03 abril 2024

"Licença para Enlouquecer": nem uma pandemia atrapalha essa amizade

Trio descobre que é possível viver intensamente, adaptando a vida às novas regras (Fotos: Bruno Carvalho)


Filipe Matheus
Comentando Sucessos


Um filme interessante e perspicaz na abordagem de temas como a importância das mulheres, relacionamentos e a pandemia que parou o mundo a partir de março de 2020. Este é "Licença para Enlouquecer", longa que chega aos cinemas nesta quinta-feira (4), trazendo uma narrativa que soa com intensidade no espectador. 

O diretor Hsu Chien é conhecido por seus trabalhos em filmes como "Um Dia Cinco Estrelas" (2023), "Desapega!" (2023) e "Quem Vai Ficar com Mário" (2021).


Na trama, Sara (Mônica Carvalho), Lia (Danielle Winits) e Leia (Michelle Muniz) precisam se adaptar a um novo estilo de vida com a chegada da Covid-19, com reuniões por Zoom, encontros virtuais e distanciamento social da quarentena. 

Além das exigências do condomínio, o síndico Carlos (Nelson Freitas) tem uma relação conturbada com as meninas. Com o tempo, ele acaba se envolvendo nas loucuras do trio, embarcando para uma grande aventura na praia de Maragogi, em Alagoas.


Destaque para a interpretação de Michelle Muniz, cuja personagem evidencia a força da mulher e aborda a importância do amor próprio nos dias atuais, demonstrando que os rótulos impostos pela sociedade e os relacionamentos tóxicos não determinam o valor e a relevância da mulher em nossa sociedade.

Além das três protagonistas e Nelson Freitas, o elenco é formado por atores conhecidos de novelas e do cinema, como Luiza Tomé, André Mattos, Henri Castelli, Jennifer Setti, Thaíssa Carvalho, Brendha Haddad e Bruno Moreira.


Um ponto negativo é a viagem das amigas em tempos de pandemia, algo que não seria possível na realidade. Isso confunde o enredo do filme, que, apesar de destacar a história das amigas, carece de uma narrativa mais desenvolvida. Esta comédia brasileira poderia ganhar mais força e autenticidade ao abordar esses importantes temas de forma aprofundada.

No longa, a cultura local também é explorada, com destaque para a música, danças e a deslumbrante paisagem do litoral de Alagoas que desperta o desejo de conhecer e vivenciar essa experiência.


A dinâmica entre os personagens também funciona bem. Cada um possui sua própria história para contar, refletindo a realidade de muitas pessoas que buscam autoaceitação, realização profissional, relacionamentos sólidos com familiares e amigos. E, acima de tudo, entendem a importância de viver a vida com intensidade, pois ela é única.

Para quem quer uma produção divertida, "Licença para Enlouquecer" é imperdível ao mostrar a importância da amizade e como é possível adaptar a vida às novas regras e hábitos quando necessário.


Ficha técnica
Direção: Hsu Chien
Roteiro: Mônica Carvalho, Michele Muniz e Marcelo Corrêa
Produção: Yva Filmes
Distribuição: Pipa Pictures e codistribuição da Imagem Filmes
Exibição: nos cinemas
Duração: 1h40
País: Brasil
Gêneros: comédia nacional

02 abril 2024

"Dias Perfeitos": uma celebração longa, lenta e bela dos pequenos prazeres

Com belíssima interpretação, Kōji Yakusho faz o papel de um homem de hábitos simples, que encontra beleza nas pequenas coisas (Fotos: O2 Filmes)


Silvana Monteiro


"Dias Perfeitos" é mais do que um filme, é uma experiência de imersão na ritualística e meticulosa rotina de Hirayama interpretado por Kōji Yakusho, um zelador de banheiros públicos em Tóquio. E é esta obra que o espectador pode conferir no Una Cine Belas Artes, no Centro Cultural Unimed-BH Minas e, a partir do dia 12 de abril, no canal de streaming Mubi. 

Dirigido por Wim Wenders, o filme se destaca por sua abordagem poética e contemplativa, combinando elementos visuais e narrativos de forma única.  

O longa, com mais de duas horas, fez sua estreia em maio de 2023 no Festival de Cinema de Cannes, onde conquistou o prêmio de Melhor Ator e foi agraciado com o prêmio do Júri Ecumênico, reconhecendo suas "qualidades artísticas e humanas". 

Em novembro do mesmo ano, o filme também recebeu o prêmio Asia Pacific Screen de Melhor Filme e concorreu também ao Oscar de Melhor Filme Internacional pelo Japão.


Embora seja uma obra ficcional, "Dias Perfeitos" se assemelha a um documentário em sua abordagem narrativa e fotográfica. Hirayama é um homem de hábitos simples, que encontra beleza nas pequenas coisas, como a música que ecoa nas fitas cassetes de seu carro, os livros que lê, as mudas de plantas enclausuradas em seu pequenino lar e as árvores que fotografa com sua câmera analógica. 

A obra fascina ao destacar a evolução tecnológica dos banheiros, contrastando com a estagnação pessoal do protagonista, que permanece imerso no período analógico, enquanto se entrega ao consumo de junk food. 


A trama torna-se perfil e diário ao acompanhar Hirayama, magistralmente, em sua rotina aparentemente ordinária. No entanto, sua tranquilidade é abalada por uma série de encontros surpreendentes que revelam gradualmente seu misterioso passado. 

A escolha de Yakusho para o papel principal foi acertada, sua atuação que transmite com maestria a complexidade interior do personagem, tornando-o cativante e intrigante. O elenco de apoio também merece destaque, especialmente Tokio Emoto como Takashi, que desempenha um papel crucial na transformação do protagonista.


A produção do filme é digna de nota, especialmente por sua origem inusitada. Wenders foi convidado a Tóquio para observar o Tokyo Toilet Project, um projeto de redesign de banheiros públicos. 

Essa experiência inspirou o conceito do filme, que se baseia na ideia da singularidade e da beleza escondida nas coisas simples da vida, colocados em prática, em boa parte da obra, com poucos diálogos. 

A trilha sonora de "Dias Perfeitos" apresenta uma seleção musical marcante, feita a partir da experiência do protagonista, normalmente em seu trajeto entre a casa e o trabalho. Nas faixas estão artistas renomados como The Kinks, The Rolling Stones, Van Morrison, Patti Smith e Lou Reed.


A fotografia de "Dias Perfeitos" é um dos pontos altos da obra, capturando a atmosfera única de Tóquio e destacando a beleza da cidade de uma forma pouco convencional. Em meio a jardins e arranha-céus, entre choros de bebês e a loucura dos adultos, entre o mínimo e o máximo, cada cena é meticulosamente composta, refletindo a precisão e a atenção aos detalhes que caracterizam a vida de Hirayama. 

Nesse contexto, o filme cativa o espectador ao retratar uma rotina que poderia ser totalmente surtada, mas que por meio de eventos sutis e cheios de vida, desperta reflexões profundas. No entanto, o ritmo do filme pode ser um desafio para algumas pessoas. 

Wenders opta por uma abordagem contemplativa, deixando espaço para que as cenas e os diálogos se desenvolvam lentamente. Para aqueles que apreciam um ritmo mais acelerado, isso pode parecer cansativo. 


Mas para quem se permite mergulhar na atmosfera do filme, é uma experiência gratificante. Talvez, seja exatamente a falta de mudanças que faz o público se manter atento, na ânsia de ver algo que fuja da rotina. 

Em suma, "Dias Perfeitos" é um filme que não foi feito para entreter tão facilmente, mas que recompensa a paciência e a atenção do espectador em busca de reflexões. 

É uma obra que celebra a beleza dos pequenos prazeres, sobretudo para quem não tem como fugir da Carteira de Trabalho. Nos lembra que, por trás da rotina aparentemente monótona, sempre há surpresas e histórias fascinantes esperando para serem descobertas.


Ficha técnica:
Direção e roteiro: Wim Wenders
Produção: O2 Filmes
Distribuição: O2 Play e Mubi
Exibição: Una Cine Belas Artes - salas 1 (14 horas) e 2 (17 horas); Centro Cultural Unimed-BH Minas - salas 1 (16 horas) e 2 (10h40). A partir do dia 12 de abril no canal de streaming Mubi
Duração: 2h03
Classificação: 12 anos
País: Japão
Gênero: drama