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18 novembro 2024

"Todas as Estradas de Terra Têm Gosto de Sal" - imersão poético sensorial nas vivências de uma mulher negra

A personagem Mackenzie é interpretada por quatro atrizes diferentes que vão representá-la em cada fase da vida (Fotos: A24/Divulgação) 


Silvana Monteiro


A chegada de "Todas as Estradas de Terra Têm Gosto de Sal" ("All Dirt Roads Taste of Salt") aos cinemas de Belo Horizonte em 21 de novembro não poderia ser mais oportuna. No mês da Consciência Negra e um dia após o feriado nacional que celebra a luta, resistência e o valor ancestral do povo negro, o filme, dirigido por Raven Jackson, apresenta uma narrativa visual e poética que retrata com profunda sensibilidade a trajetória de uma mulher negra no Mississippi ao longo de décadas. 

Com momentos singelos e intensos, a obra se torna um tributo à força, memória e histórias que moldam a identidade da protagonista. Adotando uma estratégia narrativa de poucos diálogos e focando-se nos sons e nas imagens captadas em 35mm, o filme evoca uma conexão profunda com a natureza e o ambiente rural dos anos sessenta, conferindo um significado diferenciado a cada cena. 


O drama, produzido pela A24 e distribuído pela Pandora Filmes, estreou no Festival de Sundance em 2023 ´é uma homenagem à riqueza das emoções humanas e às experiências que moldam uma personalidade.  

Destaque para a abordagem poética e sensorial, oferecendo uma experiência cinematográfica que foge do convencional. Dirigido com uma sensibilidade rara, o filme convida a uma imersão nas camadas da memória e da identidade negra no sul dos Estados Unidos , através da vivência de sua protagonista.

O longa acompanha a vida de Mackenzie, uma mulher negra no Mississippi, desde a sua infância até a idade adulta, revelando suas alegrias, dores e o impacto do tempo, do espaço e das relações. 

A personagem é interpretada por quatro atrizes diferentes para representá-la em cada fase da vida. São elas Mylee Shannon, Kaylee Nicole Johnson, Charleen McClure e Zainab Jah. 


A narrativa é construída como um mosaico, uma coleção de memórias, que se entrelaçam para formar um retrato da vida da protagonista. Os diálogos, minimalistas e precisos, funcionam como complemento à atmosfera, mais do que como condutores da história.

Cada palavra é cuidadosamente escolhida, carregando uma profundidade que ressoa com a experiência vivida. Esse estilo narrativo privilegia o silêncio como uma linguagem própria da obra, onde os gestos, toques e olhares dizem mais que qualquer discurso.


A fotografia é um dos pontos mais fortes do filme. A câmera capta a textura da terra, da pele, dos cabelos; o timbre aveludado das vozes em conversas íntimas; o brilho do sol filtrado pelas árvores e os tons quentes que dominam a paleta visual, ecoando a estética negra que embeleza seus personagens. 

Cada cena é cuidadosamente composta, quase como uma pintura, refletindo a conexão visceral entre a protagonista e sua terra. A forma como a luz é utilizada para destacar os detalhes dos rostos e das paisagens cria uma intimidade visual que aproxima o espectador da experiência intimista dos acontecimentos.

O design de som é outro destaque especial. A trilha sonora, composta majoritariamente por sons ambientes e mínimas músicas instrumentais, cria uma atmosfera imersiva. O espectador é transportado para cada ação desenvolvida pelos personagens, desde o ato de pescar até o manuseio do solo.

Os sons da natureza - o vento passando pelas folhas, o murmúrio de um riacho distante, os grilos - são integrados para intensificar o senso de pertencimento e nostalgia.


A diretora, que também é poeta e fotógrafa, utiliza sua sensibilidade para construir uma ode à ancestralidade e aos momentos que nos moldam de maneira quase invisível. Nesse sentido, a obra se assemelha a "Dias Perfeitos" (2024), em que o simples se torna extraordinário, e o retrato do cotidiano se revela grandioso e vivaz.

"Todas as Estradas de Terra Têm Gosto de Sal" é uma obra de arte que desafia as convenções narrativas e visuais do cinema tradicional. É uma experiência que exige paciência e contemplação do espectador, recompensando-o com uma profundidade emocional rara. 

Ao capturar a essência negra com tanto respeito e autenticidade, o filme se estabelece como uma raridade. É, sem dúvida, uma obra que merece ser vista e sentida.


Ficha técnica
Direção e roteiro: Raven Jackson
Produção: A24
Distribuição: Pandora Filmes
Exibição: no Centro Cutural Unimed BH-Minas
Duração: 1h18
Classificação: 16 anos
País: EUA
Gêneros: drama, ficção

14 novembro 2024

“Gladiador 2” é tão bom quanto o primeiro e conta com Denzel Washington brilhante

Paul Mescal e Pedro Pascal protagonizam a nova obra do diretor Ridley Scott (Fotos: Paramount Pictures)


Wallace Graciano


Continuações de grandes obras nasceram fadadas ao fracasso. Também pudera, meu caro amigo leitor. Elas são muitas vezes elevadas a uma expectativa que trama alguma conseguiria suprir. Por isso, antes de falar sobre “Gladiador 2” ("Gladiator II"), em cartaz nos cinemas de todo o Brasil, eu o convido para se despir de seus sentimentos em relação à obra icônica de Ridley Scott. Você não vai se decepcionar.

Se outrora Russell Crowe se consagrou no papel de “Maximus Decimus”, um poderoso general romano amado pelo povo e por Marcus Aurelius, agora o protagonista não tem nenhuma alta patente no Império. Seu nome é Hanno (ou Lucius…), interpretado por Paul Mescal, e ele se encontra na África, onde vê seu povo atacado por Roma e ser dominado.


Buscando vingança após ser capturado como prisioneiro de guerra pelo general Acacius (Pedro Pascal), que agia sob as ordens dos gêmeos imperadores Greta (Joseph Quinn) e Caracala (Fred Hechinger), ele cai nas mãos de Macarius (Denzel Washington). Macarius, que outrora era um mercenário, deseja transformar os prisioneiros em gladiadores e usá-los em busca de sua ascensão política. Ao conhecer Hanno, vê nele sua grande oportunidade de fazer um movimento certeiro. 

E é nesse momento que a trama começa a se mostrar forte. Aproveitando a sede de vingança do até ali Hanno, Macarius atiça a ira de seu prisioneiro ao seu favor enquanto começa a explorar o desejo de Greta e Caracalla por novos jogos no Coliseu. 


Paralelamente, Acacius e sua mulher, Lucilla (Connie Nielsen), que fora casada com Maximus, tramam uma operação para tentar derrubar a tirania dos gêmeos imperadores.

Fugindo dos clichês, mas explorando ao máximo a narrativa épica que o período pode trazer, "Gladiador 2" passa a te sugar neste momento. Apesar de ser repleto de batalhas espetaculares e paisagens grandiosas, a continuação se destaca por ter uma trama de fundo envolvente, com a profundidade que te faz prender o ar não somente nas cenas de ação. 


A direção de Ridley Scott é magistral, com cenas de batalha visceralmente realistas e uma fotografia impecável que transporta o espectador para a antiga Roma. Somado a isso, temos a atuação magistral de Denzel Washington, que é, sem dúvida, o melhor personagem de toda a trama. 

Porém, precisamos dizer que a história, embora complexa, peca por não desenvolver suficientemente os personagens secundários e por ter uma duração excessiva. A atuação de Paul Mescal é competente, mas não consegue alcançar a intensidade de Russell Crowe. O personagem mais carismático da obra, dessa forma, vem de Washington. 


Ainda assim, precisamos dizer que a comparação com o primeiro filme é inevitável, mas que Scott acertou ao explorar desta vez temas como poder, honra e vingança de forma mais ampla, englobando elementos políticos e sociais. 

É uma sequência muito boa, que seria uma obra de grande impacto na história, mas existe o primeiro, que, sim, está em um degrau superior. O que não é nenhum demérito. 

Curiosidades

- "Gladiador 2" surge 24 anos após o filme original, também dirigido por Ridley Scott, que arrecadou mais de US$ 460 milhões nas bilheterias e conquistou cinco Oscars.

- Pedro Pascal, das séries "The Last of Us" e "The Mandalorian", atuou ao lado de Denzel Washington, em "O Protetor 2" (2018), e de Connie Nielsen, em "Mulher Maravilha 1984" (2020).


Ficha técnica
Direção: Ridley Scott
Roteiro: David Scarpa
Produção: Paramount Pictures, Red Wagon Entertainment, Scott Free Productions
Distribuição: Paramount Pictures
Exibição: nos cinemas
Duração: 2h30
Classificação: 16 anos
País: EUA
Gêneros: ação, drama, épico

09 novembro 2024

"A Música de John Williams", uma viagem no tempo a lembranças memoráveis do cinema

Documentário conta a trajetória de um dos maiores compositores de trilhas sonoras inesquecíveis de Hollywood (Fotos: Divulgação/Reprodução)


Maristela Bretas


Poderia ser somente mais um documentário como outros produzidos pelos Estúdios Disney. Mas "A Música de John Williams" sacode as lembranças e toca fundo no coração de diversas gerações, especialmente daqueles que acompanharam grandes sucessos do cinema nas últimas cinco décadas. 

Quem não se lembra dos temas principais de "ET - O Extraterrestre" (1982), a abertura e a trilha sonora das sagas "Star Wars"? Bastam os primeiros acordes para que a memória volte forte, o arrepio tome conta de nossos braços e lágrimas desçam por nossas faces. 

Sim, é isso que o compositor e maestro John Williams sempre provocou ao entregar músicas memoráveis que marcaram sucessos do cinema. E muitos destes sucessos podem ser revistos no documentário dirigido por Laurent Bouzereau, sobre a vida e a carreira deste grande artista, hoje com 92 anos e em plena atividade. 


John Williams foi capaz de transformar duas notas musicais em tema de uma ficção científica, como acontece com "Contatos Imediatos do Terceiro Grau" (1977). Ou de um simples som de suspense deixar uma plateia inteira de cabelos em pé à espera do ataque de um certo “Tubarão" (1975). 

Tem também as trilhas para as ousadas expedições de um certo historiador e caçador de relíquias que usava chapéu e chicote (1981 a 2023), e de aventureiros em busca de um "Parque de Dinossauros" (franquia de 1993 a 2022).  

Não sei dizer o que mais me emociona, mas com certeza, ouvir a música orquestrada que abre uma certa franquia que fala de "A long time ago in a galaxy far, far away..." me faz chorar até hoje. Para quem não é fã, esta é a abertura de "Star Wars".


Entre os depoimentos, estão os de amigos inseparáveis, como Steven Spielberg e George Lucas, que viram seus filmes e franquias ganharem prêmios e a paixão dos fãs. Vários outros diretores também falam sobre o trabalho incansável de John Williams, cuja mente e sensibilidade brilhantes tiram música do ar. 

Entre eles estão Ron Howard ("Inferno" - 2016 e "Uma Mente Brilhante" - 2001); J.J. Abrams ("Star Wars : O Despertar da Força" - 2015); Chris Columbus (dos filmes de 2001 e 2002 da saga "Harry Potter", e dos longas "Esqueceram de Mim 1 e 2" - 1990 e 1992); Frank Marshall ("Indiana Jones" - 1981 e 2023) e James Mangold ("Logan" - 2017 e "Ford vs Ferrari" 2019). 

Além de atores, como Ke Huy Quan e Kate Capshaw ("Indiana Jones: Os Caçadores da Arca Perdida" - 1981) e Seth Mac Farlane (dublador do ursinho "Ted 1 e 2" 2012 e 2015), e cantores, como Chris Martin, da banda Coldplay.


Além dos depoimentos e das grandes composições do John Williams, o documentário ainda oferece ao espectador a chance de conhecer um pouco da vida pessoal do maestro. Da convivência com os filhos, até seu tempo servindo como militar na Força Aérea dos EUA e como todas essas experiências influenciaram em sua música. 

São cenas cedidas por familiares e por Spielberg, feitas durante as gravações de seus filmes. Sem contar a coleção de prêmios e indicações ao Grammy, Oscar, Bafta, Emmy e Globo de Ouro. Imperdível, emocionante, inesquecível. Vale a pena conferir o documentário "A Música de John Williams", disponível apenas no Disney+ por assinatura.


Ficha técnica
Direção e produção:
Laurent Bouzereau
Distribuição: Disney Plus
Exibição: Disney Plus
Duração: 1h45
Classificação: livre
País: EUA
Gêneros: drama, musical

06 novembro 2024

"Ainda Estou Aqui" - um filme sobre resiliência, coragem e tempos sombrios

O aguardado longa de Walter Salles entra em cartaz nos cinemas de BH e promete cativar o público
(Fotos: Alile Dara Onawale/Divulgação)


Eduardo Jr.


Estreia nesta quinta-feira (7/11), o longa "Ainda Estou Aqui", novo trabalho do diretor Walter Salles, distribuído pela Sony Pictures. Coincidência ou não, no mesmo dia da morte de Evandro Teixeira, fotojornalista que clicou momentos icônicos do combate à ditadura no Brasil, a equipe do Cinema no Escurinho foi convidada para acompanhar a pré-estreia deste que se configura como mais um resgate memorável desse triste período da história. 

O buzz em torno do filme, após a exibição no Festival de Veneza, tem tudo para se justificar em terras brasileiras. Adaptado do livro homônimo do jornalista Marcelo Rubens Paiva, o longa conta a história de Eunice Paiva, mãe de Marcelo e mulher do ex-deputado Rubens Paiva, que é levado de casa por policiais, nos anos 1970, dando início ao drama.


Aliás, o termo "drama" se aplica mais ao segundo ato da obra, que inicia com a apresentação das personagens e com um suspense, canalizado na presença dos caminhões com militares, que passam pelas ruas e provocam um incômodo na protagonista, em contraste com o cotidiano festivo do casal e seus cinco filhos. 

Walter Salles é inteligente ao mostrar Rubens Paiva (Selton Mello) com uma rotina familiar e depois sua prisão sem motivos claros. Imprime a percepção de que, na ditadura, qualquer coisa era motivo para violar direitos. 

Deixa no espectador o vazio da falta daquele personagem (talvez uma espécie de simulacro da falta que um ente desaparecido deixa nos familiares). É aí que o cotidiano solar e colorido da família começa a se transformar.  

(Foto: Lais Catalano Aranha/Divulgação)

A entrada dos milicos é digna de "O Poderoso Chefão" (1972), com sujeitos mal-intencionados emergindo das sombras. A fotografia faz questão de escurecer a tela. A maldade do regime consegue causar impacto no espectador sem apelar para arroubos cinematográficos ou de emoção. E nem precisa. 

A câmera nos faz enxergar a Eunice criada por Fernanda Torres, uma escolha visual que se mostra acertadíssima! A protagonista começa uma mulher de classe média alta, muda para dona de casa sem privilégios, se reinventa como advogada, e comunica tudo com uma atuação e expressões impecáveis, entregando melancolia e força até nos gestos mais sutis. 

Além de Fernanda, todo o elenco parece ter entendido que menos é mais. O filme traz atuações precisas e bem sintonizadas entre atores que dão vida aos personagens na 1ª fase e os que assumem após a passagem de tempo. 


Ponto positivo também para a excelente trilha sonora, com músicas da época muito condizentes com a mensagem e com o momento (de ontem e o atual, embora o filme seja também sobre memória). 

Uma dessas pautas da atualidade já era parte da biografia de Eunice. Após a tragédia familiar, ela voltou a estudar, se formou em Direito e passou a atuar em prol das causas indígenas (que voltaram aos noticiários, recentemente) e violações dos Direitos Humanos. 

Se assim podemos dizer, uma das vitórias foi a dela própria, ao obter a certidão de óbito do marido. Eunice recebe o documento como sempre fez, sorrindo. Por ordem dela, não era permitido à família Paiva chorar ou sofrer frente às câmeras, pois essa seria uma vitória dos assassinos que destruíram tantas outras famílias brasileiras. 


Eunice morreu em dezembro de 2018, com 86 anos, em decorrência do Mal de Alzheimer. Está representada nessa fase final por Fernanda Montenegro. E com a mesma força expressiva que a filha deu à personagem no início e meio do longa. 

No final deste filme, de tamanho refinamento técnico que mal se percebe o passar das duas horas de exibição, o espectador observa algo que pode ser interpretado como o que essas famílias experimentam: a busca de uma completude que nunca mais existirá. O que fica, é memória. Filme imperdível! 

"Ainda Estou Aqui" é a produção brasileira escolhida para integrar a lista de possíveis indicados ao Oscar de Melhor Filme Internacional em 2025. A prévia dos finalistas sai no dia 17 de dezembro e a lista com os cinco escolhidos será divulgada no dia 17 de janeiro. 


Ficha técnica:
Direção: Walter Salles
Roteiro: Murilo Hauser e Heitor Lorega
Produção: Mact Productions, VideoFilmes, Arte France, RT Features
Distribuição: Sony Pictures
Exibição: nos cinemas
Duração: 2h15
Classificação: 14 anos
País: Brasil
Gêneros: drama, suspense

05 novembro 2024

"Megalópolis", de Coppola - um filme audacioso sobre poder e utopia

Adam Driver e Nathalie Emmanuel protagonizam a mais nova obra do diretor, que aborda temas sociais e políticos (Fotos: Divulgação)


Marcos Tadeu
Texto cedido pelo blog Jornalista de Cinema


Considerado um dos projetos mais audaciosos da história do cinema e do diretor Francis Ford Coppola, está em cartaz nos cinemas "Megalópolis". O filme aborda temas sociais e políticos como só o diretor e também roteirista da produção, um mestre em retratar complexidades humanas, poderia alcançar.

Distribuído pela 02 Play Filmes, o longa é estrelado por Adam Driver, Giancarlo Esposito, Aubrey Plaza, Forest Whitaker, Nathalie Emmanuel, Shia LaBeouf, Jon Voight, Laurence Fishburne, entre outros nomes conhecidos do cinema. 


Na história, conhecemos César Catilina (Driver), um arquiteto visionário que propõe melhorias radicais para sua cidade com a ajuda de uma misteriosa descoberta, chamada Megalon. Contra ele está o prefeito Cícero (Esposito), um líder conservador que busca manter as tradições e frear a modernização. 

O pano de fundo é Nova Roma, uma metrópole que mistura elementos da civilização antiga com aspectos contemporâneos, refletindo a luta entre progresso e tradição. O filme também enfatiza o papel da arte, mostrando o que sem ela uma sociedade perde a alma.

O design de produção, liderado por Beth Mickle e Bradley Rubin, se destaca ao mostrar a divisão socioeconômica da cidade. O contraste entre áreas prósperas e desfavorecidas dá vida à distopia que se desenrola.


Coppola traz questionamentos importantes: como gastamos nosso tempo? E se pudéssemos pará-lo, o que faríamos? A busca por progresso e os dilemas éticos e políticos que o acompanham são discutidos de forma corajosa.  No centro da narrativa, a tensão entre César e Cícero é palpável. 

Adam Driver dá vida a um idealista obstinado por melhorias coletivas, enquanto Giancarlo Esposito representa a política tradicional, que resiste às mudanças. A dinâmica entre os personagens revela a eterna batalha entre inovação e conservadorismo.


Nathalie Emmanuel ganha destaque como Lucia, filha do prefeito. Sua personagem evolui de uma figura aparentemente mimada para uma voz ativa na disputa ideológica, unindo-se a César e confrontando o pai. Forest Whitaker, como Julius, também desempenha um papel intermediário, contribuindo para o debate político central.

Coppola enriquece o filme com simbolismos — como a Justiça cega em movimento — que pontuam suas críticas à sociedade moderna. A obra tem um tom shakespeariano, com temas familiares e ambições que remetem a Hamlet. 


As atuações, embora teatrais e caricatas em alguns momentos, contribuem para essa atmosfera. Até mesmo a franquia "Star Wars" é lembrada. Há uma referência rápida do personagem de Adam Driver, que interpretou Kylo Ren, segurando um objeto como se fosse um sabre de luz.

No entanto, "Megalópolis" peca em profundidade de personagens. A preocupação de Coppola em explorar subtramas políticas e sociais deixa de lado o desenvolvimento dos dramas pessoais. 

Os próprios personagens César e Cícero não interagem com as massas, evidenciando como líderes políticos muitas vezes priorizam ideais sobre o coletivo.


O filme faz uso de citações de figuras históricas como Voltaire e Marco Aurélio, ampliando a reflexão sobre poder e liderança. Ele explora como a sabotagem e a manipulação da verdade são usadas para minar o progresso e como o extremismo pode surgir em meio ao descontentamento popular.

Do próprio bolso  

Francis Ford Coppola financiou pessoalmente parte do projeto, investindo cerca de US$ 140 milhões, saídos da venda de sua famosa vinícola. Foram décadas de reescritas e adiamentos, que começaram em 1977. 

A visão autoral do diretor, rejeitada por estúdios por ser considerada arriscada e pouco comercial, foi levada adiante graças à sua determinação em manter o controle criativo.


Essa ousadia reflete o compromisso de Coppola com sua arte. Ele não buscava agradar ao mercado, mas sim concretizar uma visão artística que transcendesse as convenções cinematográficas.

"Megalópolis" é um exemplo raro de cinema autoral que desafia a lógica comercial da indústria. Comparável a "Duna: Parte Dois" (2023) em sua abordagem política e distópica, Coppola vai além ao explorar temas de maneira crua e direta. 

A escolha de Nova Roma como cenário (numa alusão do que seria Nova York como um novo império) reforça as temáticas de ambição e poder, em uma narrativa que, mesmo com suas falhas, promete ser lembrada por sua audácia e relevância.


Ficha técnica:
Direção e roteiro:
Francis Ford Coppola
Produção: American Zoetrope
Distribuição: O2 Play Filmes
Exibição: nos cinemas
Duração: 2h18
Classificação: 12 anos
País: EUA
Gêneros: drama, ficção

03 novembro 2024

"Todo Tempo Que Temos": um drama sobre o amor e suas imperfeições

Florence Pugh e Andrew Garfield são os protagonistas do longa dirigido por John Crowley
(Fotos: Imagem Filmes)


Filipe Matheus
Texto  cedido pelo colaborador Blog Maravilhas de Cinema


Dirigido por John Crowley ("Brooklyn" - 2016), está em cartaz nos cinemas o tão esperado "Todo Tempo Que Temos" ("We Live In Time"), estrelado por Florence Pugh e Andrew Garfield. Embora tenha a ambição de se tornar um clássico do drama romântico, o filme falha ao não explorar a narrativa do casal protagonista de forma profunda.

O longa tenta contar uma história de amor, mas tropeça em situações previsíveis, decepcionando aqueles que buscam uma paixão envolvente. Almut (Pugh) e Tobias (Garfield) se encontram inesperadamente e de imediato, há uma conexão entre eles. 


Essa conexão os leva a um caminho desafiador, onde aprendem a valorizar momentos únicos em uma trama nada convencional sobre o amor. As diferenças entre os dois revelam que a imperfeição é parte essencial da construção de uma relação. Mesmo assim, é possível erguer um futuro juntos, superando erros e buscando a felicidade.

Apesar da originalidade, falta emoção à obra. Não se trata apenas de contar uma história, mas de mostrar como ela realmente existe na prática. A busca por realização, em alguns momentos, parece vaga, diminuindo a força de "Todo Tempo Que Temos" e impedindo-o de brilhar no gênero dramático.


A inclusão de flashbacks não enriquece a narrativa. Em certos momentos, a confusão com o tempo presente é evidente. É fundamental destacar a dramatização do filme. O espectador antecipa como a trama vai se desenrolar, tornando o enredo menos envolvente e frágil em algumas situações.

Apesar do roteiro pouco criativo e recheado de clichês de Nick Payne, o longa conta com as boas atuações e a química perfeita de Florence Pugh e Andrew Garfield. 

Eles dão sustentação suficiente para entregar o esperado, fazendo com que o público se importe com a construção da história, tanto nos bons quanto nos maus momentos enfrentados pelo casal.


Uma curiosidade sobre os protagonistas: ambos atuaram em produções da Marvel, com Pugh como Yelena Belova, em "Viúva Negra" (2021). Garfield foi o Homem-Aranha/Peter Parker nos dois filmes de "O Espetacular Homem-Aranha" (2012 e 2014) e em "Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa" (2021).

Apesar das falhas, "Todo Tempo que Temos" merece ser conferido nos cinemas. O filme oferece uma genuína história de amor, ressaltando a importância das dificuldades na construção de um relacionamento.


Ficha técnica:
Direção: John Crowley
Produção: Studio Canal e Film4
Distribuição: Imagem Filmes
Exibição: nos cinemas
Duração: 1h44
Classificação: 14 anos
País: EUA
Gêneros: drama, romance, comédia dramática

31 outubro 2024

Longa “Malu” reúne atuações impressionantes e diálogos densos

Filme é inspirado na vida da mãe do diretor Pedro Freire e explora a dinâmica de três gerações de mulheres
da família (Fotos: Primeiro Plano)


Carolina Cassese


O filme "Malu", dirigido por Pedro Freire, chega aos cinemas de Belo Horizonte nesta quinta-feira, 31 de outubro. Após sua estreia na Première Brasil do Festival do Rio, o longa foi premiado em diversas categorias e se destacou em eventos renomados como Sundance e New Directors New Films, do Lincoln Center.

Inspirado na vida da atriz Malu Rocha, mãe de Freire, "Malu" explora a complexa dinâmica de uma família formada por três gerações de mulheres: a protagonista Malu (Yara de Novaes), sua mãe conservadora Lili (Juliana Carneiro da Cunha) e sua filha Joana (Carol Duarte), que também trabalha na área das artes cênicas. 


A história aborda temas como os sacrifícios feitos em nome da arte, o peso das expectativas familiares e a resiliência das mulheres diante de adversidades.

Um dos principais destaques do longa é o elenco, em especial a presença marcante de Yara de Novaes. As interações entre as personagens do filme são fortes e surpreendentemente críveis; é como se estivéssemos assistindo a discussões reais de uma família repleta de problemas. 

Ressaltamos que o conturbado diálogo entre as três gerações não reflete apenas as diferenças de personalidade, mas também divergências entre períodos da história brasileira.


Enquanto a matriarca é bastante conservadora, Malu é uma mulher que resistiu à ditadura militar. No presente da história, que se passa na década de 1990, a protagonista explicita críticas ao conservadorismo e constantemente reforça seu sonho de construir um teatro em casa para a comunidade. Por sua vez, Joana possui atitudes mais ponderadas e busca dialogar com a avó e a mãe.


Também vale destacar o fato de que "Malu" é o primeiro longa de Pedro Freire, que já tinha realizado curtas-metragem e participado de eventos como o Festival de Veneza. Nessa estreia, ele é bastante hábil nas transições entre comédia e drama, já que o filme oscila entre conversas descontraídas e momentos significativamente densos.

O espectador provavelmente irá se manter atento à tela até a última cena, considerando que o ritmo da produção também é digno de nota. Ademais, conseguimos nos familiarizar com as personagens, que são construídas com complexidade, sem os maniqueísmos frequentemente observados em produções comerciais.


Em sua trajetória internacional, "Malu" foi exibido em mais de dez festivais e ainda será apresentado em outros eventos, como o New York Latino Film Festival e o Cairo International Film Festival. 

A produção foi bastante elogiada numa crítica publicada pela revista Variety, que destacou as atuações e a singularidade da história: “Malu é magnificamente interpretado. Um primeiro longa-metragem emocionalmente impactante e pessoal”.


Ficha técnica:
Direção e roteiro: Pedro Freire
Produção: Bubbles Project e TvZero e coprodução RioFilme, Telecine e Canal Brasil
Distribuição: Filmes do Estação e RioFilme
Exibição: Cineart Ponteio e Centro Cultural Unimed-BH Minas 
Duração: 1h40
Classificação: 16 anos
País: Brasil
Gênero: drama

27 setembro 2024

"Ainda Somos os Mesmos" dialoga com a nossa atualidade

Drama baseado em fatos reais da década de 1970 no Chile foi filmado na Cordilheira dos Andes, Santiago, Porto Alegre e Novo Hamburgo (Fotos: Edson Filho)


Eduardo Jr.


Baseado nos relatos de brasileiros que se abrigaram na Embaixada Argentina no Chile após o golpe de estado dos militares chilenos, o longa “Ainda Somos os Mesmos” já está em cartaz nos cinemas. O filme é dirigido por Paulo Nascimento (que já realizou “Teu Mundo Não Cabe nos Meus Olhos”, de 2016) e distribuído pela Paris Filmes. 

Além da temática interessante e das imagens da época na abertura, outro atrativo reside em uma curiosidade sobre o longa: o filme é inspirado em outra obra do mesmo diretor (“Em Teu Nome”, de 2010). 

Um dos relatos que auxiliaram na construção do longa veio de João Carlos Bona Garcia, gaúcho e ex-guerrilheiro da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR) que ficou 42 dias abrigado na embaixada da Argentina em 1973 e sobreviveu. 


A história do revolucionário fez parte de “Em Teu Nome”, e Bona também participou das leituras do roteiro de “Ainda Somos os Mesmos”. Mas faleceu aos 74 anos, em março de 2021, vítima de Covid, poucos dias antes de poder se vacinar. 

No longa "Em Teu Nome", um estudante de engenharia entra para a luta armada, e teme por sua namorada e por sua família. Em “Ainda Somos os Mesmos”, o estudante de medicina Gabriel (Lucas Zaffari) vai para o Chile para fugir da ditadura no Brasil, mas é surpreendido pelo golpe de estado de Augusto Pinochet e se perde da namorada. 

Ao se abrigar na embaixada da Argentina, ele conhece Clara (Carol Castro) e também reencontra outros brasileiros, o que movimenta a trama em determinados momentos. 


O filme dialoga com a nossa atualidade. Fernando (personagem de Edson Celulari) é o pai de Gabriel, e vive um empresário apoiador do militarismo. Mas se arrepende quando fica diante do risco de perder o filho ao ouvir que aquilo é necessário, que os atos são feitos em nome de Deus. 

Cabe a ele a missão de tentar resgatar Gabriel e os outros brasileiros no Chile, que na época era considerado um dos países mais perigosos do mundo por conta da ditadura de Pinochet. A presença de crianças e gestantes naquele contexto de violência escancara a falta de escrúpulos dos regimes militares. 


Embora filmado na Cordilheira dos Andes e também em Santiago, Porto Alegre e Novo Hamburgo, que propiciam uma boa fotografia, o longa ganha ares de novela com as músicas guiando cenas e emoções. Além de algumas atuações que se mostram em outra frequência em relação ao restante do elenco. 

Outro ponto a se observar é que, em alguns momentos, o texto parece usar expressões modernas demais para os anos 1970. Ainda assim, a tensão marca presença e mantém o interesse do espectador no filme. 


O longa também chamou a atenção de julgadores. Ganhou o prêmio de Melhor Filme Independente no Montreal Independent Film Festival 2023, se tornando mais um na lista de premiados da Paris Filmes. A distribuidora tem em seu catálogo, entre outros títulos, “O Lado Bom da Vida” (2012), que rendeu um Globo de Ouro e um Oscar de Melhor Atriz para Jennifer Lawrence. 

E “Meia Noite em Paris” (2011), que ostenta o título de maior bilheteria de um filme de Woody Allen no Brasil. Além das franquias “John Wick” (de 2014 a 2023) e "Jogos Vorazes" (2012 a 2023), e de sucessos como “Minha Irmã e Eu” (2024) e "La La Land - Cantando Estações" (2017).


Ficha Técnica:
Direção, roteiro e produção: Paulo Nascimento
Produção: Accorde Filmes
Distribuição: Paris Filmes
Exibição: nos cinemas das redes Cineart Del Rey e Cinemark Diamond Mall e Pátio Savassi
Duração: 1h30
Classificação: 14 anos
Países: Brasil e Chile
Gêneros: drama, história, suspense

23 setembro 2024

Perturbador, “A Substância” escancara os horrores da sociedade patriarcal

Demi Moore entrega cenas extremamente fortes e angustiantes, em uma de suas melhores atuações
(Fotos: Universal Pictures)


Carolina Cassese


A partir de determinada idade, mulheres são descartadas. É exatamente isso que acontece com a protagonista do filme “A Substância" ("The Substance"), novo longa da diretora francesa Coralie Fargeat. A história é centrada em Elisabeth Sparkle (Demi Moore), uma atriz de Hollywood que passa a trabalhar como apresentadora de televisão. 

Logo no começo do body horror, a protagonista descobre que será substituída na emissora, que agora busca uma mulher de 18 a 30 anos para apresentar a atração fitness comandada por Sparkle. Em uma das primeiras cenas do filme, a personagem principal incentiva as espectadoras a conseguir “um corpo de verão”.


Quando vê seu emprego ser ameaçado, Elisabeth decide buscar um programa de “aprimoramento” corporal, conhecido como “A Substância”. O tratamento oferece a possibilidade de você se tornar “uma melhor versão de si mesmo”. A partir de uma injeção autoadministrada, qualquer um pode se tornar uma alternativa mais jovem, bonita e perfeita de si próprio.

A personagem principal, então, recebe diversos equipamentos médicos em sacos plásticos (seringas, tubos, um líquido verde fosforescente e um alimento injetável branco) e é informada sobre o protocolo referente ao seu “novo eu”. 

Ao longo das semanas, porém, a nova versão de Elisabeth – uma garota chamada Sue, interpretada por Margareth Qualley – acaba se mostrando mais problemática do que a personagem principal poderia imaginar. 


Mesclando elementos de ficção científica com outros componentes frequentemente vistos em filmes de horror, o longa acompanha a nova vida da protagonista, que agora se divide em duas. 

Sue leva uma rotina de celebridade, apresentando o programa fitness e sendo filmada a partir de muitos ângulos objetificadores. Enquanto Elisabeth vive cada vez mais isolada, sem conseguir compreender qual é o propósito de sua versão fora dos holofotes.

Em determinado momento, vemos que Elisabeth começa a se comparar com Sue de uma maneira pouco saudável, o que a impede de sair para jantar com um pretendente. Ao observar as imagens do corpo “perfeito” de sua outra versão, a protagonista passa horas se maquiando e, em seguida, fica paralisada, sem conseguir sair de casa. 

É triste (e aterrorizante) perceber que aquela mulher se sente inferior a todos, até mesmo ao homem com quem ia jantar, que não parece ter sérias preocupações com a própria estética. Essa é uma das cenas mais violentas do longa, mesmo que não mostre sequer uma gota de sangue. 


Vale destacar que a discussão apresentada pelo filme é imprescindível para os dias atuais. Em primeiro lugar, porque vivemos numa sociedade repleta de imagens, em que nos deparamos constantemente com ideais de estética inalcançáveis. 

As estrelas de cinema agora dividem a atenção (e a tela) com influencers, especializados em exibir diferentes ângulos de uma vida instagramável. Em “A Substância”, a protagonista está disposta a sentir muita dor para que, por uma versão de si mesma, continue a ser jovem e apareça nas telas.

Além disso – e aqui vai uma perspectiva menos pessimista sobre o momento em que nos encontramos–, o filme dialoga com discussões contemporâneas sobre etarismo e outros tipos de preconceitos que inevitavelmente são associados com o sistema patriarcal. 

Debatemos cada vez mais acerca das imposições machistas dirigidas às mulheres e, nesse sentido, “A Substância” aborda um assunto muito atual (mesmo que não seja novo).


Podemos lembrar aqui de uma frase da atriz e ativista Jameela Jamil, que em 2018 publicou um texto sobre preconceito estético no site da Glamour: “E quantas mulheres você conhece, incluindo você mesma, que gastam mais tempo e dinheiro do que os homens com aparências? 

Esse é um dinheiro que poderia ter sido investido em nossas vidas ou negócios. E o que dizer das mulheres que comem menos calorias ou dietas balanceadas do que seus corpos precisam?”. 

Em “A Substância”, percebemos como as mulheres são frequentemente reduzidas a números e tamanhos. Até mesmo ao ligar para o programa de aprimoramento corporal, Elisabeth só é reconhecida quando fala um número que a identifica como participante do programa.


O filme evidencia ainda como a mídia contribui para a reificação das mulheres, mesmo em atrações que aparentemente valorizam o “feminino”, exibindo apenas uma série de corpos magros e padronizados. Quantas vezes já vimos vídeos extremamente objetificadores que chegam a usar uma linguagem de “empoderamento”? 

Essa crítica fica ainda mais explícita quando consideramos o nome do filme em inglês, já que “substance” também significa “conteúdo”. Em determinadas atrações midiáticas, pouco se discute sobre o que as mulheres pensam – elas estão ali primordialmente para enfeitar. 

Percebemos, então, que não é pequena a importância do tema que Coralie Fargeat se propõe a abordar. Nas primeiras partes da história, a crítica é especialmente bem construída e o horror se encontra em diferentes elementos da trama. 


Destacamos aqui o excelente trabalho de Demi Moore, responsável por cenas extremamente fortes e angustiantes. Além disso, é preciso elogiar o ritmo da história, que mescla diferentes gêneros e, definitivamente, prende a atenção do espectador.  

É o terceiro ato do longa que representa o momento mais contraditório de “A Substância”, já que parte do público pode achar que as cenas são demasiadamente violentas. O tom perturbador, porém, não chega a destoar das demais partes: pode-se compreender que o exagero é proposital e ajuda a reforçar a violência do processo vivido pela protagonista. 

É certamente um dos horrores da condição feminina se sentir exposta a uma constante plateia de homens brancos, dispostos a “avaliar” e comparar mulheres. 


Na última parte, Elisabeth está cada vez mais desamparada, enquanto Sue se obriga a estampar um sorriso (porque “meninas bonitas devem sempre sorrir”) e segue com a busca incessante de se tornar muito famosa. Nós sabemos, no entanto, que muito não é o suficiente: em Hollywood, ou no mundo do Instagram. 

Os padrões costumam se ajustar para que seja constantemente necessário realizar mais um tratamento como o da “Substância”. As injeções nunca acabam – e há sempre uma nova maneira de encontrar “a sua melhor versão”.


Ficha técnica:
Direção e roteiro: Coralie Fargeat
Produção: Universal Pictures, Working Title Films
Distribuição: Imagem Filmes e MUBI
Exibição: nos cinemas
Duração: 2h20
Classificação: 18 anos
País: EUA
Gêneros: terror, drama, ficção