03 setembro 2024

Nova versão de “O Corvo” é mediana, com personagens fracos, e tem tudo para ser esquecida

Filme dirigido por Rupert Sanders tem Bill Skarsgård que retorna dos mortos para vingar a morte de sua amada (Fotos: Imagem Filmes)


Marcos Tadeu
Blog Jornalista de Cinema


O aguardado "O Corvo" ("The Crow"), dirigido por Rupert Sanders e estrelado Bill Skarsgård e FKA Twigs, já chegou aos cinemas brasileiros carregado com a sensação de que talvez essa nova versão não fosse necessária. Especialmente se consideramos o marketing tímido que acompanhou a produção. 

Diferente do que muitos podem imaginar, o filme não é um remake do clássico de 1994, mas sim uma adaptação inspirada no famoso poema "The Raven", escrito por Edgar Allan Poe em 1845.


A história segue Eric Draven (Skarsgård) e Shelly Webster (Twigs), um casal apaixonado que é brutalmente assassinado. Eric, em um ato sobrenatural, retorna dos mortos com o objetivo singular de vingar a morte da amada e a sua própria. O filme, no entanto, começa tropeçando na falta de química entre os protagonistas. 

O romance entre Eric e Shelly é apresentado de maneira apressada e superficial, dificultando que o público se envolva emocionalmente com a relação dos dois. A escolha da cantora e compositora FKA Twigs para o papel da protagonista parece mais uma tentativa de atrair os fãs do que uma decisão acertada para o desenvolvimento da personagem.


O vilão, por sua vez, é outro ponto fraco. Com uma presença apagada e mal desenvolvida, ele não consegue impor a ameaça necessária para que a trama ganhe força. Seu principal poder, o "cochicho de Satanás", até gera alguma curiosidade, mas falta-lhe a motivação para realmente se destacar como antagonista.

Visualmente, o filme tenta emular uma estética gótica e sombria, com cenas de ação que parecem inspiradas na franquia "John Wick". Infelizmente, o resultado raramente atinge o impacto desejado. Uma exceção é a cena ambientada na ópera, onde a montagem, a trilha sonora e a ação se unem de maneira eficaz, criando um momento que se destaca em meio à mediocridade do restante do filme. 


No entanto, o corvo, que deveria ser a peça central e simbólica da narrativa, acaba se tornando um figurante de luxo, sem o peso que se esperava.

A jornada de vingança de Eric é confusa e mal explorada, deixando o espectador desorientado em vários momentos. A tentativa de criar uma atmosfera sobrenatural se perde em meio à falta de clareza e coesão narrativa, tornando difícil para o espectador acompanhar a trajetória do protagonista.

Apesar de seus muitos defeitos, o filme consegue apresentar alguns pontos positivos, como a estética dark e a tentativa de dialogar com um público jovem. Algo que Rupert Sanders já havia explorado em "Branca de Neve e o Caçador" (2012) e "A Vigilante do Amanhã" (2017).


A temática do luto e da perda, bem como a busca por justiça por meio da vingança, são elementos interessantes, mas não explorados de maneira profunda o suficiente para causar um impacto real. A ideia de como a vingança pode moldar o caráter do ser humano é levantada, porém mal desenvolvida.

Esta versão de "O Corvo", de 2024, será dificilmente lembrada, caindo na mesma categoria de filmes como "Demolidor: O Homem Sem Medo" (2003) e "Elektra" (2005) – obras que, apesar de não serem desastrosas, carecem de conteúdo e rapidamente desaparecem da memória do público. 

É uma tentativa frustrada de reinventar uma história clássica, resultando em um filme com uma narrativa fraca e personagens sem brilho.


Ficha técnica:
Direção: Rupert Sanders
Produção: Edward R. Pressman Film Corporation, Davis Films, Relativity Media, Electric Shadow Productions
Distribuição: Imagem Filmes
Exibição: nos cinemas
Duração: 1h51
Classificação: 18 anos
País: EUA
Gêneros: ação, policial, suspense

01 setembro 2024

"Pisque Duas Vezes": um thriller psicológico sobre dominação e sororidade

Channing Tatum interpreta o bilionário da tecnologia Slater King que promove festas estranhas em sua ilha (Fotos: Warner Bros. Pictures)


Marcos Tadeu
Blog Jornalista de Cinema


Para quem curte um terror psicológico, uma boa indicação em cartaz nos cinemas é "Pisque Duas Vezes" ("Blink Twice"), filme dirigido e roteirizado por Zoë Kravitz, que explora a dominação de gênero, especialmente no mundo das celebridades.

A trama segue Frida (Naomi Ackie, de "I Wanna Dance With Somebody: A História de Whitney Houston" - 2023), uma garçonete que aceita um convite do bilionário da tecnologia Slater King (Channing Tatum, de "Como Vender a Lua" - 2024) para passar férias em sua paradisíaca ilha particular. 


O que parecia uma escapada dos sonhos, com noites selvagens se misturando a dias ensolarados e todos se divertindo muito,. vira um pesadelo quando Jess (Alia Shawkat), amiga de Frida desaparece. Ela começa a duvidar da realidade e luta para descobrir o que está acontecendo se quiser sair viva de lá.

O roteiro de Kravitz é preciso e impactante. No início, Frida absorve informações sobre Slater King e sua empresa de celulares, refletindo uma obsessão pela figura dele. A direção usa ângulos fechados para transmitir a sensação de clausura. A ilha, com sua beleza e luxo, oferece um contraste, com ângulos abertos que destacam a sensação de liberdade.


O suspense é bem construído, com um clima que indica que as coisas não são o que parecem. A revelação da verdadeira intenção do empresário é surpreendente e adiciona uma nova camada ao filme. A trama aborda temas como a seletividade da memória e a diferença entre esquecer e lembrar, refletindo sobre como muitas vezes focamos no negativo.

O thriller é recheado de reviravoltas criativas e eficazes, lembrando o estilo de Jordan Peele. O humor e os estereótipos são bem incorporados, com personagens excêntricos como uma lutadora de boxe famosa e blogueiros que escondem seus verdadeiros instintos sob a fachada da fama.


Naomi Ackie se destaca com uma atuação profunda e segura como Frida. A relação entre Frida e Slater é um ponto positivo, embora reste a dúvida sobre a natureza da ligação deles.

O elenco conta ainda com o vencedor do Globo de Ouro, Christian Slater, Haley Joel-Osment, Simon Rex, Adria Arjona, Levon Hawke (filho de Ethan Hawke e Uma Thurman), Kyle MacLachlan e a vencedora do Oscar, Geena Davis.


Todas as personagens femininas são bem escritas, e a união delas é bem desenvolvida, abordando questões importantes como estupro e submissão com um subtexto rico. No entanto, o final do filme pode parecer simples e óbvio, comprometendo um pouco a força das reviravoltas anteriores.

"Pisque Duas Vezes" certamente está na corrida para os melhores do ano e pode garantir a Zoë Kravitz um prêmio por roteiro original. Sua estreia como diretora mostra um trabalho primoroso na abordagem de temas femininos e sororidade.


Ficha técnica:
Direção e roteiro: Zoë Kravitz
Produção: Amazon MGM Studios
Distribuição: Warner Bros. Pictures
Exibição: nos cinemas
Duração: 1h42
Classificação: 18 anos
País: EUA
Gêneros: suspense, terror psicológico