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17 abril 2024

"Guerra Civil" é uma homenagem ao fotojornalismo com fortes referências ao perigo do extremismo

Wagner Moura interpreta um jornalista que percorre os EUA com outros jornalistas mostrando o conflito que divide o país
(Fotos: A24/Divulgação)


Maristela Bretas


Uma superprodução que merece entrar numa disputa ao Oscar 2025 por roteiro, direção, interpretação e, em especial, fotografia, mesmo mostrando, sem filtro, as atrocidades de uma batalha fictícia. Este é "Guerra Civil", longa que estreia nesta quinta-feira (18) nos cinemas e já é sucesso de bilheteria nas salas dos EUA.

O filme faz referências bem claras ao ataque ocorrido no país, em 2021, com a invasão ao Capitólio. Ao mesmo tempo em que mostra como a desinformação e o extremismo de direita podem levar um país ao caos quando disputam ou tentam retornar ao poder. Lembra a situação semelhante ocorrida no Brasil em janeiro de 2023.


No elenco temos como protagonistas o brasileiro Wagner Moura (Joel), Kirsten Dunst (Lee) e Cailee Spaeny (Jessie), jornalistas que percorrem os Estados Unidos durante o intenso conflito que envolve toda a nação. O país se vê dividido entre o governo oficial, com sede em Washington, e grupos separatistas de importantes estados, como Califórnia, Texas e Flórida.

A violência toma conta das ruas, a população é massacrada e a imprensa perseguida. O presidente fascista, interpretado por Nick Offerman, se tranca na Casa Branca, protegido por soldados, e ilude seus seguidores com informações de que ele tem o controle da situação e a vitória é certa, "em nome da pátria, de Deus e dos americanos de bem".


Este é o cenário que o trio, acompanhado pelo experiente correspondente de guerra, Sammy (Stephen McKinley Henderson), vai enfrentar ao atravessar as zonas de conflito de uma ponta a outra dos EUA. 

Ao mesmo tempo, vai se deparar também com comunidades totalmente alienadas ao que está ocorrendo. O elenco bem afinado conta ainda com boas interpretações de Jesse Plemons (marido na vida real de Dunst), Nelson Lee (Tony), Sonoya Mizuno (Anya), entre outros.


O diretor e roteirista Alex Garland mostra Américas completamente opostas, mas violentas e cruéis em ambos os lados do conflito. A violência marca o longa do início ao fim, como esperado de uma produção do gênero, com muitas mortes e torturas. 

Mas ele soube explorar com excelência essas imagens por meio do fotojornalismo. "Guerra Civil" dá um show neste quesito, especialmente nas fotos em preto e branco, que expõem de maneira mais real a dor, a crueldade, o espanto, a morte, a perda e o desalento.

Cabe às fotojornalistas Lee e Jessie capturarem a essência do conflito e suas intérpretes, Kirsten Dunst e Cailee Spaeny, entregam um ótimo trabalho. Wagner Moura não fica para trás, no papel do jornalista que tenta manter o foco da cobertura dos fatos, mas se abalando quando ele e seu grupo de tornam alvo e sofrem as consequências do conflito. Os efeitos visuais também são muito bons, em especial os dos ataques dos envolvidos da disputa.


O roteiro de "Guerra Civil" é uma homenagem ao jornalismo e aos jornalistas que fazem coberturas de conflitos, correndo os mesmos riscos dos combatentes. O próprio Alex Garland defendeu em entrevista ao jornal "The Guardian" que "jornalistas não são um luxo, são uma necessidade. É importante que a imprensa seja livre, respeitada e confiável".

O filme, apesar de ser uma ficção de guerra, se aproxima muito da vida real. E qualquer país, onde o extremismo e a desinformação predominem, está sujeito a passar por esta situação. "Guerra Civil" é um longa que vale a pena conferir, de preferência em uma sala Imax, para aproveitar melhor a experiência cinematográfica da produção.


Ficha técnica
Direção e roteiro: Alex Garland
Produção: A24
Distribuição: Diamond Films
Exibição: nos cinemas
Duração: 1h50
Classificação: 14 anos
País: EUA
Gêneros: guerra, drama, ficção

07 setembro 2022

“Men - Faces do Medo" é um estudo sobre traumas e o processo de cura

Longa de terror em que todas as figuras masculinas são interpretados pelo mesmo ator, o excelente Rory Kinnear (Fotos: Paris Filmes/Divulgação)


Carolina Cassese
Blog no Zint Online 


Os homens são todos iguais. Tal máxima se torna bastante literal em "Men - Faces do Medo", o mais novo filme de Alex Garland, que chega aos cinemas nesta quinta-feira (8). O longa de terror é centrado na história de Harper (Jessie Buckley), que, após passar por um término traumático, decide alugar uma casa no interior da Inglaterra com o intuito de passar um tempo sozinha. No entanto, diversos acontecimentos desestabilizadores atrapalham seu processo de cura.

O motivo da frase "os homens são todos iguais" ser relevante para o longa é bastante simples: em "Men", todas as figuras masculinas (o anfitrião da casa, a criança problemática da cidade, o vigário, o policial, o barman, o freguês do bar) são interpretados pelo mesmo ator, o excelente Rory Kinnear. 


Se levarmos em conta a figura do policial e do vigário, podemos considerar como eles também representam instituições que em determinados momentos históricos não ficaram necessariamente ao lado das mulheres. 

O vigário, ao conversar com Harper sobre a violência que ela sofreu, chega a dizer: "Isso acontece, os homens batem nas mulheres às vezes" Logo em seguida, seu discurso permanece carregado de culpabilização.


Além de serem iguais na aparência, outra inegável semelhança entre esses personagens é o fato de eles não darem muito valor às palavras da protagonista, em especial quando Harper pede ajuda por estar sendo perseguida (o stalker da protagonista, claro, é também interpretado por Rory Kinnear). 

O policial, por exemplo, não parece estar muito interessado em prevenir que algo aconteça com ela, apenas em "remediar" - retrato de uma sociedade que está disposta a punir, mas não a discutir questões de gênero e nem mesmo a proteger as mulheres quando necessário.


Boa parte das cenas de terror advém da perseguição que a protagonista sofre, ambientada primordialmente no espaço da casa. Há um sentimento de incômodo desde as primeiras cenas, quando o anfitrião apresenta seu espaço para Harper. Ele não sabe bem o que falar e ela tampouco tem certeza do que responder. 

Essa sensação de desconforto permanece em todo o filme, já que a personagem principal não consegue ficar realmente sozinha e refletir sobre sua vida. Ela parece não ser "autorizada", portanto, a passar por seu processo de cura.


Pode ser que o espectador se lembre um pouco da protagonista do longa "Homem Invisível" (2020), de Leigh Whannell, que também é atormentada por uma “aberração” masculina e praticamente não consegue ficar consigo mesma sem ser importunada. Essas mulheres, então,  lutam também pelo direito à privacidade. 

Outro filme que pode vir a mente é a animação "Anomalisa" (2015), de Charlie Kaufman e Duke Johnson, no qual vemos vários personagens iguais (com o mesmo desenho e, claro, a mesma dublagem).

Não é possível chamar a crítica que "Men" realiza de sutil, já que as metáforas são bem carregadas e até mesmo repetitivas. O diretor parece ainda não estar muito preocupado em apresentar soluções para o problema, apenas em evidenciá-lo. De qualquer maneira, é interessante perceber que filmes de terror agora tratam de temas sociais com mais frequência e, inclusive, são capazes de realizar críticas contundentes (o que acontece nos longas de Jordan Peele, por exemplo).


Definitivamente, não dá pra dizer que Garland deixa o espectador indiferente. Todos esses homens são, de fato, aterrorizantes (de jeitos diferentes e, ao mesmo tempo, muito similares). Eles não apenas representam várias esferas da sociedade, como também diversos tipos de violência. A partir da metade do filme, o espectador provavelmente ficará mais tenso e preso na história, que se aproxima do gênero terror.

Mesmo que algumas cenas sejam um pouco óbvias (e talvez “sobrem”), "Men" conta com atuações espetaculares e cenas angustiantes, além de ser um verdadeiro estudo do trauma - emoção que, para a personagem, já é por si só bastante assustadora.


Ficha técnica:
Direção e roteiro: Alex Garland
Produção: DNA Films / A24
Distribuição: Paris Filmes
Exibição: nos cinemas
Duração: 1h40
Classificação: 16 anos
País: EUA
Gêneros: terror / drama