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25 junho 2020

Sem consistência, 2ª temporada de "Coisa Mais Linda" decepciona

Pathy Dejesus, Maria Casadevall, Mel Lisboa e Fernanda Vasconcellos protagonistas da série dramática (Fotos: Netflix/Divulgação)

Mirtes Helena Scalioni


Uma série que tem como protagonistas quatro mulheres bonitas e como pano de fundo a luta delas por liberdade e independência parece já nascer predestinada ao êxito. E se o cenário for o Rio de Janeiro dos anos de 1960 e a trama for embalada pelos acordes de uma incipiente Bossa Nova, pode-se dizer que o sucesso é garantido. 

Com figurino impecável e uma trama envolvente, "Coisa Mais Linda" encantou o público em sua primeira temporada em 2019 na Netflix. Puro charme. E o público vai descobrindo, aos poucos, que aquela época, quando a mulherada era submissa e muitas vezes submetida aos pais e maridos, não tinha nada de Anos Dourados.



Só para relembrar: Maria Luiza (Maria Casadevall) - Malu, para os íntimos - se muda de São Paulo para o Rio para se encontrar com o marido e lá descobre que Pedro (Kiko Bertholini) fugiu com o dinheiro do casal. Sozinha e quebrada, ela decide lutar pelo seu sonho de criar um clube de música, projeto que acaba aproximando-a de Adélia (Pathy Dejesus), Thereza (Mel Lisboa) e Lígia (Fernanda Vasconcellos). 



Enquanto Adélia é uma ex-empregada doméstica negra e moradora de favela, Thereza e Lígia fazem parte de uma elite carioca tradicional e hipócrita. Cada uma com suas dores e frustrações, as quatro formam um forte laço de amizade e solidariedade. A duras penas, o "Coisa Mais Linda" é inaugurado e segue de vento em popa, com música ao vivo, animação e - como convinha à época - muito cigarro, muita fumaça.

Paralelamente, a ala masculina da história se comporta, em sua maioria, como mandava o figurino daqueles tempos: maridos e namorados autoritários, ciumentos e até violentos, e uns poucos compreensivos, modernos. Também não chama muita atenção essa parte do elenco, composto por atores pouco conhecidos, muitos deles com atuações sofríveis. 


Leandro Lima como o músico Chico, o, digamos, galã da história, embora toque um violão impecável como convém a um bossanovista, mostra-se inexperiente e inexpressivo quando atua, assim como Alexandre Cioletti como Nelson ou Kiko Bertholini como Pedro, e Gustavo Vaz como Augusto. No time dos rapazes, quem brilha é o experiente Ícaro Silva, como o baterista Capitão e, de certa forma, Gustavo Machado como o produtor musical Roberto.

Mas o que prevalece é mesmo o protagonismo das personagens femininas, enriquecidas por um figurino perfeito, cinturinhas finas e marcadas, sapatos de saltos bem altos, saias justas. E não são só os vestidos. As quatro atrizes da primeira temporada - às quais se junta Larissa Nunes como a cantora Ivone na segunda - dão show. Destaque para Mel Lisboa, que se entrega de corpo e alma à extrovertida e atrevida Thereza, a mais moderna e libertária do grupo. 


Já da ambientação não se pode dizer o mesmo. O Rio, bonito como sempre, parece genuíno quando as cenas acontecem nas praias, mas muito falso quando as tomadas são na favela, onde moram Adélia, o Capitão e um jogador de futebol, Miltinho (Breno Ferreira), que surgiu na segunda temporada. O morro, na visão de quem concebeu os cenários e locações, é claro, limpo, aberto e colorido, quase de papelão. Parece fantasia.  

Quem viu a primeira temporada se lembra de que ela terminou com um suspense: no réveillon de 1969 para 1970, todo mundo na praia de Copacabana e a alegria das mulheres é interrompida por tiros saídos da arma de Augusto, marido de Lígia. Quem morreu? O mistério só foi desvendado agora, com a exibição da segunda fase que, diferentemente da anterior, parece ter vindo com outro propósito. 


A causa feminista permanece, a luta por liberdade continua, assim como o discurso e as mensagens contra o preconceito racial. Mas a série ficou um tanto inverossímil, quase infantil. O foco agora está predominantemente na personagem de Malu, seus amores, dúvidas e armações. 

Comportamentos incoerentes dos personagens, diálogos e situações improváveis e até vocabulário impróprio para a época (ninguém falava "transar" naquele tempo) são frequentes na segunda temporada. Isso acaba por enfraquecer e desvirtuar a ideia inicial da série. Fica faltando um choque de realidade. Quem, em sã consciência, aceita que um jogador de futebol famoso, que faz muitos gols no Maracanã, continue vivendo na favela, mesmo que no início dos Anos 60? 


Outro absurdo difícil de engolir são as cenas no tribunal no julgamento de Augusto. Todo mundo dando palpite, brigando, sem nenhum respeito à cerimônia e rituais que a ocasião pede. Enfim, muito fracos e inconsistentes os capítulos. Mas quem tiver paciência de ver, mesmo que de forma crítica, pode acabar embarcando numa terceira temporada quando ela vier. 

Espertamente, os criadores de "Coisa Mais Linda", Giuliano Cedroni e Heather Roth, repetiram o truque do final da primeira fase e terminaram a segunda, de novo, com um suspense: um dos personagens cai na piscina do Copacabana Palace durante uma festa em que todos os personagens estão presentes. 

Pelos atritos prévia e cuidadosamente armados, fica a pergunta: quem matou? A ideia não é exatamente original. Mas pode prender o espectador.   


Ficha técnica:
Criação: Heather Roth e Giuliano Cedroni
Exibição: Netflix
Duração: Média de 45 minutos por episódio
Classificação: 16 anos
Gêneros: drama / romance

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