Sophie Charlotte tem atuação magistral da cantora em suas muitas fases e nuances (Fotos: Stella Carvalho/Dramática Filmes)
Mirtes Helena Scalioni
Filmes – e livros – que optam por fazer um recorte na vida de uma figura pública importante correm o risco de deixar alguma frustração em fãs ou admiradores mais exigentes do biografado. Sempre fica uma lacuna, sempre falta.
Esse não parece ser, no entanto, o caso da cinebiografia “Meu Nome é Gal”, cuja direção, inteligentemente, escolheu o período de 1966 a 1971, que conta, exatamente, do nascimento artístico da cantora até seu estouro com o show “Fa-tal, Gal a Todo Vapor” (1971), como símbolo da contracultura e da resistência à ditadura militar da época. O longa entra em cartaz nesta quinta-feira (12) nos cinemas.
Outro acerto do filme, que foi dirigido com visível sensibilidade por Dandara Ferreira e Lô Politi: o longa resiste à tentação de detalhar a vida pessoal da artista. As roteiristas Maira Bühler e Mirna Nogueira se concentraram quase que exclusivamente na metamorfose – nem sempre fácil - da baianinha tímida em um vulcão tropicalista.
Fica claro, desde o início, que a grande protagonista da história é a força transformadora da música. Pode-se dizer que “Meu Nome é Gal” é um filme feminino, não apenas pelo número de mulheres na ficha da produção. E não é sobre Maria da Graça Costa Penna Burgos. É sobre Gal Costa, cuja mãe, Mariah (Chica Carelli) aparece rápida e pontualmente.
Quando chegou ao Solar da Fossa, uma pensão no Botafogo, no Rio de Janeiro, onde já se hospedavam Gil, Caetano, Betânia e Dedé, a baiana Gracinha encontrou amigos e ambiente propício para exercer sua arte. Não foi fácil vencer barreiras, e isso fica claro no filme, também pelas interpretações dos atores e atrizes envolvidos no clã.
Merecem destaque Camila Márdila como Dedé Gadelha, Rodrigo Lelis como Caetano Veloso, Dan Ferreira como Gilberto Gil, George Sauma como Waly Salomão, a própria diretora Dandara Ferreira como Betânia, e Luis Lobianco como o divertido Guilherme Araújo, o primeiro empresário dos baianos.
Os figurinos de Gabriella Marra e a reconstituição perfeita de cenários e paisagens da época são impecáveis. A cena da turma toda na praia do Arpoador, no Rio, no espaço que ficou conhecido como “dunas da Gal”, é deliciosamente irresistível.
A bela trilha ficou a cargo de Otavio de Moraes, também responsável pelo longa "Ângela", dirigido por Hugo Prata, que pode ser conferido no Prime Video. Ganham destaque no filme as canções “Meu Nome é Gal”, composta por Erasmo e Roberto Carlos em 1969, “Baby”, “Divino Maravilhoso”, “Eu Vim da Bahia”, “Alegria, Alegria”, “Coração Vagabundo”, “Mamãe, Coragem”, “Vaca Profana”, “Festa do Interior”, entre outras.
Talvez o único senão de “Meu Nome é Gal” esteja mais para o final do filme, quando o longa praticamente deixa de ser uma cinebiografia para lembrar a cantora com imagens de arquivo.
Sem nenhuma novidade, já que, com a morte recente da baiana (novembro de 2022), fotos, shows e entrevistas disponíveis foram exaustivamente exibidas – o que, de certa forma, reduz o impacto que o roteiro vinha causando. Um quase anticlímax.
Muito se tem falado também da interpretação irrepreensível de Sophie Charlotte como Gal. Com razão. A atriz tem atuação magistral da cantora em suas muitas fases e nuances e ajuda muito o espectador a compreender sua transformação artística em todas as suas dores e delícias.
O filme é, antes de tudo, uma homenagem à Gal Costa, artista de voz privilegiada e inconfundível. O público da nova geração tem uma ótima oportunidade de conhecer a importância da artista para o Brasil. E os que acompanharam sua carreira vão, certamente, se emocionar ao recordar tempos difíceis e ao mesmo tempo profícuos da arte brasileira. Impossível não chorar.
Ficha técnica:
Direção: Dandara Ferreira e Lô Politi Roteiro: Lô Politi, Maíra Bühler e Mirna Nogueira Produção: Paris Entretenimento e Dramática Filmes, em coprodução com Globo Filmes, Telecine e California Filmes Distribuição: Paris Filmes Exibição: nos cinemas Duração: 2 horas Classificação: 12 anos País: Brasil Gênero: biografia
Produção faz um recorte no período da Guerra do Yom, quando Israel foi Kippur atacado por Síria e Egito (Fotos: Diamond Films)
Maristela Bretas
Poderia ser apenas mais uma biografia de uma líder, mas a atuação de Helen Mirren fez toda a diferença em "Golda - A Mulher de Uma Nação", produção sobre a vida da primeira ministra Golda Meir, conhecida como a Dama de Ferro de Israel, em cartaz nos cinemas. O filme se concentra na luta pelo reconhecimento de Israel pelos vizinhos Síria e Egito e na Guerra do Yom Kippur, uma das mais sangrentas da história do país.
O diretor Guy Nattiv utiliza muitas imagens reais da época com a verdadeira Golda Meir e faz um recorte sobre o que foi esta guerra, ocorrida em 1973, numa das datas mais importantes e sagradas para o judaísmo. O filme é quase didático e poderia se tornar desinteressante, não fosse a atuação excepcional da grande atriz no papel da primeira mulher a ocupar o cargo mais alto do governo de Israel.
A maquiagem excepcional que deixou Mirren quase irreconhecível, juntamente com as roupas pesadas, além dos dedos amarelados de nicotina foram pontos muito positivos da caracterização da personagem.
O conflito é apresentado pela ótica de Israel e de seus comandantes, em especial Golda Meir, o verdadeiro foco do longa. Ela é mostrada como uma grande estadista, mas que sofre com as mortes de seus soldados nos campos de batalha, causada por uma decisão tardia. E ela marca cada uma em uma agenda. Mesmo sendo a heroína de Israel, ela vai responder tempos depois ao tribunal.
Um ponto que chama muito atenção é o fato de Golda ser uma fumante descontrolada, o que se reflete na saúde debilitada que ela precisa administrar enquanto governa com mão de ferro seu país e o conflito com os inimigos.
Mas ela não está sozinha, o cigarro foi companheiro de quase toda a equipe da primeira ministra e presente em excesso nos cinzeiros de todas as reuniões, decisivas ou não.
Não espere ver muitas cenas de guerra, isso não acontece. Apesar de mostrar cenas de históricas da época em preto, o filme se restringe às reuniões em gabinetes para decidir sobre os ataques e contra-ataques, as decisões de Golda Meir e seu staff e a fragilidade de sua saúde. Mas Helen Mirren, com seu talento e competência dá o ritmo que o filme precisa para que não se torne um longa-metragem chato.
"Golda - A Mulher de Uma Nação", para quem viveu esta época é uma aula de história, com personagens importantes sendo mostrados, além da primeira ministra. Como Moshe Dayan (Rami Heuberger), um dos grandes generais de Israel, e Henry Kissinger (Liev Schreiber), secretário de Estado, conselheiro de Segurança Nacional dos EUA no governo Nixon (período do filme) e figura decisiva nas negociações entre os países em conflito.
Hellen Mirren (e) e Golda Meir (d) (Fotos: Divulgação)
Destaque também para a francesa Camille Cottin, que interpreta Lou Kaddar, assistente pessoal de Golda Meir. A atriz entrega boa atuação, discreta e na medida, deixando clara sua importância nos momentos mais cruciais da primeira-ministra, especialmente na doença.
Não podemos esquecer que se trata de um filme em que os protagonistas são mostrados como os mocinhos e os países árabes os vilões. Mas o filme não entra na questão política, por exemplo, com a Palestina. Tudo se concentra na disputa de território e como a situação precisa ser resolvida - em combate ou na conversa. Cabe a Golda ser estrategista e também negociadora, quando a situação exige.
A produção segue a linha, com menos brilho, de alguns longas produzidos nos últimos tempos, que enaltecem personagens não tão "bonzinhos" como mostrados no cinema, mas importantes para a história mundial. É o caso de Winston Churchill, em "O Destino de uma Nação" (2018), o Rei George VI, em "O Discurso do Rei" (2010) ou Margareth Thatcher, em "A Dama de Ferro" (2012).
"Golda - A Mulher de Uma Nação" é uma biografia que vale como história, especialmente para as gerações nascidas após os anos 1980 que não acompanharam este importante conflito árabe e não conheceram esta importante mulher que deu sua vida por Israel.
Ficha técnica:
Direção: Guy Nattiv Produção: Maven Pictures e Piccadilly Pictures Distribuição: Diamond Films Exibição: nos cinemas Duração: 1h40 Classificação: 12 anos País: EUA Gêneros: drama, biografia, guerra
Cillian Murphy entrega excelente interpretação do famoso físico criador da arma usada na 2ª Guerra Mundial (Fotos: Universal Pictures)
Maristela Bretas
Christopher Nolan novamente chega aos cinemas trazendo uma obra grandiosa, tanto no uso de recursos visuais quanto na duração. "Oppenheimer", que estreia nesta quinta-feira (20) nos cinemas, é uma "viagem" à mente inquieta e angustiada do gênio chamado de "pai da bomba atômica". O filme conta, em flashbacks, o que ele sofreu por ser brilhante na ciência, mas ingênuo quanto ao ser humano, em especial, aos políticos.
Ambientado durante e após a Segunda Guerra Mundial, "Oppenheimer" conta a vida do físico teórico da Universidade da Califórnia que foi convidado a dirigir o Laboratório de Los Alamos, no Novo México, com a missão de projetar e construir as primeiras bombas atômicas dos EUA.
O Projeto Manhattan, como batizado, reuniu um grupo formado pelo físico e grandes cientistas de várias nacionalidades que desenvolveram a arma nuclear responsável pela destruição das cidades de Hiroshima e Nagasaki, no Japão, em 1945, e a morte de mais de 250 mil pessoas.
Roteirista e diretor, Nolan entrega seu 12º longa de uma filmografia que inclui obras como o excelente "Dunkirk" (2017), "Interestelar" (2014), "Batman - O Cavaleiro das Trevas" (2008) e "Tenet" (2020). Ele não poupa no visual e som, explorando todos os recursos do formato Imax.
São muitas imagens mirabolantes (e põe muitas nisso) das alucinações de Oppenheimer com fusão de átomos, explosões atômicas e de estrelas, raios e fissão nuclear. São pelo menos 30 minutos do início do filme que poderiam ser resumidos em 10.
A trilha sonora, entregue a Ludwig Göransson, também está perfeita, proporcionando o clímax certo para aumentar o impacto sobre o espectador.
Nolan também acerta ao usar cenas coloridas e em preto e branco que reforçam a seriedade dos dois julgamentos do cientista por traição, após ser considerado herói pelos americanos com a criação da bomba que dizimou os inimigos.
Se a parte visual e sonora são destaques, as interpretações não ficam atrás. Nota máxima para Cillian Murphy, como Julius Robert Oppenheimer, e Robert Downey Jr., no papel de Lewis Strauss.
Murphy incorporou o famoso cientista, especialmente na estrutura física - ele fez uma dieta intensa para perder peso. A história mostra o gênio, que era "fora da caixa" da ciência convencional, e o homem, que vagava entre o egoísmo, o sucesso por dirigir importante projeto da bomba, o amor por duas mulheres, a ingenuidade de achar que seria uma estrela respeitada para sempre em sua nação e o arrependimento pelo uso de sua criação como arma de destruição em massa.
Já Downey Jr. está perfeito como o ex-presidente da Comissão de Energia Atômica dos EUA, figura decisiva na implantação do projeto da bomba. O ator confessou em entrevista recente que foi o melhor filme que já participou em sua vida. Com certeza é um dos melhores papéis (talvez o melhor) de sua carreira.
A maquiagem para envelhecimento dos personagens, bem como o figurino de época também são pontos positivos, muito bem trabalhados, juntamente com a escolha dos personagens coadjuvantes. Muitos ficaram cópias fieis de figuras que marcaram esse período da história, como Gary Oldman, interpretando o presidente Harry Truman, e Tom Conti, como Albert Einstein.
A ala feminina não deixou por menos, com Florence Pugh e Emily Blunt dando show em seus determinantes papéis na vida do cientista. A primeira como a amante do físico, Jean Tatlock, membro do Partido Comunista da América. A segunda interpreta Kitty, bióloga alemã e esposa de Oppenheimer que também integrava o mesmo partido.
Outros nomes famosos do cinema deixaram sua marca no longa: Matt Damon, Rami Malek, Kenneth Branagh, Jason Clarke, Casey Affleck, Josh Hartnett, Matthew Modine, a maioria como integrantes do governo e das Forças Armadas que estiveram por trás do projeto Manhattan.
"Oppenheimer" é baseado na biografia "American Prometheus: The Triumph and Tragedy of J. Robert Oppenheimer" ("Oppenheimer: o triunfo e a tragédia do Prometheu americano"), de Kai Bird e Martin Sherwin, publicada em 2006 e vencedora do Prêmio Pulitzer.
Vale a pena conferir, mais uma grande produção de Christopher Nolan e forte candidato na disputa do Oscar 2024 na principal categoria, além de atores principais, coadjuvantes e parte técnica. Uma ótima oportunidade para conhecer a vida do famoso e polêmico cientista.
Ficha técnica:
Direção e roteiro: Christopher Nolan Produção: Universal Pictures, Atlas Entertainment, Syncopy Distribuição: Universal Pictures Duração: 3h01 Classificação: 12 anos País: EUA Gêneros: biografia, histórico, drama
Gabriel LaBelle entrega ótima interpretação do personagem Sam, quando começou a fazer filmes (Fotos: Universal Pictures)
Maristela Bretas
Um gênio, tanto na criatividade para criar uma das maiores sagas de ficção do cinema, quanto na sensibilidade ao abordar dramas que nos fazem chorar. Esse é Steven Spielberg, que agora conta sua história na produção "Os Fabelmans", em cartaz a partir desta quinta-feira (12), nos cinemas.
Em cada detalhe do filme, que além de dirigir ele roteirizou em parceria com Tony Kushner, é possível ver a marca do diretor, sempre preocupado com os detalhes. Seja com a luz da locação, a poeira de uma explosão, o brilho de um tiro durante a filmagem de um western caseiro ou no olhar de uma criança ao assistir seu primeiro filme na tela de cinema.
Essa é a história de "Os Fabelmans", contada com pureza e encantamento, que leva o público a conhecer um pouco mais da vida de Spielberg. Um menino sensível, filho de judeus, que tem boa relação com os pais, irmãs, avós e amigos da família e da escola.
Foi com uma filmadora, muita criatividade e apoio dos pais (especialmente da mãe) que Spielberg começou a encantar as pessoas desde pequeno. Já adolescente quebrou a timidez usando seus projetos cinematográficos para se expressar e colocar para fora seu amor, frustrações, traumas e sonhos. O cinema se tornou sua vida, coração, mãos e olhos.
De forma simples, sem abusar de efeitos visuais, "Os Fabelmans" é um retrato pessoal da infância dele na década de 1950 até a adolescência, quando se entrega totalmente ao amor pela Sétima Arte.
Sam Fabelman (em ótima interpretação de Gabriel LaBelle, que seria Spielberg), é um jovem que descobre um segredo familiar devastador. Isso vai mudar sua forma de encarar o mundo e as pessoas ao seu redor, usando a magia e o poder do cinema.
A preocupação com cenários e personagens é muito grande por parte de toda a equipe. Um dos exemplos é a casa da família Fabelman, uma reprodução perfeita da residência da infância de Spielberg.
Mesmo com o excesso de detalhes, o filme não se torna monótono, especialmente porque os fãs vão reconhecer nas cenas situações que podem ter levado o diretor a criar algumas de suas grandes obras.
Novamente sob a batuta de John Williams, parceiro de Spielberg em grande parte de suas produções para o cinema, a trilha sonora, sem nenhuma novidade, é perfeita e envolvente. Além do roteiro, "Os Fabelmans" também brilha no figurino de época, iluminação e locações.
No elenco do filme estão também Michelle Williams ("Manchester à Beira-Mar" - 2017), que interpreta a mãe de Sam; Paul Dano ("Batman" - 2022), no papel do pai; Seth Rogen ("Jobs" - 2016), como o amigo da família; Julia Butters ("Era Uma Vez... em Hollywood" - 2019), irmã de Sam; Robin Bartlett (avó materna), Jeannie Berlin (avó paterna) e Judd Hirsch (tio Boris).
Sobre a escalação do elenco, Steven Spielberg comenta que quando começou a pensar em quem poderia interpretar sua mãe, “algumas pessoas surgiram na minha cabeça de imediato”.
Steven Spielberg
O olhar sempre atento aos detalhes explica como nasceu a saga "Star Wars", feita com poucos recursos, maquetes e muita imaginação e ser referência até hoje no mundo geek.
Com uma invejável lista de produções de sucesso, Spielberg soube explorar quase todos os gêneros, como a ficção com grandes produções como "E.T. - O Extraterrestre" (1982), "Poltergeist" (1982) e "Contatos Imediatos do Terceiro Grau" (1977).
A aventura e o suspense não ficaram de fora - "Encurralado" (1971), "Tubarão" (1975), a trilogia "Indiana Jones" (de 1981 a 2022) e "Jurassic Park - Parque dos Dinossauros" (1993 e 1987) são bons exemplos da investida do diretor nestas categorias.
Mas um dos temas preferidos, ainda jovem, foi a guerra, por causa do pai que lutou na 2ª Guerra Mundial - "A Lista de Schindler" (1993), "Império do Sol" (1987) e "O Resgate do Soldado Ryan" (1998) comprovam isso.
Elogiado pelos principais sites de críticas internacionais, "Os Fabelmans" já conquistou dois prêmios importantes até o momento - Melhor Filme de Drama e Melhor Diretor, do 80º Globo de Ouro, e Melhor Filme do Ano pelo American Film Institute Awards (AFI) 2022. Sem contar que é um forte candidato ao Oscar 2023.
Uma produção para ser vista, revista e admirada por sua sensibilidade ao mostrar como o diretor capturou com sua câmera a vida e as pessoas ao seu redor. E transformou tudo em magia e arte, mesmo quando as imagens não mostravam o melhor da humanidade.
Ficha técnica:
Direção: Steven Spielberg Roteiro: Steven Spielberg e Tony Kushner Produção e distribuição: Universal Pictures Exibição: nos cinemas Duração: 2h31 Classificação: 14 anos País: EUA Gêneros: drama, biografia
Produção sobre a icônica cantora recebeu uma brilhante interpretação de Naomi Ackie (Fotos: CTMG/Divulgação)
Patrícia Cassese
Nos últimos anos, várias produções cinematográficas têm se debruçado sobre a trajetória de grandes fenômenos da música, como Freddie Mercury (1946-1991), Elton John (1947 -) e Elvis Presley (1935-1977) - a saber: "Bohemian Rhapsody" (2018), "Rocketman" (2019) e "Elvis" (2022).
Outro título recente que se filia a esse veio foi "Judy: Muito Além do Arco-Íris" (2020), embora, no caso, o foco fosse uma persona que desenvolveu carreira bem sucedida tanto na música quanto no cinema: Judy Garland (1922-1969).
Nesta quinta-feira (12), dia em que "I Wanna Dance With Somebody: A História de Whitney Houston" adentra os cinemas de todo o país, é hora de o espectador saber um pouco mais sobre a história da cantora norte-americana Whitney Elizabeth Houston, falecida precocemente em 11 de fevereiro de 2012, aos 48 anos.
Para quem não se lembra, a cantora foi encontrada afogada na banheira de um hotel (Beverly Hilton) em Los Angeles. O laudo pericial apontou que, além de uma cardiopatia, Whitney havia consumido cocaína e outras drogas (algumas legalizadas, que ela utilizava inclusive com prescrição médica).
Tal como nos exemplos de filmes citados anteriormente (evidentemente, há dezenas de outras produções da sétima arte dedicadas a ícones da música, mas estamos fazendo um recorte entre alguns dos mais recentes), Whitney Houston teve uma carreira de sucesso não só em seu país de origem, mas no mundo todo.
Canções de seu repertório, como "I Will Always Love You", seguem sendo bastante executadas nas rádios. Aliás, sobre o hit, "I Wanna Dance" revela um fato que nem todos os fãs da interpretação da diva conhecem: a canção foi escrita e gravada por Dolly Parton, em 1973, tendo não só alcançado o topo da parada country nos meses seguintes como novamente em 1982, quando a cantora e atriz a regravou para o filme "A Melhor Casa Suspeita do Texas".
Sim, detalhes como esse estão entre os bons chamarizes da nova produção de Kasi Lemmons (de "Harriet", filme de 2019), que, cumpre frisar, tem roteiro do neozelandês Anthony McCarten, o mesmo que escreveu o já citado "Bohemian Rhapsody".
Mas o filme está longe de satisfazer apenas os fãs de Houston. O primeiro acerto a ser mencionado é a escolha da protagonista: Naomi Ackie, que, vale dizer, é britânica. Uma pesquisa na trajetória da moça conta que, apesar dos poucos papéis na sétima arte, a atriz tem feito bonito no que tange a indicações. Certamente não será diferente aqui.
Dona de uma beleza estonteante, Naomi consegue transitar pelas várias fases e estados da cantora (do início da carreira ao final, da pureza do início da carreira ao reconhecimento do declínio da extensão vocal, passando pelo espectro das drogas) com brilhantismo.
Embora as interpretações musicais vistas na tela tragam a voz original de Whitney Houston, Naomi é também cantora e caprichou em suas interpretações (depois sobrepostas) para conferir veracidade às cenas.
O restante do elenco não fica aquém, a começar do excepcional Stanley Tucci envergando as vestes do produtor Clive Davis - que, diga-se de passagem, é um dos produtores do filme.
Aqui, um pequeno desvio da análise do filme: aos 62 anos, Tucci sempre foi aquele ator que, mesmo não estando no papel de protagonista, dá farta contribuição ao êxito de produções como "O Diabo Veste Prada" (2006) ou "O Terminal" (2004).
Neste momento, ele mostra claramente sua potência na excelente série de suspense "Inside Man" (Netflix), onde dá vida a um preso no corredor da morte que, por sua inteligência e sagacidade, acaba ajudando na elucidação de outros crimes de difícil solução para a polícia. Anote na sua agenda, vale demais.
Como Clive, Tucci está simplesmente perfeito. E uma curiosidade: ao contrário da mítica figura do produtor e/ou empresário que explora o artista até extrair tudo o que ele tinha a oferecer, para então descartá-lo, Clive se mostra um dos mais devotados parceiros de Whitney Houston.
Ele acolheu e acatou seus desejos, ainda que esses, a início, possam soar como caprichos - como quando ela decide que quer porque quer fazer cinema. É ele também que a alerta quanto à necessidade de uma reabilitação, citando o exemplo de Judy Garland (por isso a menção ao filme no início desta matéria).
Hoje com 90 anos, Clive Davis é aquela espécie de Midas da indústria. Responde como descobridor do Aerosmith e de Janis Joplin, além de ter trabalhado, na Arista, gravadora que fundou, com ícones como Patti Smith, Barry Manilow, Aretha Franklin, Dionne Warwick e Annie Lennox, para citar alguns.
Todos os outros atores do elenco se mostram escolhas corretíssimas, mas vale destacar particularmente a atriz Tamara Tunie, como Cissy Houston, a mãe da cantora, que na primeira cena aparece como uma tutora quase implacável, mas que se revela plena de afetos e orgulho da cria.
E, ainda, Nafessa Williams (como Robyn Crawford, a grande parceira - afetiva e na carreira, como assistente-executiva - da cantora); Ashton Sanders (como Bobby Brown, marido de Whitney) e Clarke Peters (dando vida ao pai da diva, John Houston).
Os dois últimos, os grandes responsáveis pelas maiores dores de cabeça na vida de Whitney Houston - tendo o pai dilapidado uma parte absurda da fortuna da cantora.
Na condução dessa cinebiografia, Kasi Lemmons faz escolhas bem interessantes. Ao falar de "O Guarda-Costas" (1992), filme de Mick Jackson que estourou nos cinemas de todo mundo, o parceiro de tela de Whitney Houston, o astro Kevin Costner, não aparece sendo vivido por nenhum ator: no lugar desse artifício, o espectador vê uma cena do filme.
Idem para a menção à antológica participação da cantora no programa de Oprah Winfrey, em 2009, depois de sete anos sem conceder entrevistas (após a mal sucedida experiência ocorrida em 2002, quando foi entrevistada por Diane Sawyer, da ABC News).
"A melhor entrevista que já fiz na vida", disse posteriormente a icônica apresentadora. “Para mim, Whitney era a voz. A gente poderia escutar Deus por meio dela cantando. O coração era pesado, mas o espírito era agradecido pelo seu dom”.
Outra decisão é não falar sobre a trágica morte da única filha de Whitney Houston. Bobbi Kristina Brown (no filme interpretada por várias atrizes, como Bria Danielle Singleton) faleceu em 26 de julho de 2015, com apenas 22 anos de idade.
Em janeiro daquele ano, ela foi encontrada inconsciente na banheira de sua casa, em Atlanta. Bobbi chegou a ser reanimada, mas sua atividade cerebral já havia sido bastante afetada.
Em junho, diante da irreversibilidade do quadro, ela passou a receber cuidados paliativos, vindo a óbito no mês seguinte. A necropsia apontou como causas da morte uma pneumonia e má irrigação de sangue no cérebro, consequências, na verdade, de ter ficado muito tempo imersa na banheira, desacordada - o que, por sua vez, teria sido provocado pelo uso de drogas. O corpo de Bobbi foi enterrado ao lado do de Whitney.
Whitney Houston (Reprodução)
Em tempo: nos últimos anos de vida, Whitney conseguiu pagar suas dívidas e ainda deixou um valor considerável para a filha. Com a morte dessa, o dinheiro acabou ficando para a mãe e os irmãos da cantora, Michael e Gary.
Hoje aos 89 anos, Cissy - que também se firmou como cantora - é tia materna das intérpretes Dee Dee Warwick e Dionne Warwick. Já a madrinha de Whitney Houston era ninguém menos que Aretha Franklin.
Confira, a seguir, alguns dos marcos da carreira de Whitney, listados pela Wikipedia, a partir de várias fontes:
* Seu álbum de estreia, Whitney Houston, foi o primeiro de uma cantora a vender 25 milhões de unidades, com as vendas dos discos certificadas.
* "Whitney", seu segundo disco, tornou-se o primeiro a estrear no topo dos mais vendidos nos EUA e Reino Unido simultaneamente.
* Única artista com sete singles consecutivos a atingirem a primeira posição nas paradas de sucessos dos EUA, o recorde mantém-se até hoje.
* Whitney foi a primeira artista feminina a ter 3 singles número #1 de um álbum (Whitney Houston - 1985).
* Whitney foi a primeira artista feminina a ter 4 singles número #1 de um álbum (Whitney - 1987).
* "The Star Spangled Banner" foi a única versão do hino nacional norte-americanos a ser certificada platina, vendendo mais de 1 milhão de cópias.
* A maior certificação inicial de qualquer álbum pela RIAA foi para "The Bodyguard", cuja primeira certificação foi para as vendas de mais de seis milhões de cópias.
* "The Bodyguard" foi o segundo álbum mais vendido por uma artista feminina estrangeira no Brasil, mais de 1 milhão de cópias.
* "The BodyGuard" foi o 4º álbum mais vendido de todos os tempos.
* "The Bodyguard" foi a maior trilha-sonora do mundo vendendo mais de trinta e três milhões de exemplares de 1992 a 1999.
* "The Bodyguard" foi a trilha-sonora mais vendida da história, totalizando mais de quarenta e quatro milhões de cópias vendidas em todo o mundo.
* "The Bodyguard" foi a primeira trilha-sonora a vender mais de 1 milhão de cópias em apenas uma semana.
* "The BodyGuard" foi o álbum mais vendido da década de 1990.
* "I Will Always Love You", segundo single mais vendido da década de 1990, com 10 milhões de cópias em todo o mundo.
* "I Will Always Love You" foi a 2° música de maior sucesso da história.
* "I Will Always Love You" foi a música mais executada entre 1992 e 1993.
* "The Bodyguard" foi o primeiro álbum pop a vender um milhão de cópias na Coreia.
* "The BodyGuard" foi o filme que mais fez sucesso tendo uma cantora como protagonista.
* Whitney ganhou um recorde de oito American Music Awards em 1994. Ela está empatada somente com Michael Jackson, que ganhou oito da AMA em 1984.
* Artista feminina com mais American Music Awards ganhos de todos os tempos, num total de vinte e dois.
* Whitney ganhou um recorde cinco World Music Awards na cerimônia em 1994, apenas igualada por Michael Jackson em 1996.
* Whitney foi a única artista com três álbuns a permanecer no topo do Top 200 da Billboard por mais de dez semanas "Whitney Houston" (14 semanas), "Whitney" (11 semanas) e "The Bodyguard" (20 semanas).
* Whitney tem a mais longa estadia no número um da Billboard Top Gospel Albuns Chart, quando "The Preacher's Wife" permaneceu 26 semanas.
* Recorde de 25 Billboard Music Awards vencidos.
* 20 Singles de Ouro e 7 Singles de Platina.
* Álbum Gospel mais vendido da história: "The Precher’s Wife".
* 32 canções no Top 10 da Billboard.
* 19 singles #1 mundialmente.
* Artista Feminina mais premiada da história certificada pelo
Livro Guinness dos Recordes (Guinness World Record) em 2006.
* Artista que mais músicas teve interpretadas no American Idol, com mais de 1.150 das 70.000 audições durante o show da terceira temporada. A canção "I Have Nothing" foi interpretada na final 6 vezes, mais do que qualquer outra.
Ficha técnica:
Direção: Kasi Lemmons Produção: TriStar Pictures / Sony Pictures Distribuição: Sony Pictures Exibição: nos cinemas Duração: 2h26 Classificação: 16 anos País: EUA Gêneros: biografia, musical, drama
Chega aos cinemas nesta quinta-feira (22) o polêmico filme dos diretores Andradina Azevedo e Dida Andrade, "Eike – Tudo ou Nada", que conta vida do empresário e ex-bilionário Eike Batista. Produzido pela Morena Filmes e distribuído pela Paris Filmes, é inspirado no livro homônimo da jornalista Malu Gaspar.
A história começa em 2006, quando o Brasil passava por uma expansão econômica com o pré-sal. O empresário decide criar a petroleira OGX com antigos funcionários da Petrobras, aproveitando o momento de expansão econômica em 2012 que o Brasil estava vivendo. Na história podemos perceber como Eike sempre buscou investir em empresas para aumentar cada vez mais seu lucro.
Sétimo homem mais rico do mundo em 2012, Eike Batista foi do auge ao declínio em poucos anos. Com uma fortuna estimada em US$ 30 bilhões, na época era o maior bilionário brasileiro do mundo e estava no auge com as empresas do grupo EBX (OGX, MMX e OSX). Em 2014, já não integrava mais a lista da Forbes.
A trajetória do então bilionário segue até a sua prisão em 2017, alvo da Operação Eficiência, um desmembramento da Operação Lava Jato, no Rio de Janeiro. Eike foi acusado de fazer parte de um esquema de corrupção do ex-governador Sergio Cabral, preso desde 2016.
Eike Batista (esquerda) interpretado por Nelson Freitas (direita)
Seu jeito ambicioso de buscar ter mais dinheiro para si e seus funcionários se destacam na narrativa. Nelson Freitas está bem à vontade no papel em uma atuação que consegue transitar entre um cara explosivo e confiante no que faz.
Podemos destacar a montagem de Maria Rezende ao apresentar na obra o faturamento do bilionário e como existem "ganhos" e "perdas" ao longo de sua vida por meio de letterings.
O longa explora com bastante força a questão de como Eike se envolveu nos esquemas de corrupção, mesmo dizendo a todo o momento que era uma pessoa honesta e preocupada em dar empregos aos brasileiros. Até o fato de investir em postos de petróleo e nunca conseguir achar nada fez com que a sua própria equipe desacreditasse em suas palavras.
Outro ponto importante é a preocupação do diretor em mostrar como o povo enxerga Eike - um salvador ou um louco? Especialmente por ele começar a se enveredar pelos caminhos da política e se envolver em fortes esquemas de corrupção. Há pessoas que criticam e aquelas que o defendem por suas ações, principalmente por acreditarem que o dinheiro que ele estava gerando para o país vinha de uma fonte segura.
O filme não explora muito a vida pessoal, focando mais no perfil do empresário e em seus investimentos. A incrível participação especial de Carol Castro no papel de Luma de Oliveira, ex-mulher de Eike, merece destaque. No elenco estão também Thelmo Fernandes, Marcelo Valle, Bukassa Kabengele, Juliana Alves e Xando Graça interpretando os funcionários da OGX, além de Jonas Bloch e André Mattos, que vive o ex-governador.
Na adaptação, os ex-colaboradores da Petrobras que saíram da estatal para fundar a OGX ganham nomes fictícios: Laerte, Kopas, Nelson, Zita e Odorico, o Dr. Oil. Vale assistir "Eike: Tudo ou Nada" para conferir os altos e baixos da história do ex-bilionário que foi manchete nas mídias por anos.
Ficha técnica:
Direção e roteiro: Andradina Azevedo e Dida Andrade Produção: Morena Filmes / Star Productions Distribuição: Paris Filmes Exibição: nos cinemas Duração: 1h50 Classificação: 12 anos País: Brasil Gênero: Biografia