Baseado em fatos reais, o drama trata da persistência de um pai em transformar suas filhas em lendas num esporte elitizado (Fotos: Warner Bros. Pictures) |
Marcos Tadeu
@Prosa&Cultura
“King Richard: Criando Campeãs” funciona como um bom longa
motivacional ao mostrar a força e a garra das irmãs tenistas Serena e Vênus
Williams em meio a uma época de racismo e um pai abusivo. Na história
conhecemos Richard Williams (Will Smith), um pai batalhador, esforçado, que vê a
chance de tornar suas filhas Vênus (Saniyya Sidney) e Serena (Demi Singleton)
em atletas renomadas do tênis, o que acabou acontecendo. O filme estreia nesta quinta-feira (2) apenas nos cinemas.
Em um primeiro momento, o filme busca apresentar o drama de
Richard: as tarefas domésticas, as dificuldades financeiras e como conciliar
tudo isso com seus dois empregos, de faxineiro na quadra do bairro e segurança
em uma firma. Ele começa a desenvolver conhecimento e habilidades no tênis
lendo e assistindo partidas na TV.
A partir daí, percebe que suas filhas têm um grande
potencial para se tornarem atletas de peso nesse esporte, praticado em 90% por
brancos. Seu maior desafio é fazer com que Vênus e Serena sejam treinadas por
técnicos que as ajudem a buscar seu objetivo. É interessante ver que as camadas
do longa são bem definidas pelo diretor Reinaldo Marcus Green, deixando o
telespectador contextualizado sobre o que viria. Além do fato de apresentar uma
família de negros e toda questão racial em torno disso e do esporte em si.
Em um segundo momento notamos os métodos nada convencionais
de Richard treinar as filhas. Até mesmo na forma como ele bate de frente com os
técnicos que aparecem para ajudar as irmãs Williams. A relação do personagem
principal, título do filme, com os treinadores é conturbada. Muitas são as
vezes em que ele tenta ensiná-los como trabalhar. Isso se repetiu com os dois
técnicos - Rick Macci (Jon Bernthal) e Paul Cohen (Tony Goldwyn).
O filme aqui decide ir por caminhos que ficam entre o tom de
comédia e o drama. Ao mesmo tempo em que Will Smith interpreta um pai preocupado
e zeloso com as filhas, muitas vezes peca pelo excesso em cobrar perfeição das
jovens. Os desafios de guiá-las dentro de quadra, mesmo com a presença de um
técnico, muitas vezes geram atritos e até situações de racismo.
Em grande parte da narrativa há uso excessivo de frases de
efeito, principalmente em relação a Serena e Vênus, reforçando a ideia de que
elas vão conseguir alcançar seus objetivos jogando tênis. Tanto os técnicos,
como a família incentivam as atletas a não desistirem até alcançarem o sucesso.
Até certo ponto isso funciona, porém, usado em excesso faz parecer que soa
forçado. A relação das irmãs com as quadras e o tempo também são importantes para mostrar o desejo de se ter um esporte na vida e de torná-lo profissão. Vênus, claro, é a maior atração e isso fica bem visível durante toda narrativa.
Outro aspecto positivo é a parte técnica - figurino, cabelo
e maquiagem. Um trabalho bastante cuidadoso. Ao comparar imagens reais de Richard, Vênus e Serena Williams com as dos atores, tudo é muito verossímil e
próximo do real. Um ótimo ponto que conecta o telespectador ao contexto da
época e dos fatos narrados. Sucesso também na trilha sonora, que conta com a música
“Be Alive” interpretada pela cantora Beyoncé.
Destaco também a atuação de Will Smith, mesmo que o
personagem me incomode em alguns aspectos. No geral, ele é um pai abusivo que,
mesmo quando não decide colocar pressão em suas filhas, faz de tudo para dar
lições de humildade. Mas não é nem um pouco humilde como pessoa e fica visível
a sua pretensão maior por Vênus do que por Serena.
Fora o fato de que muito tem
de ser feito pela família apenas para satisfazer a vontade e o ego de Richard.
Todas as mulheres da casa são silenciadas ou pouco ouvidas. O personagem age
como um rei. Não acho que um Oscar para Will Smith seja merecido, pois pode
soar como um reforço a esse tipo de comportamento abusivo do pai.
Senti falta de explorar melhor outros fatores externos como a relação de Richard com a esposa Oracene “Brandi” Williams (papel de Aunjanue Ellis, que está excelente), os problemas financeiros, as filhas na escola e o fato de serem negras.
Infelizmente, a questão do racismo em si deixou muito a desejar, apesar de todos os membros da família serem negros e sofrerem muito com isso. Ficou uma abordagem rasa, sem aprofundar, o que causa estranhamento, uma vez que os produtores do filme também são negros.
Vale ressaltar também que outros negros retratados em “King
Richard: Criando Campeãs” são colocados como pessoas ruins e somente a família
de Richard se destaca como sendo de caráter. Um exemplo disso é a cena em que
ele vai ensinar sobre humildade ao exibir o filme "Cinderela", da
Disney, em uma sessão em casa. Curioso é que a personagem é branca. Não havia
para ele nenhum personagem negro na época para ser referência para as filhas?
A arrogância de Richard é tamanha que desconstrói o que
deveria ser um ensinamento, tudo para mostrar que os Williams são um exemplo de
humildade. Até mesmo com os brancos retratados o protagonista desenvolve uma
relação do tipo patrão/empregado. Mesmo assim, são taxados de ruins. Ou seja,
tanto negros como brancos são maus, somente a família de Richard é boa. E o
entorno deles?
Serena Willians também se torna um fator complicado na
narrativa. Durante todo o tempo de tela, vemos o desenvolvimento maior de Vênus
e como, facilmente, ela ganha prestigio com os técnicos e, principalmente, com
seu pai. Serena, em alguns momentos, dá a impressão de que vai ganhar mais
protagonismo, mas acaba sendo ofuscada pelo brilho da irmã.
Apresentar
protagonistas tão fortes e invencíveis, sem um grande desafio, muitas vezes
pode deixar o final bastante previsível. Apesar disso, “King Richard: Criando
Campeãs” consegue apresentar um encerramento diferente do esperado, o que é um
grande acerto, pois surpreende o telespectador e ainda consegue motivá-lo.
Ficha técnica:
Direção: Reinaldo Marcus Green Produção: Warner Bros. / Star Thrower Entertainment / Overbrook Entertainment / Westbrook Inc.
Distribuição: Warner Bros. Pictures
Exibição: nos cinemas
Duração: 2h18
Classificação: 14 anos
País: EUA
Gêneros: drama / biografia
Exibição: nos cinemas
Duração: 2h18
Classificação: 14 anos
País: EUA
Gêneros: drama / biografia