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31 julho 2024

“Estranho Caminho" - Com mineiro de Santa Tereza, obra é poesia sobre caos

O roteiro de Guto Parente habilmente mescla elementos dramáticos, psicológicos e fantásticos (Fotos: Sinny Assessoria)


Silvana Monteiro


Chega aos cinemas nesta quinta-feira (1⁰ de agosto), o longa "Estranho Caminho", do diretor Guto Parente, vencedor de 16 prêmios nacionais e internacionais, com destaque para o Festival de Tribeca 2023 (EUA), onde conquistou as estatuetas de Melhor Filme, Melhor Roteiro para Guto Parente, Melhor Fotografia para Linga Acácio e Melhor Performance para Carlos Francisco. 

Também venceu os prêmios de Melhor Roteiro (Guto Parente) e Melhor Ator Coadjuvante para o ator mineiro Carlos Francisco no Festival do Rio, e Melhor Filme da Mostra Autorias da 27ª Mostra de Cinema de Tiradentes 2024 (Brasil). O filme está em exibição no Centro Cultural Unimed-BH Minas e no Cine Una Belas Artes.


Com uma história que se passa em meio à turbulência da pandemia que assolou o mundo, o diretor cearense Guto Parente fez um filme inspirado em sua trajetória pessoal. "Estranho Caminho" permite que o espectador entre de cabeça no caos e na poesia da busca pela realização de sonhos, das conexões e relações familiares, das adversidades e do autoconhecimento.

O protagonista David, interpretado por Lucas Limeira, é um jovem cineasta que retorna à sua cidade natal, Fortaleza, para apresentar seu filme em um festival. Porém, sua chegada é no famoso estilo expectativa x realidade. Seu caminho é repleto de percalços - desde o momento em que põe os pés na cidade, até não encontrar acolhida entre amigos, sofrer com a violência do lugar e se ver perdido em meio às restrições de uma crise sanitária. 

Esse desencontro com o seu lugar de origem e com o sonho de levar a público sua arte, é o ponto de partida para um enredo dramático com toques de fantasia e trama psicóloga. 


Ao se ver forçado a reencontrar o pai, Geraldo, interpretado por Carlos Francisco, com quem não fala há anos, David enfrenta seus próprios demônios e questionamentos sobre seu passado e sua carreira artística. 

O roteiro de Parente habilmente mescla elementos dramáticos, psicológicos e fantásticos, criando um universo compativelmente estranho com o fato de tentar entender o que é uma pandemia, ao mesmo tempo, instigante e intimista, páreo para uma convivência forçada. 

O ator Carlos Francisco, mineiro de Belo Horizonte, nascido e criado no bairro de Santa Tereza, interpreta Geraldo com tanta maestria que recebeu os prêmios de melhor ator coadjuvante no Festival do Rio 2023; melhor performance no Festival Tribeca, EUA, 2023, e melhor atuação no Festival da Fronteira, no Brasil em 2023. 


Em relação à fotografia, Linga Acácio, com seus jogos de luz e sombra, contribui para a atmosfera onírica e perturbadora do filme. Já a trilha sonora de Uirá dos Reis e Fafa Nascimento adiciona camadas de profundidade e reflexão à narrativa. O elenco, composto majoritariamente por atores cearenses, entrega performances impactantes e repletas de nuance.

"Estranho Caminho" é uma obra que desafia os gêneros convencionais, trazendo uma experiência cinematográfica estranha e provocativa. Parente consegue falar sobre temas universais, como as complexidades da família e da identidade, por meio de uma lente altamente pessoal e poética. 


É um filme que eu resumiria com os versos de um poeta, não do sertão cearense, mas do sertão mineiro, João Guimarães Rosa, em "Grande Sertão: Veredas": “Todo caminho da gente é resvaloso. Mas; também, cair não prejudica demais – a gente levanta, a gente sobe, a gente volta! (...) O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem.”


Ficha técnica
Direção: Guto Parente
Produção: Tardo Filmes
Distribuição: Embaúba Filmes
Exibição: Centro Cultural Unimed-BH Minas e Cine Una Belas Artes
Duração: 1h23
Classificação: 14 anos
País: Brasil
Gêneros:
drama, documentário

28 setembro 2019

"Foro Íntimo": Fórum Lafayette é cenário para drama de juiz ameaçado de morte

Arquitetura em formato de caixa e a cor cinza do concreto do Fórum de BH ajudaram a compor o longa (Foto: Embaúba Filmes/ Divulgação)

Da Redação (Com informações do TJMG)


O cenário escolhido foi o ideal para contar uma história sobre a violência que atinge até as grandes autoridades do país - o Fórum Lafayette, em Belo Horizonte. O filme é "Foro Íntimo", do diretor, roteirista e produtor Ricardo Mehedff, que está em cartaz no Cine Belas Artes (salas 2, sessão às 15h20, e 3, às 18h10) e nas principais capitais do país – Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba, Porto Alegre, Brasília, Salvador e Fortaleza, e deverá percorrer outras cidades brasileiras.

Foto: Robert Leal/TJMG
Selecionado para mais de 30 festivais estrangeiros, foi vencedor de cinco deles como Melhor Filme - Londres, Buenos Aires, Otawa (Canadá), Portugal e Irã. "Foro Íntimo" é um drama psicológico todo em preto e branco. De acordo com Ricardo Mehedff, que dividiu o roteiro com Guilherme Lessa, a ideia surgiu quando leu sobre a história do juiz criminal Odilon de Oliveira, do Mato Grosso. Ele julgava casos de narcotráfico e foi obrigado a se afastar da família e morar dentro do fórum por seis meses, devido às ameaças que começou a sofrer.

Foto: Robert Leal/TJMG
A ficção acompanha 24 horas na vida de um importante juiz criminal ameaçado de morte por seu trabalho de risco, julgando perigosos criminosos. Ele se torna refém do sistema legal ao ter que ficar trancado no gabinete onde trabalha no Fórum, sob um forte esquema de segurança, longe de seus familiares, escondidos na Argentina. O ator Gustavo Werneck interpreta o magistrado ameaçado - Dr. Teixeira. O elenco conta ainda com Jefferson da Fonseca Coutinho (chefe dos guarda-costas), Bia França (advogada), Léo Quintão (promotor), André Senna, Letícia Castilho e Edu Costa. Saiba mais sobre a produção na entrevista do diretor Ricardo Mehedff ao Programa Justiça em Questão, do TJMG.

Fórum Lafayette (Foto: Embaúba Filmes/Divulgação)
A pesquisa para escolha do local ideal para as filmagens levou Mehedff ao Fórum Lafayette como o mais adequado. Sua arquitetura em formato de caixa, a cor cinza do concreto e os imensos corredores contribuíram para dar a sensação de claustrofobia desejada para o roteiro. O apoio do então juiz diretor do foro, Cássio Azevedo Fontenelle, além dos depoimentos de juízes e servidores de diversos setores do Fórum, ajudou o cineasta a conhecer melhor o sistema e a rotina do judiciário brasileiro. O longa foi filmado inteiramente dentro do fórum, num prazo recorde de três semanas, entre 2015 e 2016, aproveitando o recesso forense.


Ficha técnica:
Direção, Produção e Roteiro: Ricardo Mehedff
Produção: VFilmes / Hungry Man Produções
Distribuição: Embaúba Filmes
Duração: 1h14
Gênero: Drama
País: Brasil
Classificação: 12 anos

Tags: #ForoIntimo, #RicardoMehedff, #EmbaubaFilmes, #VFilmes, #justicabrasileira, #ForumLafayette, #drama, @justicaemquestao, @TJMG, @cinemaescurinho, @cinemanoescurinho

03 agosto 2019

"No Coração do Mundo": periferia, desigualdade, violência e esperança com sotaque mineirinho

Filmado na periferia de Contagem, longa é o mais recente trabalho dos diretores belo-horizontinos Gabriel Martins e Maurílio Martins (Fotos: Leonardo Feliciano)


Mirtes Helena Scalioni



É possível conciliar ética e honestidade com uma vida cheia de privações e sacrifícios nesses tempos de consumismo, vaidades e exibicionismos? É possível resistir a tantas delícias que parecem fáceis quando se vive num lugar chamado Laguna, a periferia da periferia da cidade de Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte? Em nome de quê alguém pode seguir trabalhando honestamente, mesmo sendo maltratado e humilhado? Há esperança para os jovens pobres neste Brasil de tanta desigualdade? É mais ou menos isso que parece perguntar o filme "No Coração do Mundo", em cartaz no Belas Artes e Cineart Shopping Contagem.


Gabriel Martins e Maurílio Martins, os diretores do longa, conhecem muito bem essa realidade. Ambos viveram em Contagem e assinaram o premiado curta-metragem "Contagem/The inside", em 2010. Não é por acaso que apostam no tema favela/periferia/violência/drogas depois de tantos filmes tratando do assunto. Sai Cidade de Deus, entra Laguna. Sai Rio de Janeiro, entra Contagem. Sai o sotaque carioca com seus xis, entra o mineirês característico, quase caricato, com seu "uai", "sô" e "nossinhora". Muda o sotaque, mas a questão permanece: uma juventude abandonada à própria sorte, pulando de galho em galho, vivendo de bicos ou de trabalhos mal remunerados, amenizando o cotidiano com frequentes tragadas de maconha. Ninguém é de ferro.


Marcos (Leo Pyrata) é exemplo típico do jovem da periferia de Contagem (e de outras tantas cidades Brasil afora). Vive de pequenos delitos, sonha se casar com a batalhadora e romântica Ana (Kelly Crifer), que trabalha duro como cobradora de ônibus e vive se metendo em encrencas. Entre seus amigos estão figuras como uma ex-presidiária com quem conversa sempre enquanto divide o cigarro de maconha; a cabeleireira (Bárbara Colen), que dá duro no salão, tem marido, amante e ainda planeja "fazer Uber" à noite para complementar o orçamento e, ultimamente, a fotógrafa Selma (Grace Passô), que o convida a participar de um grande golpe, capaz de consertar para sempre a vida dele e de Ana.


A primeira cena de "No Coração do Mundo" já sinaliza: trata-se de um filme de grandes atuações, embora não conte com nenhum nome global/televisivo. Magnífica como sempre, Karine Teles ("Que Horas Ela Volta" - 2015, e "Benzinho" - 2018) tem pequena, mas marcante participação no início como a locutora daquelas empresas que promovem festas-surpresa. Todo o elenco está muito bem, com interpretações tão naturalistas que lembram um documentário.


Além da talentosa Grace Passô, conhecida em BH como grande atriz, autora e diretora de teatro, merecem destaque Leo Pyrata, que entrega um Marcos meio ingênuo, meio malandro; Kelly Crifer como a esperançosa e bela Ana; e Bárbara Colen como a cabeleireira que consegue trabalhar e viver como ninguém. Como são atores desconhecidos em sua maioria, não se justifica que, no final do longa, os nomes apareçam sem identificação dos personagens para que o público os reconheça. A relação atores/personagens só aparece mesmo naquela lista grande no final dos créditos, sem qualquer possibilidade de destaque.


A trilha sonora, repleta de funks e raps modernos e criativos, prova mais uma vez que a música que se faz em Minas vai muito além das canções de papo cabeça do Clube da Esquina ou dos rocks e baladas de Skank e Jota Quest. Com letras provocativas e rebeldes e ritmo envolvente, as canções de "No Coração do Mundo" são praticamente um personagem à parte.

Embora às vezes apresente cenas e personagens praticamente inúteis, como se a direção quisesse insistir para que o espectador jamais se esquecesse de onde e como aquele pessoal vive, há toques interessantes como a presença teimosa da religião com seus cantos e louvores permeando a miséria. Mas no fundo, todos - os bons, os maus e os moderados - estão em busca de mudança. Querem todos se mudar para um lugar chamado coração do mundo, que, segundo consta, fica bem pertinho de algum paraíso, onde a esperança sempre se renova.


Ficha técnica:
Direção e roteiro: Gabriel Martins e Maurílio Martins
Produção: Filmes de Plástico
Distribuição: Embaúba Filmes
Duração: 2 horas
Gênero: Drama
Localidade: Contagem (MG)
Classificação: 16 anos

Tags: #NoCoracaodoMundo, #EmbaubaFIlmes, #FilmesdePlastico, #Contagem, #GabrielMartins, #MaurílioMartins, #cinemaescurinho