02 julho 2021

Crime em "Mare of Easttown" expõe o lado obscuro de uma comunidade

Série tem como pano de fundo a investigação do assassinato de uma jovem numa pequena cidade da Pensilvânia (Fotos: HBO/Divulgação)


Carolina Cassese


“Neste drama policial original da HBO, a vencedora do Oscar, Kate Winslet ("Titanic" - 1997 e "A Despedida" - 2021), interpreta Mare Sheehan, uma detetive de uma pequena cidade da Pensilvânia que deve investigar um violento assassinato local”. A partir dessa premissa presente na descrição oficial da série, poderíamos facilmente classificar "Mare of Easttown" como mais uma produção do estilo “quem matou”. 

No entanto, a HBO apresenta mais uma vez (assim como fez em "Big Little Lies", "Sharp Objects" e, mais recentemente, com "The Undoing") uma trama complexa, repleta de camadas e dramas humanos.


A minissérie também está disponível no serviço HBO Max, que estreou no Brasil em 29 de junho. Como já explicitado, os acontecimentos da série são desencadeados a partir do assassinato da jovem Erin McMenamin (Caille Spaeny). A detetive encarregada do caso é Mare Sheehan (Kate Winslet, principal nome por trás da série), que ainda sofre com o luto pela morte de seu filho, Kevin. Na medida em que conhecemos os núcleos familiares dos moradores da cidade, observamos que todos estão lidando com questões complicadas. Todos são suspeitos.


"Mare of Easttown" quebra uma velha premissa de muitas produções de suspense - a de que “absolutamente tudo que o diretor escolhe mostrar precisa ser relevante para a resolução do mistério”. Diversos acontecimentos da história são, na verdade, pistas falsas (a técnica de misleading, bastante utilizada pela rainha do crime Agatha Christie) ou informações que contribuem consideravelmente para a construção dos personagens, mas não para o desenlace da investigação.

Até mesmo o personagem Richard Ryan, par romântico de Mare interpretado pelo ótimo Guy Pearce, não tem aquela função clássica de amor romântico da protagonista. “Não é preciso ser para sempre para significar algo”, destaca a namorada da personagem Siobhan Sheehan (Angourie Rice), filha de Mare.


O produtor-executivo da série reforça que a trama é pouco centrada em homens ou no amor romântico. “A maioria dos personagens masculinos nesse programa são maus. Não quero dizer todos, mas a maioria. Assim que comecei a escrever o roteiro, queria escrever sobre a minha casa e eu cresci rodeado de mulheres. Foi essa força e essa solidariedade entre elas que me inspirou”, declarou Brad Ingelsby ao podcast Still Watching.

As relações de amizade e de família são mais do que suficientes para sustentar a série e contar excelentes histórias. Temos de fato a sensação de que os moradores da pequena cidade já se conhecem há bastante tempo e são verdadeiramente familiarizados uns com os outros. Os sentimentos, tanto os de amor quanto os de ódio, parecem ter raízes.


Tal percepção se deve muito ao excelente elenco da produção. É inclusive uma tarefa difícil destacar apenas um nome, ao passo que é necessário citar o maravilhoso trabalho de Winslet, encarregada de interpretar nossa adorável (“pero no mucho”) protagonista. “Pero no mucho” pelo simples motivo de que Mare é real: comete erros, muitas vezes é seca com a mãe (que também pode ser bem direta com ela), nem sempre dá a devida atenção para sua filha, se recusa a cumprir ordens do chefe. Em meio a todas essas contradições, Mare pode ser adoravelmente desagradável ou desagradavelmente adorável. Ela é crível, quase existe, quase tem vida própria.


Além dos excelentes veteranos James McArdle (Deacon Burton), Jean Smart (Helen) e Robert Tann (Billy Ross), o elenco mais jovem de "Mare of Easttown" também não deixa a desejar e protagoniza momentos carregados de dor. Prepare-se: seu emocional provavelmente não ficará intacto com o fim que leva um dos personagens jovens. Outro nome responsável por dilacerar nossos corações é o de Julianne Nicholson (Lori Ross), excelente atriz que entrega muito em cenas difíceis.


O último episódio da minissérie, intitulado "Sacrement", é um show de duas atrizes que, justamente por serem tão espetaculares, nos fazem esquecer que Winslet e Nicholson estão em cena. Naquele momento, vemos apenas Mare e Lori, duas amigas que sofrem, se protegem e se amam. A emocionante cena final é um lembrete importante de que muitas vezes precisamos de tempo (e também de escuta) para lidarmos com nossos machucados e encararmos sótãos empoeirados.

Levando em conta o fato de Damon Lindelof, produtor da série "Watchmen", ser fã assumido de "Mare of Easttown" (há ainda uma gratificante piscadela da série para o Dr. Manhattan), é válido pegar carona numa frase dessa outra excelente produção da HBO. Afinal de contas, “feridas precisam de ar, não de máscaras”.


Ficha técnica:
Direção:
Craig Zobel
Criação: Brad Ingelsby
Exibição: HBO e HBO Max
Duração: média de cada episódio de 60 minutos (1ª Temporada - 7 episódios)
Classificação: 16 anos
País: EUA
Gêneros: Drama / Policial

30 junho 2021

"Luca" emociona e faz a gente relembrar os prazeres da infância

Animação da Disney/Pixar tem aventura, amizade e a descoberta de um novo mundo (Fotos: Walt Disney Company/Divulgação)


Maristela Bretas


Seria apenas mais uma animação se não fosse feita pela Pixar, estúdio que gosta de mexer com nossas emoções. Várias lágrimas desceram desses olhos com "Luca", em exibição na plataforma Disney+ para assinantes (sem taxa extra), é uma história cheia de aventuras e descobertas, que está arrebatando crianças e adultos, com uma linguagem simples e envolvente.

Como sempre, a Pixar pega a gente pelo coração e "Luca" não poderia ser diferente. Vale lembrar de "Divertida Mente" (2015), "Soul" (2021) e a franquia "Toy Story", iniciada em 1995 e encerrada com "Toy Story 4" em 2019 com muitas lágrimas. Em todos, a abordagem trata de família, transições, incertezas, abandono, sentimentos e, principalmente, amizade.


A nova animação trata de tudo isso, distribuindo os sentimentos entre todos os personagens, especialmente o protagonista Luca Paguro, um garoto de 13 anos que começa a descobrir a adolescência, mas precisa esconder um grande segredo. Com voz de Jacob Tremblay (de "O Quarto de Jack" - 2016, "Extraordinário" - 2017 e "Doutor Sono" - 2019), o jovem que sempre morou com os pais, quer conhecer o mundo da superfície.

Para isso vai contar com a ajuda de um novo amigo, Alberto Scorfano (voz de Jack Dylan Grazer, de "It - A Coisa" - 2017 e "Shazam! "- 2019), um garoto que vive sozinho numa ilha, sempre cheio de histórias e que não tem medo de se aventurar.


Assim como Luca, Alberto também esconde um segredo - ambos são monstros marinhos que adquirem aparência humana quando saem da água. Maior que o medo de serem descobertos é ganhar o mundo na garupa de uma Vespa e a curiosidade de conhecer como vivem os humanos de verdade que habitam a pequena e colorida vila de Portorosso.

Para isso, Luca terá de abandonar a família no fundo do mar e ganhar o mundo ao lado do melhor amigo e conhecerão pessoas "normais" e especiais, como Giulia Marcovaldo (Emma Berman), uma jovem valente, criada pelo pai, um pescador local, que é excluída pelas pessoas da vila. Ela se unirá aos dois amigos, sem conhecer a verdadeira identidade deles. 


Mas a vila também tem seu lado cruel e graças às histórias de ataques de monstros marinhos nas redondezas, os dois amigos terão de fazer de tudo (especialmente fugirem da água) para esconderem seu segredo e não caírem nas redes dos pescadores. Isso sem contar a perseguição dos famosos “valentões”. 

Entre passeios de uma motoneta improvisada, mergulhos escondidos, fartos pratos de uma bela massa ou casquinhas de sorvetes e noites sob a luz do luar, a história de "Luca" traz de volta a infância. Para completar, a história é ambientada nos anos 1970 e teve locação inspirada numa colorida vila na costa da Riviera Italiana, uma das regiões mais atraentes do país.


Tudo isso embalado por uma nostálgica e bela trilha sonora, composta por Dam Romer. Destaque para "Your are my sunshine" (Antonio of Italy), "Mambo italiano" (Dean Martin), "II gatto e la volpe" (Edoardo Bennato), "Never gonna give you up" (Rick Astley), “Viva la pappa col pomodoro” (Rita Pavone), “Andavo a cento all’ora” (Gianni Morandi), entre outros.

O elenco de "Luca" conta ainda com as vozes de Maya Rudolph e Jim Gaffigan, como os pais de Luca, Peter Sohn (Ciccio), Sacha Baron Cohen (tio Ugo) e até mesmo a do diretor Enrico Casarosa, dublando dois personagens. No Brasil, as dublagens de Luca foram feitas por Rodrigo Cagiano (Luca), Pedro Miranda (Alberto) e Bia Singer (Giulia). Claudia Raia, que empresta a voz para a Signora Mastroianni, trabalha ao lado da filha, Sophia Raia, que dubla a personagem Chiara.


Assim como outra animação, "A Pequena Sereia" (1989, dos estúdios Disney) e o longa "Splash - Uma Sereia em Minha Vida" (de 1984, com Tom Hanks e Daryl Hannah), a nova produção Pixar mostra como a superfície pode ser atraente, mas também perigosa e cruel para quem é "diferente". Mesmo assim, vale ganhar pernas e descobrir o mundo e o amor. Encante-se com "Luca" e não esqueça o lencinho para o emocionante final.


Ficha técnica:
Direção: Enrico Casarosa
Produção: Pixar Animation Studios / Walt Disney Pictures
Exibição: Disney +
Duração: 1h36
Classificação: Livre
País: EUA
Gêneros: Animação / Fantasia / Aventura
Nota: 4 (de 0 a 5)