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16 dezembro 2024

"Empate" amplifica as muitas vozes de Chico Mendes

Obra revisita a história do líder seringueiro e traz uma reflexão urgente sobre a preservação da Amazônia (Fotos: Talita Oliveira)



Silvana Monteiro


Mais do que um registro histórico, o documentário “Empate”, dirigido por Sérgio de Carvalho, é uma obra que revisita a história do líder seringueiro Chico Mendes, assassinado em 1988, e de seus companheiros de luta. Mas também traz uma reflexão urgente sobre a preservação da Amazônia em tempos de intensos desafios ambientais e políticos.

Infelizmente, “Empate” teve uma curta exibição em poucas salas de cinema no país – Belo Horizonte não foi contemplada com a obra. Em Minas Gerais, apenas Poços de Caldas, no Sul do Estado, recebeu o documentário. A expectativa é de que entre em breve o documentário seja lançado em algum canal de streaming.


O filme nos conduz por uma narrativa simples, porém muito humana, capaz de emocionar e nos fazer conhecer as pessoas retratadas como se fossem amigos nossos, sentados em nossa sala de estar. 

Ao relembrar a luta de seringueiros nas décadas de 1970 e 1980, o enredo amplifica as vozes de Chico Mendes por meio das memórias e experiências destes trabalhadores. 


O documentário se destaca por fugir da abordagem biográfica convencional. Em vez de reforçar a imagem de Chico Mendes como um herói inalcançável, a obra ilumina os relatos de seus companheiros de luta, como Gomercindo Rodrigues, Marlene Mendes, João Martin e Raimundão. 

Esses depoimentos tecem um retrato autêntico e sensível, onde a resistência coletiva ganha protagonismo. A sensação é de estar numa roda de conversa, em que memórias e reflexões ecoam como um apelo à continuidade da luta.


A simplicidade narrativa é uma das grandes virtudes de “Empate”. Sem recorrer a artifícios grandiosos, o diretor encontra força na combinação entre imagens potentes da floresta — ora exuberante, ora castigada por queimadas — e os rostos marcados daqueles que resistiram à exploração predatória. 

A direção de fotografia, assinada por Leonardo Val e Pablo Paniagua, captura a beleza e a dor da Amazônia com igual intensidade. Cada detalhe — do brilho nos olhos dos seringueiros à densidade das matas — reforça o caráter atemporal da história.


Um dos pontos fracos do filme é a falta de mais imagens de Chico Mendes. Apesar de iniciar com cenas históricas do ambientalista, esta cronista que vos escreve, esperou por mais registros que mostrassem o homem a quem homenageiam. 

Uma coisa é fato, embora simples, o documentário cumpre a missão de nos lembrar que as vozes da floresta ainda clamam por justiça, enquanto nos impele a agir. 

Ao final, fica uma mensagem clara: o legado de Chico Mendes não é uma história encerrada, mas um chamado constante para que assumamos nosso papel na defesa do planeta.


Ficha técnica:
Direção: Sérgio de Carvalho
Produção: Saci Filmes
Distribuição: Descoloniza Filmes
Exibição: nos cinemas
Duração: 1h30
País: Brasil
Gênero: documentário

24 fevereiro 2024

“Amanhã” olha para o passado, o presente, o efeito do tempo e as questões sociais

Novo documentário de Mauro Pimentel tem como cenário a a Barragem Santa Lúcia, em Belo Horizonte
(Fotos: Gabriela Matos e Arquivo Pessoal)


Eduardo Jr.


Chega aos cinemas nesta quinta-feira (29) o novo documentário de Marcos Pimentel. Batizado “Amanhã”, o longa coloca, no mesmo plano, crianças de classes sociais distintas, capturando alguns de seus desejos para o futuro, e retorna 20 anos depois para acompanhar como essas personagens estão vivendo. A obra é produzida pela Tempero Filmes, com distribuição da Descoloniza Filmes.  

O início do filme não diz ao espectador o que esperar. O ano é 2002 e crianças brincam em um cenário conhecido dos belorizontinos: a Barragem Santa Lúcia. O lago e a praça de esportes parecem atuar como fronteira, separando um bairro de classe média de uma favela.


Quando se mudou para Belo Horizonte, no ano 2000, Pimentel se impressionou ao perceber que, embora vizinhos, moradores de um lado dificilmente atravessavam para o outro. Mas a convite do diretor, morro e asfalto se aproximaram. O pequeno Tomaz é o personagem que sai do apartamento pra brincar com Julia e Cristian, dois irmãos que vivem no morro.

O material, gravado em 2002, é apresentado às mães das crianças duas décadas depois. E aí o documentário começa a mostrar a que veio. As memórias e opiniões dessas mulheres e das crianças, agora crescidas, expõem como o abismo social, não percebido na infância, se escancara. E não só porque eles se tornaram adultos, mas porque o país mudou.


O próprio diretor, em uma de suas narrações, exemplifica isso ao expor a percepção de que a camisa da seleção brasileira, festejada na Copa de 2002, se tornou símbolo da discórdia duas décadas depois. Até a ausência de uma das personagens é posicionamento. 

E a maneira como esses elementos são dispostos no longa vão levando o público a refletir sobre diversas pautas do cotidiano, de consciência política à urbanização.

Um filme sensível sobre encontros, desencontros, mazelas sociais e o efeito do tempo. Talvez por isso, o documentário tenha sido exibido em competição no É Tudo Verdade, recebido Menção Honrosa no 5º Pirenópolis Doc e premiado no 27º FAM - Florianópolis Audiovisual Mercosul.  


Ficha Técnica:
Direção: Marcos Pimentel
Depoimentos/Imagens de Arquivo: Cristian de Miranda, Cristiana Santos, Júlia Maria
Produção: Tempero Filmes
Distribuição: Descoloniza Filmes
Exibição: nos cinemas
Duração: 1h46
Classificação: 12 anos
País: Brasil
Gênero: documentário

27 fevereiro 2023

Documentário “Muribeca” mostra a destruição de uma comunidade

Filme distribuído pela Descoloniza Filmes chega às telas após rodar por festivais nacionais e internacionais (Foto: Alcione Ferreira)



Eduardo Jr.


“Muribeca é memória; porque não volta, não existe mais”. A definição na voz de uma das pessoas ouvidas no documentário de mesmo nome não é exagero. O bairro, localizado em Jaboatão dos Guararapes, em Pernambuco, vive um processo de apagamento e resistência.

Este é o ponto de partida da produção encabeçada por Alcione Ferreira e Camilo Soares, que chega às telonas no dia 2 de março. 

(Foto: Alcione Ferreira)

O espectador não precisa esperar imagens exuberantes. As cenas do grande conjunto habitacional deteriorado dialoga com a tristeza dos depoimentos. E a essa combinação se somam gravações antigas de uma comunidade festiva. 

Está posto o contraponto e o incômodo: como um bairro de periferia, em que as pessoas se reuniam nas ruas para curtir o carnaval e jogos de copa do mundo, se transforma em uma cidade fantasma?       

(Foto: Alcione Ferreira)

Momentos significativos

A produção de 1 hora e 18 minutos responde a essa questão, mas não sem antes colocar na tela momentos significativos. Como a cena de um céu com nuvens anunciando tempo ruim, enquanto, ao fundo, um berimbau chama para a luta. 

E também a saudade de pessoas pobres que foram forçadas a abandonar amigos, seus lares, toda uma vida construída ao longo de décadas.   

(Foto: Alcione Ferreira)

Entre os depoimentos, colhidos em 2018, estão os do quadrinista Flavão, que também atuou como produtor local no documentário, e de outros moradores. 

Com a demolição de um dos prédios, caem também as lágrimas e vem à tona o desespero de quem viu a vida ruir e de quem tenta, melancolicamente, resistir em um cenário de problemas estruturais, especulação imobiliária e insegurança jurídica. 

Camilo Soares e Alcione Ferreira (Foto: Rafael Cabral)

Contadores de histórias

Se aproximar de pessoas e contar histórias junto delas não é novidade para os diretores. A jornalista Alcione Ferreira foi fotojornalista e videorrepórter do Diário de Pernambuco, onde conquistou o prêmio Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos.

Camilo Soares é um dos fundadores da produtora de cinema Senda, e participa do coletivo de fotógrafos CRIA. 

(Foto: Shilton Araújo)  

“Muribeca” foi realizado com poucos recursos, mas ainda assim conquistou espaço em diversos festivais, como o Toronto Lift-Off (Canadá), Fidba (Argentina), Cine Del Mar (Uruguai), Aubervilliers (França), GBiennale (Austrália), Metrópolis (Itália), Cine PE, Festival de Santos, Mostra de Ouro Preto e Cine Sesc. 

A distribuição é da Descoloniza Filmes, que nasceu com o propósito de equiparar a distribuição de filmes dirigidos por mulheres, e que já codistribuiu, com a Vitrine Filmes, a produção “Carta Para Além dos Muros”. 


Ficha técnica:
Direção e roteiro: Alcione Ferreira e Camilo Soares
Produção: Senda Produções
Distribuição: Descoloniza Filmes
Exibição: nos cinemas
Duração: 1h18
Classificação: 12 anos
País: Brasil
Gênero: documentário