal, provando que até mesmo ícones da infância podem se tornar um sangrento pesadelo. Uma produção totalmente esquecível e dispensável. É dinheiro de ingresso jogado fora. 

Para os apreciadores deste gênero que buscam uma experiência que promete chocar pela violência, "Screamboat: Terror a Bordo" entrega um banho de sangue pelas paredes Além de apresentar mais um personagem reformulado no final e deixar claro que haverá um segundo filme. Que sofrimento!


Ficha técnica:
Direção: Steven LaMorte
Produção: Fuzz on the Lens Productions
Distribuição: Imagem Filmes
Exibição: nos cinemas
Duração: 1h42
Classificação: 18 anos
País: EUA
Gêneros: terror, comédia

01 maio 2025

"Homem com H" faz brilhar na telona a inventividade e a coragem de Ney Matogrosso

Jesuíta Barbosa encarna os olhares e trejeitos do cantor de forma quase perfeita (Fotos: Marina Vancini) 
 
 

Eduardo Jr.

 
Estreia nos cinemas, neste dia 1º de maio, a cinebiografia do homem que ousou ser livre: Ney Matogrosso. Distribuído pela Paris Filmes, "Homem com H", longa escrito e dirigido por Esmir Filho, expõe na telona a vida e a formação de um dos maiores artistas do Brasil e dono de uma das mais belas vozes do mundo. 

A apresentação do artista com uma sequência de imagens que o compara a um bicho se mostra acertada. O próprio Ney se define assim, em alguns momentos. Quando menino, ao se ver diferente dos irmãos, buscava se encontrar. 


No entanto, o caminho foi difícil, o único apoio vinha da mãe Beita (interpretada por Hermila Guedes). O maior dos obstáculos era a figura do pai (vivido por Rômulo Braga), um militar conservador e violento, que não tolerava os dons artísticos do jovem e dizia que não queria um filho gay.    

Sob a condução de Esmir fica fácil uma identificação com histórias da vida real. O público pode encontrar, inclusive, elementos que expliquem a dureza do pai, a conduta de colegas de banda e ‘otras cositas más’. 


Em uma das cenas, Ney sai de casa de cabeça em pé, dizendo ao pai que não era viado, mas que, quando fosse, o Brasil inteiro iria saber. Começava ali a trajetória de descobertas e autoconhecimento de Ney Pereira da Silva, que mais tarde se tornaria Ney Matogrosso. 

A direção mostra a passagem do artista pela Aeronáutica (isso mesmo, Aeronáutica). E curiosamente, naquele ambiente castrador, Ney viveu um amor platônico. Foi na corporação que ele se reconheceu e vislumbrou uma autoaceitação. 


Ao sair dali foi que se deparou com o que o destino reservava: a morte do jovem para se tornar, então, o homem com H dos dias atuais, além do contato com o artesanato. 

A atividade permitiria posteriormente a ele criar alguns de seus próprios acessórios e figurinos - que inclusive foram utilizados por Jesuíta Barbosa (que encarna os olhares e trejeitos de Ney de forma quase perfeita). 


A interpretação elogiável de Jesuíta vai além do trabalho de corpo. Se deve também a uma impetuosidade que o ator imprime e que adere à personalidade do cantor, já conhecida por entrevistas e posicionamentos ao longo da vida. 

No entanto, o biografado não é força bruta o tempo todo. A sensibilidade se apresenta no longa, entre outras coisas, pela insegurança do cantor em certas escolhas, enquanto a classe artística via nele uma potência que o próprio Ney parecia não se dar conta.  


O público ganha uma forcinha para comprovar que certos artistas, quando em cena, crescem. A câmera faz questão de mostrar, nas primeiras apresentações da banda que se tornaria o fenômeno Secos e Molhados, que as provocações do público faziam Ney Matogrosso se agigantar no palco. 

Uma demonstração metafórica da força do artista que, desde cedo, sabia o que estava fazendo e o quão poderosa era sua liberdade. E claro, tem muito brilho, 'sex appeal' e atuações provocativas.  


A liberdade para o amor também marca presença no longa. A tão falada relação entre Ney e Cazuza (papel de Júllio Reis) também é apresentada, mas vestida de forma mais robusta de sentido se em comparação com as demais obras que já abordaram essa passagem da vida de Ney. 

Mais clara também é a abordagem de um dos relacionamentos mais importantes da vida de Ney. O namoro com o médico que traz para o longa um recorte do drama da AIDS nos anos 1980 e a incredulidade de Ney Matogrosso sobre nunca ter se contaminado (algo que o cantor já mencionou em diversos depoimentos). 


Não dá pra deixar de destacar a riqueza desta produção - em diversos aspectos. Alguns dos figurinos utilizados em cena não são réplicas, e sim peças originais, garimpados no acervo do cantor e que serviram com perfeição no corpo de Jesuíta Barbosa. 

Ney Matogrosso gravou canções para que Jesuíta dublasse. Como na cena do coral e a versão de “O Mundo é Um Moinho” - que provocam arrepios, tamanha a qualidade vocal registrada. 


Gostar ou não do artista pode ser algo muito particular - e como devem ter notado, este que vos fala, gosta. Mas independente disso, ir aos cinemas assistir "Homem com H" é, além de mais uma chance de privilegiar o cinema nacional, uma oportunidade de conhecer e entender um pouco mais sobre um personagem importante da história da música brasileira. 

Porque, pra fazer o que Ney Matogrosso fez e vem fazendo até aqui, com seus 82 anos, só sendo um homem com H maiúsculo. 


Ficha técnica:
Direção e roteiro:
Esmir Filho
Produção: Paris Entretenimento
Distribuição: Paris Filmes
Exibição: nos cinemas
Duração: 2h09
Classificação: 16 anos
País: Brasil
Gêneros: drama, documentário

30 abril 2025

Clientes Unimed-BH vão pagar meia-entrada em toda a rede Cineart

(Divulgação)


Da Redação


A Unimed-BH firmou parceria com a rede de cinemas Cineart para oferecer meia-entrada exclusiva a seus clientes em todas as salas da rede na região metropolitana de Belo Horizonte. 

A novidade começou a vigorar a partir desta quarta-feira, 30 de abril, e vale para ingressos comprados tanto online quanto nos guichês físicos. Para garantir o benefício, basta apresentar a carteirinha da Unimed-BH - física ou digital - no ato da compra e na entrada da sessão. 


O benefício contempla unidades da Cineart nos principais shoppings da capital e da Região Metropolitana, incluindo as salas Premier e IMAX: Boulevard, Cidade, Del Rey, Minas Shopping, Ponteio, Itaú Power, Shopping Contagem e Monte Carmo, em Betim. 

O desconto só não é cumulativo com outras promoções.

Mais informações no link:

28 abril 2025

Cine Humberto Mauro celebra a sétima arte com a mostra "Os Trabalhadores vão ao Cinema"

São 130 anos de história, apresentados em mais de 40 filmes que serão exibidos entre os dias
29 de abril e 18 de maio (Crédito: Charlie Chaplin)
 
 

Da Redação

 
Ao longo de 130 anos, o cinema vem refletindo sobre a relação atemporal da humanidade com o trabalho. E será com produções focadas neste tema que o Cine Humberto Mauro exibirá, entre os dias 29 de abril e 18 de maio, a mostra inédita “Os Trabalhadores vão ao Cinema”. 

São mais de 40 filmes de diversas épocas, sessões comentadas por especialistas e obras na plataforma CineHumbertoMauroMAIS, que refletem sobre as várias dimensões do trabalho. A programação completa pode ser conferida clicando aqui.

Entre as produções, de curtas e longas-metragens, estão clássicos como “Tempos Modernos” (1936), “As Vinhas da Ira” (1940) e “Sindicato de Ladrões” (1954). Além de “A Greve” (1925) e “A Negra de…” (1966) e títulos modernos, como é o caso de “Como Enlouquecer Seu Chefe” (1999) e “O Diabo Veste Prada” (2006). 

"As Vinhas da Ira" (Crédito: John Ford)

A Mostra terá entrada gratuita, com retirada de 1 (um) ingresso por pessoa a partir de meia hora antes de cada sessão, na bilheteria do cinema, mediante apresentação de documento de identificação com foto.

A partir do dia 6/5/2025, 50% dos ingressos estarão disponíveis, de forma on-line, 1 hora antes de cada sessão, no site da Eventim. O restante dos ingressos será distribuído presencialmente pela bilheteria, meia hora antes da sessão, mediante a apresentação de documento com foto.

“A Negra de…” (Crédito: Ousmane Sembène)

A história

Em 22 de março de 1895, o curta-metragem “A saída dos operários da fábrica Lumière”, dos irmãos Auguste e Louis Lumière, foi exibido para um pequeno grupo de pessoas em Paris. Já a célebre primeira projeção pública, incluindo este e outros pequenos filmes, aconteceu em 28 de dezembro do mesmo ano, no salão de um restaurante da capital francesa. 

A maior parte da mostra acontece justamente ao longo do mês que celebra lutas e conquistas dos trabalhadores, tendo como marco o feriado de 1º de maio. 

A programação propõe um mergulho nas múltiplas formas através das quais o cinema retratou o universo do trabalho, desde as fábricas do século XIX até os dilemas contemporâneos, passando por questões urgentes que continuam a ecoar na sociedade. 

“Cedo Demais, Tarde Demais”
(
Crédito: DanièleHuillet e Jean-Marie Straub)

Além das exibições tradicionais, a curadoria traz duas sessões comentadas: a primeira acontece no Dia do Trabalho, quando o crítico de cinema e pesquisador Renan Eduardo falará sobre o filme “Cedo Demais, Tarde Demais” (1982), de Jean-Marie Straub e Danièle Huillet. 

A segunda, por sua vez, ocorre no dia 14/5, com o filme “A Classe Operária vai para o Paraíso” (1971), de Elio Petri, comentado pelo curador da mostra, Júlio Cruz. 

Complementando a programação presencial, a plataforma CineHumbertoMauroMAIS contará com uma seleção de nove filmes que também colocam o foco nos trabalhadores, suas lutas e desejos, tais quais “Metrópolis” (1927), “Um Homem com uma Câmera” (1929) e “A Pequena Loja dos Horrores” (1960).

"A Dupla Jornada" (Crédito: Helena Solberg)

Curtas, cinema brasileiro e infantil

O trabalho através de diversas lentes – O cinema brasileiro terá espaço de destaque, com uma seleção que inclui o clássico curta-metragem “A Mão do Homem” (1969), de Paulo Gil Soares, e “As Aventuras de Paulo Bruscky” (2010), um dos filmes do início da carreira de Gabriel Mascaro, diretor recentemente premiado no Festival de Berlim. 

Também integram a seleção o documentário “A Dupla Jornada” (1975), de Helena Solberg, “O Bem Virá” (2021) – longa-metragem inédito em Belo Horizonte –, de Uilma Queiroz, e o aclamado “Sinfonia da Necrópole” (2014), de Juliana Rojas, um dos filmes nacionais mais relevantes da última década, entre outras obras importantes da cinematografia nacional.

A Pequena Vendedora de Sol
(Crédito Djibril Diop Mambéty)

Já as sessões de curtas-metragens prometem surpreender: a primeira, no dia 1º de maio, revisita “A Saída dos Operários da Fábrica Lumière”, explorando seu impacto na história do cinema e elaborando uma ideia de desconstrução do curta pioneiro; 

A segunda, no dia 6/5, celebra a produção do cineasta mineiro Humberto Mauro no Instituto Nacional de Cinema Educativo (INCE); e a terceira, no dia 17/5, apresenta três obras contemporâneas que usam o Machinima – técnica que utiliza os videogames como cenário –, explorando o universo do trabalho nos tempos atuais.

Para o público infantil, destaca-se a exibição de “A Pequena Vendedora de Sol” (1999), do senegalês Djibril Diop Mambéty, exibido com dublagem realizada pelo projeto Versão Brasileira, primeira iniciativa cultural que promove a acessibilidade e a exibição, nas periferias de Belo Horizonte, de filmes estrangeiros com pouca circulação no Brasil. 

"O Bem Virá" (Crédito: Uilma Queiroz)

O projeto é idealizado por Luísa Lanna e a coordenação da dublagem foi realizada por Flora Maurício e Maru Arturo. A obra foi dublada por moradores do Morro do Papagaio, em Belo Horizonte. 

O curador da mostra, Júlio Cruz, ressalta que o trabalho é um dos elementos que acompanham a humanidade desde sempre, e com o cinema não poderia ser diferente. “Cada cineasta é atravessado em seu cinema pelas contradições e conflitos materiais e históricos de seu tempo e lugar. Mas o que permanece é esse desejo de pensar sobre a realidade que todos vivemos, a luta por melhores condições de trabalho e como populações específicas enfrentam desafios diferentes”.

Cine Humberto Mauro
(Crédito: Fundação Clóvis Salgado)

Serviço
Mostra “Os Trabalhadores vão ao Cinema”

Datas: 29/4 (terça-feira) a 18/5 (domingo)
Horários: Variados
Local: Cine Humberto Mauro – Palácio das Artes
(Avenida Afonso Pena, 1537, Centro – Belo Horizonte)
Classificação indicativa: Variadas
Programação completa: clique aqui
Informações: (31) 3236-7378 | (31) 3236-7381

27 abril 2025

“Sobreviventes” é um filme necessário para discutir sobre escravidão de forma subvertida

Filme acompanha um grupo de negros e brancos que escapa do naufrágio de um navio negreiro e vai
precisar mudar seu modelo de convivência (Fotos: Hugo Azevedo/Divulgação)
 
  

Marcos Tadeu
Parceiro do blog Jornalista de Cinema



Último trabalho do cineasta luso-brasileiro José Barahona, "Sobreviventes" revisita a disputa do poder em meados do século XIX, após um naufrágio de um navio negreiro. O longa está em cartaz no Cine Una Belas Artes, com produção da Refinaria Filmes (Brasil) e David & Golias (Portugal).

A questão da escravidão é um tema que ainda assombra e se faz presente no século XXI de formas diferentes, mas com resquícios do passado. Barahona entrega um filme histórico e necessário ao tocar nas principais feridas do povo brasileiro.


A colonização do Brasil por Portugal é um exemplo de exploração econômica, violência contra os povos indígenas, implantação de um sistema escravocrata e a tentativa de imposição da cultura europeia. 

O filme acompanha um grupo de homens e mulheres, negros e brancos, que, após escaparem de um terrível naufrágio de um navio negreiro, encontram-se isolados em uma ilha deserta, no Oceano Atlântico, no século XIX. Para sobreviverem, eles agora enfrentam um dilema: reproduzir as hierarquias do passado ou construir um novo modelo de convivência.


Temos todos os tipos de personagens, apesar de algumas vezes caricatos: João Salvador (o escravo), o branco que tenta manter a autoridade, o arrependido, o cruel, mulheres desvalorizadas e somente usadas para reprodução. Impossível não comparar a sociedade que temos hoje com a do passado.

A fotografia em preto e branco de Hugo Azevedo ajuda a fazer o contraste entre raças e seus discursos e ideologias. Um dos maiores acertos da obra é mostrar como, mesmo em uma situação difícil, as pessoas ainda querem manter o domínio sobre as outras. 

Podemos até lembrar do longa “O Poço”, do diretor espanhol Galder Gaztelu-Urrutia, que discute política e fome em uma prisão vertical.


O maior trunfo de Barahona em sua obra é a maneira como ele, em determinado momento, subverte a lógica em relação à escravidão, transformando escravo em senhor e escravizando o homem branco. Tudo isso em uma narrativa densa e dolorosa, mostrando o maior defeito do ser humano: a crueldade.

O cineasta, que era um português branco, faz um filme para negros, para levar o público a pensar e repensar como a escravidão chegou ao Brasil e se impôs sobre outros povos. A colonização e a descolonização mostradas no longa são escancaradas de maneiras diversa e didática, sem enrolação. 


O elenco dá um show de atuação, estrelado pelo mineiro Paulo Azevedo, Miguel Damião, Allex Miranda, Roberto Bomtempo, Zia Soares, Ângelo Torres e Anabela Moreira. Eles conseguem fazer o público ter empatia por seus personagens e, ao mesmo tempo, sentir raiva deles.

A trilha sonora original é assinada por Philippe Seabra, da banda Plebe Rude, e conta com a participação especial de Milton Nascimento em uma das faixas do filme, ampliando sua dimensão simbólica e afetiva.

“Sobreviventes” é um tipo de filme raro de se ver. Ele abre debates sobre a colonização e como o poder e a política funcionam até em uma ilha deserta com pessoas usando suas dores e diferenças para chegar a um objetivo, apelando até mesmo para a violência e a crueldade.


Ficha técnica:
Direção: José Barahona
Produção: Refinaria Filmes (Brasil) e David & Golias (Portugal)
Distribuição: Pandora Filmes
Exibição: Cine Una Belas Artes - sala 3, sessão 19h40
Duração: 1h51
Classificação: 16 anos
Países: Brasil e Portugal
Gênero: drama

25 abril 2025

Abertas as inscrições para o 12º Festival de Finos Filmes

 

Da Redação


Estão abertas até o dia 25 de maio as inscrições de curtas-metragens no 12º Festival de Finos Filmes, mostra de cinema que acontece em setembro em São Paulo (presencial e online). 

Os filmes devem ter até 20 minutos e terem sido produzidos a partir de 2023. Todo o dinheiro arrecadado em venda de ingressos será revertido para instituições sociais. Os curtas selecionados irão compor painéis de debates e exibições, com temas e convidados de diversas áreas. 

"Em parceria com a Cinemália, incubadora de filmes com viés social, esperamos poder, mais uma vez e cada vez mais, usar a arte para catapultar novas vozes e contribuir para o debate público", afirma Felipe Poroger, diretor do evento.

Para informações mais detalhes sobre inscrições, acesse www.finosfilmes.com.br ou @finosfilmes, pelo instagram.

24 abril 2025

"O Contador 2" acerta ao equilibrar ação, emoção e humor

Ben Affleck e Jon Bernthal entregam ótimas atuações e uma boa química tanto nas discussões familiares quanto nos conflitos contra os criminosos (Fotos: Warner Bros.)
 
 

Maristela Bretas

 
Ben Affleck retoma seu enigmático personagem Christian Wolff, um contador com Síndrome de Asperger (uma forma de Transtorno do Espectro Autista) dotado de habilidades extraordinárias em raciocínio, matemática e combate. Uma interpretação, mais uma vez, impecável.

Em "O Contador 2" ("The Accountant 2"), com estreia marcada para esta quinta-feira nos cinemas, a grande novidade é o protagonismo igualmente conferido a Jon Bernthal, que reassume o papel de Braxton, o irmão de Chris e matador de aluguel.


A dupla explosiva, em todos os sentidos, prende a atenção do espectador do princípio ao fim da trama, com uma generosa dose de ação, tiroteios, pancadaria e até mesmo momentos de bom humor. 

A química entre Affleck e Bernthal se mostra eficaz, com ambos visivelmente mais à vontade em seus respectivos papéis.

Chris, o Contador, ainda procurado pelo FBI, é recrutado pela agente do Tesouro americano Marybeth Medina (Cynthia Addai-Robinson) para identificar os responsáveis pela morte de um antigo amigo em comum. 

Envolvido em uma conspiração internacional, ele precisará da ajuda de seu irmão, de quem se separou ao final de "O Contador" (2016), para rastrear os suspeitos, ligados a uma perigosa rede de tráfico humano.


Em "O Contador 2", Gavin O'Connor, que também dirigiu o filme original, adiciona camadas de emoção à narrativa ao explorar as dinâmicas familiares, tanto a dos irmãos justiceiros quanto a das vítimas da rede de tráfico. 

Essa profundidade emocional não compromete a ação intensa e as reviravoltas eletrizantes, que se manifestam em perseguições e confrontos bem coreografados protagonizados pela dupla. E a munição parece não ter fim em meio a tantos tiroteios.


Do filme anterior, além do trio de protagonistas Affleck, Bernthal e Addai-Robinson, o elenco conta com o retorno de J.K. Simmons e a adição de dois personagens relevantes, interpretados por Daniella Pineda e Allison Robertson.

Os toques de humor injetados em "O Contador 2" conferem ao filme uma leveza bem-vinda, especialmente nas interações entre os irmãos e na representação da dificuldade de interação social de Chris, uma característica de sua condição. 

A tentativa desajeitada do protagonista de encontrar um parceiro romântico por meio de uma agência de relacionamentos é particularmente divertida. Uma sequência que vale à pena conferir.


Ficha técnica:
Direção: Gavin O'Connor
Produção: Amazon MGM Studios e Warner Bros. Pictures
Distribuição: Warner Bros. Entertainment
Exibição: nos cinemas
Duração: 2h05
Classificação: 16 anos
País: EUA
Gêneros: ação, drama

23 abril 2025

"Looney Tunes - O Filme: O Dia que a Terra Explodiu" eleva o caos clássico a uma escala cósmica

Gaguinho e Patolino estão de volta, agora com novos amigos para tentarem salvar o planeta de um extraterrestre (Fotos: Warner Bros. Animation)
 
 

Maristela Bretas

 
"Looney Tunes - O Filme: O Dia que a Terra Explodiu" ("The Day the Earth Blew Up: A Looney Tunes Movie"), que estreia nos cinemas nesta quinta-feira (24) traz de volta a inconfundível dupla Gaguinho e Patolino (ambos dublados por Eric Bauza) para uma aventura que expande a tradicional loucura dos desenhos animados para proporções galácticas. 

A animação nos leva desde a infância dos icônicos personagens em uma fazenda até a vida adulta, com o comportamento de Patolino sempre resultando num caos completo e a constante tentativa de Gaguinho de consertar as situações, reforçando a marca registrada da dupla. 


A introdução da super cientista Petúnia (dublada por Candi Milo), uma porquinha que vai fazer o coração do Gaguinho disparar e também adicionar uma nova dinâmica ao time, que se une para a nobre missão de salvar o planeta de um invasor alienígena (voz de Peter MacNicol).

O filme abraça sem pudor a essência dos Looney Tunes, entregando uma avalanche de gritaria, explosões e ferramentas ACME (marca registrada dos desenhos), perseguições frenéticas e aquele humor físico e sem noção que definiu gerações. Ao mesmo tempo, reforça a importância da amizade e da confiança.


Para os fãs de longa data, a familiaridade com esse formato é, sem dúvida, um dos grandes atrativos. A animação não tenta reinventar a roda, mas sim entregar uma dose concentrada daquela loucura adorável que consagrou Pernalonga e sua turma.

"Looney Tunes: de Volta à Ação" serve como um lembrete do histórico da franquia em transitar para a tela grande, misturando a animação característica com elementos do mundo real. 


Bons exemplos disso são dois sucessos no cinema em que a turma contracenou com personagens reais: "Space Jam: O Jogo do Século" (1996), com a presença do astro Michael Jordan, e "Space Jam: Um Novo Legado (2021), com a também estrela do basquete, LeBron James.

Embora o diretor Peter Browngardt tenha optado por uma abordagem puramente animada, a comparação mostra que os Looney Tunes ainda mantêm um público cativo. Ideal para quem busca uma experiência nostálgica e quer relembrar o humor despretensioso, barulhento e divertido dos famosos lunáticos.


"O Dia que a Terra Explodiu" não chega a proporcionar gargalhadas, tem uma história comum, não muito diferente de outras animações com estes personagens. 

Mostra que a fórmula de muita gritaria e explosões ainda funciona, com o foco principal no humor físico e nas situações absurdas, em detrimento de um enredo mais elaborado. 

"Looney Tunes - O Filme: O Dia que a Terra Explodiu" é uma celebração da anarquia clássica, em proporções cósmicas e politicamente incorreta que os fãs da franquia tanto apreciam. Um convite para desligar o cérebro e se divertir com as palhaçadas de Gaguinho, Patolino e seus novos amigos.


Ficha técnica:
Direção: Peter Browngardt
Produção: Warner Bros. Animation
Distribuição: Paris Filmes
Exibição: nos cinemas
Duração: 1h31
Classificação: Livre
País: EUA
Gêneros: aventura, animação, comédia, família

18 abril 2025

"Pecadores": Michael B. Jordan interpreta ‘gângsteres’ gêmeos em "Crepúsculo" do século passado

Ambientado no sul dos EUA, filme aborda a ancestralidade preta que resistiu às perseguições nos anos
de 1930 (Fotos: Warner Bros. Pictures)
 
 

Larissa Figueiredo 

 
Imagine uma mistura entre "Crepúsculo" (2008) e "Assassinos da Lua das Flores" (2023) — é assim que "Pecadores" ("Sinners"), de Ryan Coogler, funciona. O longa, que conta com o protagonismo de Michael B. Jordan (de “Pantera Negra” - 2018, “Creed - Nascido para Lutar" - 2015) em um papel duplo como os irmãos Elijah e Elias Smoke, e Hailee Steinfeld ("Bumblebee" - 2018) como Mary, às vezes mocinha, às vezes vilã, já está em cartaz nos cinemas.

Ambientado nos anos de 1930 no sul dos Estados Unidos, "Pecadores" aborda, por meio do misticismo, a ancestralidade preta que resistiu às perseguições durante o segregacionismo norte-americano. 


A família do jovem músico Sammy Moore (Miles Caton) enfrenta preconceitos, vampiros e até a Ku Klux Klan, grupo extremista que surgiu nos EUA para perseguir e matar pessoas negras no país à época. A temática do filme, no entanto, está longe de se restringir ao racismo.

Com os gângsteres gêmeos Elijah e Elias de volta à cidade e dispostos a viver a melhor noite de suas vidas, Sammy vê a oportunidade de mostrar sua música fora da igreja. 

Ele embarca em uma missão para convidar a comunidade negra para uma noite de blues em um antigo celeiro da Klan. Com comida à vontade e bebida de qualidade, o grupo pretende abrir um clube de blues na cidade.


A jornada acontece em meio à evolução de uma trilha sonora impecável, composta por Ludwig Göransson, já nos primeiros minutos. A fotografia acompanha o ritmo a partir de planos abertos de encher os olhos, com destaque para as paisagens dos campos de algodão, que cumprem papel sociopolítico na narrativa.

Até o fim da primeira metade do longa, quase não é possível perceber a presença do gênero terror no roteiro. O espectador se acostuma por muito tempo com um ritmo de filme de aventura e se afeiçoa aos “heróis” apresentados. 


O misticismo chega junto da personagem Annie (Wunmi Mosaku), uma bruxa natural e interesse romântico de um dos protagonistas, que fala sobre perigos espirituais e vampiros pela primeira vez. O roteiro parece desconectado à primeira vista, como se fosse metade aventura e metade terror.

Apesar da estranheza dos jump scares aleatórios e da aparente desconexão do roteiro, o filme prende o espectador e não apresenta elementos desnecessários — apenas desorganizados. A caracterização dos vampiros beira ao satírico; resta ao diretor dizer se é proposital ou não. 


A partir da primeira aparição, os personagens se desenrolam com um quê de Stephenie Meyer (autora da saga "Crepúsculo"), com dentes gigantes, alho, estacas de madeira e romances cheios de química.

A trama vampiresca se encerra como começa: do nada. Coogler, que dirigiu Jordan em “Pantera Negra” e “Creed: Nascido para Lutar”, repete elementos do filme sobre o super-herói negro da Marvel. E mistura o espiritual e o real para emocionar, não economizando nos simbolismos para falar sobre a morte. 

A cena pós-créditos é dispensável e sem sentido, mas (infelizmente) existe e impacta um final irretocável. Assista por sua conta e risco.


Ficha técnica:
Direção e roteiro: Ryan Coogler
Produção: Warner Bros Pictures
Distribuição: Warner Bros.
Exibição: nos cinemas
Duração: 2h17
Classificação: 16 anos
País: EUA
Gêneros: ação, suspense, terror