22 dezembro 2022

"Smiley", uma comédia romântica que está dando o que falar

Carlos Cuevas e Miki Esparbé são os protagonistas desta divertida série espanhola (Fotos: Netflix)


Eduardo Jr.


O mês de dezembro é marcado não só pelas festas, mas também pela temporada de filmes de Natal. Entre novidades e títulos já conhecidos, uma série ambientada na Espanha, perto do Réveillon, chega para trazer refresco a essa lista de produções de fim de ano. 

Com o aval de ter chegado rapidamente ao top 10 da Netflix, “Smiley” promete figurar entre as mais divertidas da plataforma. 


Nesta comédia romântica LGBTQIA+, vários casais lidam com os prazeres e dificuldades de um relacionamento. Ceia de Natal, amigo oculto da empresa, a vontade de começar o ano com um novo amor, tudo se torna ingrediente para balançar ou acertar a vida amorosa das personagens. 

No centro da trama estão dois homens, Álex (Carlos Cuevas, já conhecido pela série Merlí) e Bruno (Miki Esparbé, que atuou em ‘O Inocente’). Ambos querem encontrar alguém especial, mas como sabemos, histórias de amor não são fáceis. 


Depois de mais um namoro fracassado, Álex resolve telefonar e dizer poucas e boas para o ex. Mas o recado cai na secretária eletrônica de Bruno. Ao se conhecerem pessoalmente, apesar das muitas diferenças entre eles, uma conexão acontece. 

Mas em uma troca de mensagens, um emoji de um sorriso (smiley), que poderia fazer a relação decolar, é interpretado de forma inesperada. Aí o romance não só estaciona, como parece dar marcha à ré.  


A falta de comunicação entre os casais dá a tônica da série, seja realçando dramas, ou divertindo o espectador. A rotina que afasta marido e mulher um do outro - e também de atividades que gostam - ampliando o abismo da falta de diálogo, encontra remédio na conversa. 

Os textos de apresentação nos sites de relacionamento, incapazes de explicar a complexidade humana, mostram com humor que precisamos nos expressar melhor e também dar essa chance aos outros. Comunicação clara (e não só por emojis). 


A apresentação de relacionamentos LGBTQIA+ não deixa de lado a militância. Com sutileza e talento, pautas como a interiorização da liberação feminina por mulheres lésbicas, os medos da população gay e os preconceitos dentro da própria comunidade estão lá. E promovem a reflexão para que não se tornem muros, e sim pontes que nos aproximem. 

O receio de assumir quem se é de verdade, de revelar sentimentos, e dar como certa a ideia de que envelhecer impede a construção de novos laços, nos tornando feios e incapazes de despertar desejo são questionados e respondidos com firmeza e também doçura. 


Um leve suspense também marca presença. A mãe do protagonista recebe a visita de um velho conhecido. As conversas pouco reveladoras entre eles vão criando um clima que não permite saber o que aconteceu anos atrás e muito menos qual será o desfecho dessa história. Mas a resposta vem. 

A série é eficiente também em mostrar que não é preciso dizer muito pra dar o recado. Os oito episódios são curtos e têm, em média, 35 minutos de duração. São cativantes e entretêm - principalmente por apresentarem telas divididas entre as personagens, mensagens de celulares ampliadas na cena e outros recursos que fazem o público se identificar, deixando o conteúdo ágil e convidativo. 


Talvez o único contra esteja no idioma, já que os capítulos trazem, por muitas vezes, diálogos acelerados (a maioria das cenas foi gravada em catalão). 

A série é uma aposta da Netflix que já começa a dar resultados mais vistosos do que “Uncoupled”, outra trama cômica sobre desventuras amorosas do mundo gay. “Smiley” atingiu a lista de melhores programas da plataforma com agilidade. Talvez por ter credenciais de respeito. 

Baseada em uma peça de teatro, todos os episódios foram roteirizados pelo autor do texto, Guillem Clua. O jovem dramaturgo também roteirizou a série “O Inocente”, baseada no livro de Harlan Coben, autor que vem se firmando como um dos queridinhos da literatura de suspense e da Netflix. 


Embora a série não fique devendo um final ao público, a expectativa é de que “Smiley” ganhe uma nova temporada. Em entrevistas, o diretor e roteirista já andou dizendo que existe uma segunda peça escrita, dando sequência à história dos personagens centrais. 

Portanto, caso seja batido o martelo sobre uma continuação, ela se basearia neste material. Para quem encerrou o ano assistindo “Smiley”, certamente deu vontade de pedir ao Papai Noel “ano novo, temporada nova”. 


Ficha técnica:
Direção: Guillem Clua
Produção: Minoria Absoluta
Exibição: Netflix
Duração: 1ª Temporada = 8 episódios/média de 35 minutos cada
Classificação: 16 anos
País: Espanha
Gêneros: comédia / romance / série

18 dezembro 2022

"Pinóquio", de Guillermo del Toro, é uma verdadeira obra de arte

Nova versão da história do boneco feito de maneira de pino se aproxima assim da obra original de Carlos Collodi (Fotos: Netflix)


Marcos Tadeu
Blog Narrativa Cinematográfica


A animação mais aguardada do gênio Guillermo del Toro, "Pinóquio" é um dos sucessos em cartaz na Netflix. O novo longa, diferente da versão live-action do estúdio Disney, reconstrói, de forma sensível e tocante, a história do boneco feito de maneira de pino, se aproximando assim da obra original de Carlos Collodi.

Aqui conhecemos Gepeto (voz de David Bradley), um entalhador que perdeu seu filho Carlo na guerra, em uma Itália fascista nos anos 50. O personagem se vê na solidão e começa a criar um boneco de madeira. 

O que ele não imaginava é que este ganharia vida, iniciando assim sua jornada de aceitação do boneco como filho e de busca da ressignificação do luto.


Gepeto tem uma participação incrível em toda a trama. Num primeiro momento, ele rejeita Pinóquio (voz de Gregory Mann) e quer fazer dele uma cópia fiel de seu filho. 

Passada essa fase, ele aprende a lutar e a amar Pinóquio e toda essa jornada ao longo da obra cresce aos olhos do telespectador.

No lugar da Fada Azul temos duas figuras: a Guardiã, cuja missão é cuidar das coisas perdidas ou abandonadas. É ela que concede o dom da vida a Pinóquio para poder alegrar o pai. 

Nas primeiras cenas em que o boneco fala, isso causa espanto em Gepeto, e em sua inocência, por não conhecer nada da vida, acaba destruindo vários objetos da casa. 


Na cena da igreja, por exemplo, quando Pinóquio vai atrás de seu pai, os fiéis começam a ofendê-lo, chamando-o de "demônio" e "bruxaria". A consequência disso, o governo fascista determina que Pinóquio vá para a escola e não cause problemas. 

Outra figura importante é a Morte, que faz com que Pinóquio se descubra imortal e ensina o valor das relações com as pessoas a sua volta.

O famoso Grilo Falante (voz original de Ewan McGregor,de "Doutor Sono" - 2019) agora tem nome e sobrenome, Sebastian J. Cricket. A todo o momento reafirmando que é um romancista, coube a ele narrar a história e de fato isso acontece, quando Gepeto constrói Pinóquio, ele escolhe a árvore em que Sebastian vai morar. 


Nesse longa, sim, Sebastian é uma verdadeira consciência, mesmo que muitas vezes Pinóquio aja com inocência, ele sempre dá um jeito de aparecer. Podemos acrescentar que nesta obra, Cricket interage até com Gepeto no desenvolvimento da obra.

Se no desenho clássico temos Strombolli, aqui o vilão é o Conde Volpe (voz de Christoph Waltz, de "Alita - Anjo de Combate" - 2019) , com praticamente a mesma função. Vale destacar a forma como ele consegue manipular e mostrar sua autoridade para que Pinóquio seja apenas um boneco que dá lucro para seu teatro. Volpe é extremamente ambicioso e coloca o dinheiro acima de qualquer relação.


O pano de fundo político é mostrado todo o tempo, com uma Itália sombria, governada pelo ditador Benito Mussolini. Inclusive a ordem é obedecer cegamente e o slogan que vem junto a isso é “Crer, obedecer e combater”. 

Podesta (Ron Perlman, de "O Beco do Pesadelo" - 2021), um fascista local, enxerga em Pinóquio o potencial para ser usado como soldado, justamente por ele não morrer. 


Já Candlewick, filho de Podesta, (dublado por Finn Wofhard, de "Stranger Things") é um personagem muito profundo e tem tempo suficiente para desenvolver sua honra ao pai. Assim como Pinóquio quer ser o orgulho de Gepeto, Candlewick quer o mesmo com o seu pai fascista. Mas muitas vezes terá de quebrar regras e desobedecê-lo por não concordar com a forma como o pai extermina pessoas.


Os números musicais aqui são todos muito bem coreografados e cantados. Del Toro coloca canções pontuais que, de fato, expressam o que sentem seus personagens, com destaque para Pinóquio, Gepeto e Conde Volpe, que dominam a maioria das performances.

A técnica de stop-motion prova que Del Toro está em cada quadro mostrado ao público. É um desenho tão potente em sua mensagem quanto na forma como foi feito, provando, cada vez mais, que o diretor domina qualquer gênero, inclusive animação.


Talvez um único ponto negativo seja a falta de mais camadas para a Guardiã e a Morte. Uma abordagem mais profunda da origem dessas personagens acrescentaria um algo mais à história. Mas isso não atrapalha a ótima experiência proporcionada pela produção.

"Pinóquio", por Guillermo del Toro, é um filme que fala sobre aceitar quem somos sem que tenhamos de fazer mudanças para agradar outras pessoas. É sobre entender o peso da verdade e suas consequências. Sem dúvida, uma animação que vale a pena ver e rever, para sempre descobrir novas lições.


Ficha técnica:
Direção:
Guillermo del Toro e Mark Gustafson
Produção: Pathé, Jim Henson Productions, Inferno Entertainment
Exibição: Netflix
Duração: 1h57
Classificação: 10 anos
País: EUA
Gêneros: Animação / Fantasia