Filme foca na trajetória de um imigrante ganês que busca um futuro com
dignidade no continente europeu (Fotos: Frederic Batier
Sommerhaus/Filmproduktion)
Wallace Graciano
Se você chegou a esta crítica pelo Google procurando pelo termo "Berlin Alexanderplatz" no buscador, deve ter estranhado que as primeiras respostas não retratavam a película alemã lançada em 2020 (e que entra em cartaz nos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (18), mas, sim, ao livro de quase um século atrás.
E sim, o filme no qual vamos comentar hoje é baseado no clássico romance homônimo de Alfred Döblin. Porém, agora, a estrutura de outrora é condensada em uma narrativa contemporânea, que traz o drama e as facetas que envolvem a trajetória de um imigrante neste Século XXI.
A película nos apresenta Francis (Welket Bungué), um imigrante ganês que foi resgatado em meio ao drama que envolve quem tenta sair de um país assolado por conflitos sociais e desigualdade em busca de um futuro minimamente digno. Ainda refém de suas lembranças do passado, ele chega à Alemanha sem documentos, prometendo aos céus que será um homem leal e em busca de um caminho honrado.
Como boa parte de seus pares, ele trabalha ilegalmente em uma metalúrgica de Berlim, onde descobre que suas promessas e juras aos deuses dificilmente serão cumpridas, já que passa por diversas provações e dificuldades para ter o mínimo de possibilidade de ascender à dignidade buscada.
Em uma delas, especificamente, é traído pelos seus companheiros de trabalho (também ilegais) ao tentar salvar um deles de um destino trágico. Abandonado à própria sorte, opta por aceitar o convite de um traficante, Reinhold (Albrecht Schuch), que dias antes tinha ido ao alojamento onde estavam baseados para convidá-los para o submundo do crime.
É neste momento que a vida de Francis tem uma reviravolta. De promessas quebradas a um novo nome (é rebatizado por Reinhold), o protagonista passa a encarar sua pessoalidade. A partir desse momento, o drama e a catarse passam a coexistir em uma racionalidade objetiva de um cenário que enuncia a tragédia contemporânea.
Tudo, claro, por meio de um roteiro consistente, que evita que as quase três horas de filme fiquem morosas. Parte disso deve-se à excelente atuação de Schuch, que parece caricata a quem vê de primeira, mas se entrega a um personagem intimidador e sedutor em várias camadas. A ele soma-se a estética do brilho da noite contemporânea das grandes metrópoles, contrastada com o bucolismo do dia durante o inverno/outono europeu, em sua maioria através de planos longos.
O autor deste relato não leu a obra original, mas sentiu durante as três horas de "Berlin Alexanderplatz" um filme impactante, que intimida ao te trazer para a tragédia anunciada da vida de milhões de imigrantes em meio ao cenário caótico do abandono aos apátridas.
Ficha técnica: Direção: Burhan Qurbani Roteiro: Burhan Qurbani, Martin Behnke Duração: 1h23 Distribuição: A2 Filmes Países: Alemanha / Holanda Classificação: 16 anos Gênero: Drama
Sobreviventes do apocalipse enfrentam uma entidade poderosa
para chegar a um local místico (Fotos: Matt Wilkinson/Divulgação)
Maristela Bretas
"A Última Jornada" * ("The Last Boy") é um filme curto - com apenas 87 minutos de duração - mas que consegue ter uma narrativa lenta. Ao mesmo tempo, se apressa em contar já no s minutos iniciais todo o enredo, tirando o suspense do final. Não passa emoção nem mesmo nos momentos de perda, e o diretor e roteirista Perry Bhandal (que dirigiu "Entrevista com Hitman" - 2012) passa o carro na frente dos bois e entrega uma história confusa e cheia de buracos sobre um mundo pós-apocalíptico.
A ação fica quase toda para o final e não é tão significativa porque as situações vão surgindo sem explicações e passam como se nunca tivessem acontecido. O suspense perde o impacto, assim como a atuação decepcionante de um elenco pouco conhecido, que tem como "destaque" Luke Goss (dirigido por Bhandal em "Entrevista com Hitman", além de ter participado de "Traffik - Liberdade Roubada" - 2018).
Ao jovem estreante Flynn Allen ainda falta muita estrada para rodar até pegar o jeito, assim como a garotinha Matilda Freeman. Os demais são apenas peças numa produção com diálogos que deixam a desejar e comprometem ainda mais a fraca trama.
No filme, a mãe de Sira (Flynn Allen) está morrendo e dá a ele uma missão: com um misterioso artefato, o garoto terá de encontrar um lugar especial, capaz de realizar os desejos das pessoas. O dispositivo vai protegê-lo do ataque de uma força chamada de "o vento", capaz de matar instantaneamente qualquer ser vivo.
Pelo caminho, Sira conhece a pequena Lilly (Matilda Freeman) e juntos enfrentam um monge (Peter Guinness) que pratica abuso sexual contra um grupo de mulheres de um mosteiro. O vilão humano quer se apossar do dispositivo de Sira e dos poderes que tem contra o Vento. Assim como Lilly, aparecem durante a jornada o militar Jay (Luke Goss) e a cientista Jesse (Jennifer Elise Gould) que vão ajudar Sira a chegar ao destino especial e salvar o mundo do Vento (???).
Nem mesmo as locações salvam a história, que ainda conta com uma trilha sonora inexpressiva. Como se não bastasse, o diretor deixa a entender no final que "A Última Jornada" pode ganhar uma continuação. Se esta ocorrer vai precisar melhorar muito todos os componentes, para que se torne atraente ao público.
O filme de Perry Bhandal é distribuído em versões dublada e legendada nas plataformas digitais Now, Looke, Microsoft, Vivo Play, Google Play e Apple TV.
Vale um alerta: não confunda este "A Última Jornada" com a também produção britânica "Journey's End" (2018) sobre a 1ª Guerra Mundial, dirigida por Saul Dibb, que recebeu o mesmo título em português.
Ficha técnica: Direção e roteiro: Perry Bhandal Distribuição: A2 Filmes Duração: 1h27 Gêneros: Drama / Suspense País: Reino Unido Classificação: 12 anos
* Título assistido via streaming, a convite da A2 Filmes
George MacKay entrega uma boa interpretação do fora da lei
mais famoso da Austrália no século XIX (Fotos: A2 Filmes/Divulgação0
Maristela Bretas
Tenso, instigante e com locações que completam todo o clima
que o enredo de "A Verdadeira História de Ned Kelly" ("True
History Of Kelly Gang") exigia. Inspirado no romance best-seller de Peter
Carey, “A História do Bando de Kelly”, o filme é narrado pelo próprio Ned Kelly
(muito bem interpretado por George MacKay, de "1917") que, por meio de cartas endereçadas
ao filho, resolve contar a sua versão do mito criado em torno de seu nome que o
colocou como o mais famoso fora da lei ("bushranger") da história da
Austrália.
Descendente de irlandeses, filho de um pai expulso do país e
levado pelos ingleses para a colônia britânica de Victoria, o jovem Ned, de 12
anos (papel de Orlando Schwerdt), viveu a infância e adolescência tendo que
assumir o lugar de "homem da casa" após o pai ser preso. Dominado
pela mãe Ellie Kelly (Essie Davis), numa relação que beira o incesto, ele é
obrigado a conviver com a constante troca de parceiros dela por dinheiro.
Do sargento O'Neill (Charlie Hunnam) ao ladrão de cavalos e
procurado pela polícia Harry Power (Russell Crowe), para quem ele é vendido
pela mãe para que amadureça como homem, Ned vai passando da infância para a
adolescência vivendo uma realidade distorcida e cada vez mais violenta. Poucas
coisas fizeram com que ele se sentisse humano. Uma delas é o filho
recém-nascido, para quem ele escreve cartas, contando como foi sua trajetória,
nem sempre violenta e de crimes, de forma que ele saiba quem foi
realmente.
Diferente dos demais bandidos da década de 1870 (quando se
passa a história), o bando de rebeldes recrutados por Ned Kelly ficou conhecido
por usar vestidos em seus crimes. Mas o chefe do grupo foi além e criou uma
armadura de ferro para o peito e a cabeça com apenas espaço para os olhos,
capaz de defendê-los das balas da polícia. E foi assim que escreveu sua
história, como lhe ensinou Harry Power: "Sempre se certifique de que você
é o autor de sua própria história, porque os ingleses sempre pegam e estragam
tudo".
Com narração mais lenta em várias partes, o diretor Justin
Kurzel apresenta um Ned Kelly que gera dúvida no público - afinal ele foi um
cruel fora da lei ou uma vítima do preconceito contra os irlandeses levados
para a Austrália que acabou se tornando o bandido da lenda? Difícil dizer quem
é do bem e quem é do mal. Polícia e bandidos se comportavam de maneira
semelhante. Uma cena que choca é a do policial Fitzpatrick (papel de Nicholas
Hoult) ameaçando um bebê com um revólver.
Além do elenco que entrega boas interpretações, "A
Verdadeira História de Ned Kelly" ainda conta com ótimas locações que
ajudam a criar um clima sombrio, especialmente na floresta de Meulborne Gaol e
a neve do inverno australiano em Marysville, além da State Library,
Wangarratta, Dandengong Ranges, Glenrowan e uma bela e antiga fazenda chamada Mintaro.
Também a trilha sonora cumpre seu papel e ajuda a compor essa nova versão da
história de Ned Kelly.
A volta dos cinemas
Em cartaz de algumas cidades brasileiras que retomaram suas
exibições, "A Verdadeira História de Ned Kelly" poderá ser conferido
a partir do dia 31 de outubro em Belo Horizonte, quando as salas de cinema
serão reabertas. Segundo o Sindicato das Empresas Exibidoras de Minas Gerais
(Seecine-MG), todas as medidas de segurança sanitária serão tomadas e o
funcionamento será de 50% da capacidade.
Ficha técnica Direção: Justin Kurzel Roteiro: Shaun Grant Distribuição: A2 Filmes Duração: 2h05 Países: Austrália / França / Reino Unido Gêneros: Drama / Ação Classificação: 16 anos Nota: 3,5 (0 a 5)
O jovem Franz e o famoso psicanalista Sigmund Freud se tornam amigos em uma Viena ameaçada pelo nazismo (Fotos: A2 Filmes/Divulgação)
Da Redação
Com distribuição da A2 Filmes, estreia nesta quinta em BH. Juiz de Fora e outras 17 cidades, o drama alemão "A Tabacaria" ("Der Trafikant"), do diretor e roteirista Nikolaus Leytner. A produção, que foi um dos destaques na programação do Festival Judaico 2019, é um dos últimos trabalhos do grande ator Bruno Ganz ("A Queda! As Últimas Horas de Hitler" e "A Festa"), que desta vez interpreta Sigmund Freud.
Baseado no romance de Robert Seethaler, o filme conta a história de Franz (Simon Morzé), um rapaz de 17 anos que chega a Viena para trabalhar como aprendiz em uma tabacaria. Ali, ele conhece Sigmund Freud, um cliente frequente. Com o passar do tempo, os dois, apesar de origens muito distintas, desenvolvem uma amizade única.
Quando Franz se apaixona perdidamente pela dançarina Anezka (Emma Drogunova), ele busca os conselhos de seu amigo Sigmund, que, apesar de ser um renomado psicanalista, admite que o sexo feminino seja um grande mistério para ele em termos românticos. A tensão política e social aumenta dramaticamente na Áustria, piorando com a chegada dos nazistas à capital. Franz, Sigmund e Anezka se perdem no meio do caos da cidade e cada um terá uma decisão difícil a tomar: sair do país ou permanecer nele.
Ficha técnica: Direção e roteiro: Nikolaus Leytner Produção: EPO Film / Glory Film Distribuição: A2 Filmes Duração: 1h54 Gênero: drama Países: Alemanha / Áustria Classificação: 16 anos