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27 novembro 2022

Quinze anos depois, "Desencantada" é uma continuação que perde o encanto

Novo longa reúne personagens do primeiro filme, com Amy Adams ainda como protagonista (Fotos: Walt Disney Pictures)


Marcos Tadeu
Narrativa cinematográfica


"Desencantada" ("Disenchanted"), o filme mais aguardo da sequência de "Encantada" (2007), que você pode conferir crítica clicando aqui, chegou ao Disney+ no dia 16/11. E veio com a grande promessa que iria manter os moldes do filme anterior, trazendo uma Giselle diferente do que estamos acostumados. Vale lembrar que mais de 15 anos se passaram para o elenco original e seus personagens.

Na trama, continuamos literalmente depois do "felizes para sempre" e de alguns anos. Giselle e Robert (novamente interpretados por Amy Adams e Patrick Dempsey) agora são pais da pequena Sofia, enquanto Morgan (Gabriella Baldacchino) começa a enfrentar a fase da adolescência. 


Nossa protagonista descobre que a vida em Nova York não é um conto de fadas, o que a deixa muito cansada, ainda mais agora que tem que cuidar de uma bebê. Foi aí que teve a ideia de se mudar para Moronvile. 

Nancy e Edward (Idina Menzel e James Marsden, também do primeiro filme) vão visitar a família e deixa uma varinha de desejos de Andalasia. Mas somente quem pode usá-la é uma filha do antigo reino. 

Morgan, por outro lado, questiona por estar longe e não se sentir parte daquele novo lugar. Sua relação com a madrasta também muda.  Robert também sofre por trabalhar em Nova York e ter de se adaptar. 


Talvez o ponto mais positivo seja o primeiro ato do filme, que consegue trazer um contexto sobre o que o público irá esperar. Esses minutos iniciais nos levam a crer que ainda estamos com todos aqueles personagens de 2007. 

Porém, ao chegar na segunda parte, existe uma tentativa tão grande em mudar os rumos da história que tudo fica muito artificial, chato, vira praticamente outro filme.


Notamos que Giselle usou a varinha de Andalasia como forma de voltar a ser o que era antes e, principalmente, para ter um bom relacionamento com Morgan. Nossa protagonista se torna vilã, mas de uma maneira muito forçada. 

Amy Adams transita muito bem entre mocinha e madrasta má, porém isso não é suficiente para que o enredo ande de forma natural.


A desconstrução da personagem parece até interessante em um primeiro momento, mas logo se perde. Talvez fosse mais legal se o filme contasse como Giselle vive sua vida de adulta em Nova York. 

A produção abandona ou torna bobo os personagens e tudo fica muito sem nexo. Até Morgan tem uma mudança radical de comportamento,

Nancy, mostrada em duas ou três cenas, talvez seja a mais coerente em toda a sua história, mas ainda assim, a atriz Indina Mezel é prejudicada pelo roteiro fraco. Edward também é quase esquecido, vemos pouco de suas ações ao longo da trama.


As músicas da trilha sonora não têm a mesma força de ser "chiclete" e grudar na cabeça como o filme original. Também o figurino é bem exagerado, mais do que o comum.

É impossível não fazer comparações com a primeira produção, que teve referências a personagens e objetos da Disney colocadas de maneira pontual. Aqui existe uma necessidade extrema de ficar "arrotando referências" em toda obra, o que a deixa cansativo. 


Num terceiro momento, há outro ponto negativo: a necessidade de esclarecer o porquê Giselle de ela se tornar uma vilã. E ainda canta ao explicar isso ao amigo Pipe, quase chamando o espectador de burro.

Até com relação às vilãs, vemos que existe competitividade entre as mulheres. em "Desencantada" conhecemos Malvina Monroe, interpretada por Maya Rudolph, que está excelente em seu papel. 

Apesar de sua motivação ser apenas a de tomar a varinha do desejo para si e querer mostrar autoridade sobre Giselle, essa rivalidade entre as duas soa fraca e sem graça.


Tanto os cenários como o CGI parecem menos profissionais e mais artificiais. No longa original era possível ver algumas coisas que se misturavam ao cenário real. Mas no novo filme tudo é tão forçado e exagerado ao extremo que fica difícil "comprar a ideia".

"Desencantada" apesar de mágico e fabuloso, não consegue ser uma continuação à altura de "Encantada". Vale a pena conferir se for muito fã de Amy Adams, que também produtora desse segundo longa. Ela sim, carrega o filme nas costas e com classe, fora isso é uma produção que desencanta a quem assiste.


Ficha técnica:
Direção: Adam Shankman
Produção: Walt Disney Pictures / Entertainment
Exibição: Disney+
Duração: 2h01
Classificação: Livre
País: EUA
Gêneros: comédia, fantasia, aventura, família

08 novembro 2022

"Encantada" redescobre o "felizes para sempre" com magia e diversão

Live-action traz para os dias de hoje a fantasia do conto de fadas das princesas (Fotos: Walt Disney Studios)


Marcos Tadeu
Blog Narrativa Cinematográfica


Misturar live-action com animações já vinha se tornando uma prática em Hollywood desde "Uma Cilada para Roger Rabbit" (1988'), "Space Jam: O Jogo do Século" (1996) e "Looney Tunes: De Volta à Ação" (2003). Mas foi no ano de 2007, com "Encantada" ("Enchanted") que a Disney decidiu brincar com esse formato em suas princesas e escolheu Gisele para ser a protagonista da história. 

E deu tão certo que a produção faturou US$ 340,5 milhões de bilheteria e o prêmio de Melhor Filme de Família do Critics's Choice Award de 2008.


Na história conhecemos Giselle (Amy Adams), princesa no reino de Andalasia, que sonha em casar e viver o feliz para sempre com seu príncipe perfeito. Já o Príncipe Edward (James Marsden) é um jovem aventureiro que gosta de caçar ogros. Após salvar Giselle de um deles, confessa a seu assistente Nathaniel (Timothy Spall) que deseja se casar com Giselle. 


Tudo parecia perfeito, se o príncipe Edward não fosse enteado da rainha Narissa (Susan Sarandon), que não aceita que ele se case com uma pobre menina que gosta de falar com animais. A rainha então tem a ideia de se disfarçar para enganar a futura princesa, que é lançada em um poço, parando em um bueiro em plena Nova Iorque nos dias de hoje.


É muito interessante como que nessa introdução, todos os elementos de mocinhos, par romântico e vilões são bem apresentados. Giselle tem as mesmas aspirações que princesas clássicas como Branca de Neve, Aurora e Cinderela. 

O príncipe Edward também segue os padrões dos príncipes Encantado, Phillip, Henry.  Até as vilãs são uma singela homenagem à Rainha Má, Malévola e Lady Tremaine.


No mundo real, Giselle é obrigada a viver uma vida mais pé no chão, literalmente. Ela conhece Robert (Patrick Dempsey), que a leva para sua casa. Esse estranhamento da jovem é muito bem colocado na obra. 

As únicas coisas que ela sabe fazer é arrumar a casa, cantar com ratos e pombos para ajudar a limpar a bagunça do local e criar vestidos das cortinas do apartamento. 

Robert, além de ser noivo de Nancy (Idina Menzel) tem uma filha, chamada Morgan (Rachel Covey), que vê em Giselle a possibilidade de criar laços, por causa do falecimento de sua mãe.


O maior barato do filme é ver como Giselle faz com que Nova York. O olhar bondoso e inocente de nossa protagonista faz com que o espectador se apaixone por sua trajetória. Isso se deve muito ao carisma e simpatia de Amy Adams. 

Existem boas cenas como as passadas no parque, no restaurante italiano e no quarto de Edward. Esse bom humor nos desenhos ainda é uma assinatura carimbada do estúdio.


O alívio cômico é dado por Nathaniel, capanga da rainha Narissa, e Pipe, o esquilinho parceiro de Giselle. Enquanto um tenta atrapalhar não deixando que os pombinhos apaixonados se encontrem, o animalzinho faz de tudo para uni-los. 

A jovem passa o tempo tentando reencontrar o príncipe Edward, que também sai em busca dela. Além disso, Robert e Nancy, também começam a questionar seus sentimentos e ele passa a ver Giselle como sua outra metade. 


Na música "How Do She Know You Love Her" a princesa canta exatamente isso para ele questionando se, de fato, existe amor ali ou só uma paixão.  No roteiro ao colocar Edward e Giselle frente a frente, podemos notar que ambos estão em momentos diferentes e a jovem não o ama mais. 

Isso se confirma em mais uma valsa ao som de "So Close" quando Robert e Gisele se deixam levar pelo amor. Há uma quebra ali, um sentimento de não se sentir mais parte daquela pessoa.

Outro grande diferencial da narrativa é que não é a princesa que precisa ser salva. Além de descobrir o amor verdadeiro, ela luta por sua vida ao ser sequestrada pela rainha Narissa. Uma cena muito bem feita e coreografada.


Nos aspectos técnicos do filme temos que destacar a incrível e forte atuação de Amy Adams, que carrega o filme nas costas junto com Indina Mezel. Não menos importante estão as interpretações de Patrick Dempsey e James Mardsen. 

A trilha sonora de Alan Menken, que já assinou grandes obras do estúdio Disney traz canções viciantes que dão vontade de cantar sempre. Os figurinos, assinados por Mona May, também não ficam atrás e reforçam o padrão Disney de princesas, principalmente na cena do baile.


Talvez o único aspecto negativo, é o pouco tempo da história da rainha Narissa. Se a vilã fosse para Nova York durante o andamento da história, talvez fizesse com que o público comprasse suas motivações, mas nada que atrapalhe a experiência da obra.

"Encantada" redescobre o "felizes para sempre" de forma magistral, até sua conclusão. Um filme divertido e cheio de canções que nos inspiram a sonhar, mesmo em meio a uma vida cotidiana cheia de desafios.


Ficha técnica:
Direção: Kevin Lima
Produção: Walt Disney Pictures / Sonnenfeld / Josephson Productions
Distribuição: Walt Disney Pictures
Exibição: TV e Disney+
Duração: 1h51
Classificação: Livre
País: EUA
Gêneros: live-action, fantasia, aventura, família

02 dezembro 2020

"Era uma Vez Um Sonho" é um filme pra não ser visto e sim esquecido

 

Produção parece ter sido feita para tentar uma indicação ao Oscar para Amy Adams e Glenn Close (Fotos: Lacey Terrell/Netflix)


Jean Piter Miranda


Um jovem estudante de direito da conceituada universidade de Yale está bem perto de conseguir um bom emprego. Uma vaga em uma boa empresa, uma chance de carreira promissora. É a realização do chamado "sonho americano". E é isso que o jovem JD Vance (Gabriel Basso) tem. Só há um problema: ele precisa voltar às pressas a sua cidade natal para cuidar da mãe, Bev Vance (Amy Adams), que acaba que sofrer uma overdose de heroína.

Esse é o enredo de "Era uma Vez Um Sonho", do diretor Ron Howard, disponível na Netflix. Trata-se de uma adaptação do livro "Hillbilly Elegy: A Memoir of a Family and Culture in Crisis" ("Elegia Caipira: Memórias de uma Família e uma Cultura em Crise").


A primeira impressão que se tem é que JD Vance vai salvar o dia. Que terá forças e sabedoria para lidar com todos os problemas e que no fim tudo vai dar certo. Mas não. A segunda impressão é de que Bev teve muitos problemas na vida e que as drogas foram uma fuga. E que logo vamos ver que ela é uma pessoa boa, de muitas qualidades.  Também não. Então a esperança é a avó Mamaw (Glenn Close). Novamente não. Nenhum dos personagens é simpático. Todos são muito burros e antipáticos.

O filme tenta passar uma ideia de superação das dificuldades enfrentadas pela família de Vance em suas três gerações. A história vai intercalando momentos do passado, mas nenhuma das histórias fica bem contada. Não há consistência em nada. Tudo é muito vago, forçado e superficial.



Amy Adams tem uma interpretação muito boa, de destaque. Mas passa do ponto. A caracterização para ela ficar semelhante à Bev real é elogiável. E parece que os produtores do filme se perderam nisso. Fizeram uma obra pra de qualquer jeito só pra Amy aparecer e ter sua chance à estatueta. 

O mesmo se aplica a Glenn Close. O que não sei se cola. Essa é mais uma impressão. Interpretações boas, mas que erraram a mão com um roteiro chato e cansativo. Os personagens são grosseiros, toscos. Nem com muita boa vontade você consegue torcer por eles.


Pra piorar, Haley Bennett e Freida Pinto são muito mal aproveitadas na história. Haley interpreta Lindsay, irmã de Vance, e Freida é Usha, namorada dele. As duas são personagens decorativas que nada acrescentam à história. Usha só aparece em conversas sem sentidos e bem tediosas ao telefone com Vance. E são muitas as cenas ao telefone. A cada uma você torce para o filme acabar depressa.

Daria para mostrar que gente branca também pode ser pobre nos EUA, que são muitas e que não há políticas públicas para enfrentar esse problema. Que o sistema de saúde privado é cruel: se não paga (caro) não tem atendimento. Que não há política para tratamento de dependentes químicos. Que não há oportunidade pra todos. E que só vontade e trabalho não são suficientes para vencer na vida. Mas tudo isso é ignorado. E o filme no fim só é chato mesmo.


Amy e Glenn podem ser indicadas ao Oscar e a outras premiações, muito por falta de concorrentes, uma vez que o número de lançamentos nesse ano foi bem reduzido por conta da pandemia. Mas indicações por melhor filme e direção são pouco prováveis e nada merecidas. Amy e Glenn têm interpretações bem melhores em suas carreiras. Assim como a @Netflix possui produções mais merecedoras de elogios. Definitivamente, "Era uma Vez Um Sonho" é um filme pra ser esquecido.


Ficha técnica:
Direção: Ron Howard
Exibição: Netflix
Duração: 1h56
Classificação: 16 anos
País: EUA
Gênero: Drama


Tags: #EraUmaVezUmSonho, #AmyAdams, #GlennClose, #drama, #RonHoward, #Netflix, @CinemaEscurinho, @cinemanoescurinho

30 janeiro 2019

Original e criativo, "Vice" é, antes de tudo, um filme cínico

O diretor Adam McKay fez a escolha acertada ao chamar Christian Bale para viver o personagem Dick Cheney (Fotos: Universum Film/Divulgação)

Mirtes Helena Scalioni


Não há como negar: é muito criativa a forma que o diretor Adam McKay encontrou para mostrar como o jovem beberrão e mau elemento Dick Cheney se transformou, durante um tempo, no homem mais poderoso do mundo. A história do vice-presidente de George W. Bush, que ficou no poder de 2001 a 2009, é contada de um jeito original e único no filme "Vice", em que o diretor convida constantemente o espectador a observar, refletir, participar.

A narração em "off" e o depoimento direto para a câmera de alguns dos coadjuvantes da vida de Dick ajudam a carregar na ironia, quase caindo na galhofa. Não faltam piadas entre uma e outra cena, algumas ridicularizando figuras conhecidas da política norte-americana.

Não é por acaso que "Vice" é classificado por muitos como "comédia dramática". Na verdade, Dick Cheney parece ter nascido personagem. Coube a Adam McKay a difícil tarefa de mostrar ao público de forma inteligente o verdadeiro tabuleiro de xadrez da política e a falta de escrúpulos do segundo homem dos Estados Unidos quando se tratava de atingir seus objetivos. Principalmente no episódio das Torres Gêmeas, no 11 de setembro de 2001, que acabou desencadeando a questionável Guerra do Iraque.

Outro acerto de McKay foi a escolha de Christian Bale para viver o protagonista. Como sempre faz, Bale entrou de cabeça, emprestando seu corpo às transformações necessárias para dar credibilidade a um Dick contraditório, ambicioso, vaidoso e prepotente, porém escorregadio e evasivo. O ator se transforma diante dos olhos do espectador na medida em que o tempo passa, num jogo de expressão corporal e composição perfeitas do personagem. É assim que ele cativa o público e dá credibilidade às manobras e manipulações do vice.

Assim como a mulher de Dick, Lynne Cheney, foi fundamental na vida e na carreira política do marido, a atriz Amy Adams é de fundamental importância em "Vice", interpretando a típica esposa que age nos bastidores, aconselha, joga e, acima de tudo, também ama o poder. A química entre o casal é visível e passa verdade e cumplicidade.


Steve Carell, que faz o deputado Donald Rumsfeld, com quem Dick começa sua carreira, também brilha como o político esperto sempre disposto a atingir seus objetivos. Sam Rockwell dá seu recado como um George W. Bush tão manipulável quanto perigoso, e Jesse Plemons enche o filme de interrogações como Furt, o "doador do coração" - pra não dar spoiler.

"Vice" está indicado ao Oscar de "Melhor Filme", "Melhor Diretor", e Christian Bale concorre a "Melhor Ator" - entre outras indicações. Merecidamente, diga-se. Ao final surpreendente do filme fica no público a certeza de como somos todos manipulados pelos políticos e pela mídia. A ideia que passa, por mais cínica que possa parecer, é: somos todos otários.
Duração: 2h12
Classificação: 14 anos
Produção: Imagem Filmes


Tags: #Vice, #ChristianBale, #SamRockwell, #AmyAdams, #SteveCarell, #drama, #biografia, @ImagemFilmes, @cineart_cinemas, @cinemanoescurinho