18 janeiro 2024

Julianne Moore e Natalie Portman roubam a cena até mesmo em uma sátira como "Segredos de um Escândalo"

Filme é baseado em um caso real de pedofilia dos anos de 1990 que ganhou as páginas de jornais sensacionalistas pelo mundo (Fotos: May December Productions)


Wallace Graciano


Quando você tem em um filme um elenco com Julianne Moore e Natalie Portman, logo a expectativa de uma obra carregada de emoções fica no alto, certo? Impossível ser diferente, afinal estamos falando de duas das atrizes que faltam predicados para qualificá-las. 

Imagine, então, para dar vida a um filme baseado em fato real, no qual, normalmente, sentimentos e trejeitos são explorados de forma exaustiva? 

Porém, se podemos lhe dar um conselho é que dispa-se dela quando for assistir "Segredos de um Escândalo" ("May December"). Não que a atuação das duas não seja fantástica, como outrora. É. A questão está na premissa da obra em si, que carrega uma sátira a todo o mercado.


Todd Haynes, de "Carol" (2016), deixou para trás os embates morais de uma relação que ia de contraponto ao status quo de uma sociedade para, agora, atacar de forma melodramática tudo que está envolto no sensacionalismo da vida real.

Na trama, ele nos traz Gracie Atherton-Yoo, que é vivida por Moore. Uma mãe dedicada aos filhos, que é casada com Joe (Charles Melton). Seriam mais uma família estadunidense estereotipada não fosse o fato dela, quando tinha 36 anos e três filhos, ter se envolvido sexualmente com ele, que, aos 13 anos, era amigo de escola do seu filho. 

Da relação nasceu um casal de gêmeos e fez com que a outrora dedicada mãe fosse parar atrás das grades.


Após se acertar com a Justiça, Gracie volta a se relacionar com Joe e eles tentam seguir uma vida comum, como se o passado fosse apenas uma mera pedrinha que ultrapassaram. 

E assim seria, com os filhos prestes a entrar na universidade, não fosse o fato de Elizabeth (Portman), uma renomada atriz vencedora de séries, ser convidada para dar vida à Gracie em um filme. Pura metalinguagem.

Enquanto “investiga” trejeitos de sua futura personagem, Elizabeth passa do papel de detetive ao de psicóloga, colocando na sala do casal vários elefantes que estavam obscuros. E eles são muitos, com a relação abusiva do passado, que ficou por baixo do tapete, sendo mantida no presente, onde Gracie trata o marido como uma de suas proles, quase que de forma infantil. 


Nesse contexto, Haynes é brilhante ao conseguir expor o absurdo do caso. E ele conta com atuações impactantes de Portman e Moore para chegar a isso, já que elas misturam seus atos a um constante desconexo de frases e falta de linearidade da fotografia. O confuso é proposital e traz uma provocação ao sensacionalismo. 

Se podemos resumir a você, caro leitor, é que você precisa ir ao cinema com a certeza de que a obra não será eternizada como uma das mais brilhantes que assistimos, mas que valerá todo seu esforço. Seja por sair provocado pela construção propositalmente confusa de Haynes, seja por saber que Moore e Portman são duas das mais brilhantes atrizes de nossa geração.


Em qual caso "Segredos de um Escândalo" é inspirado?

A obra vivida por Portman e Moore não traz os nomes reais dos personagens que a inspirou. Na verdade, Gracie tem paralelos com Mary Kay Letourneau, enquanto Joe é um personagem que tenta reproduzir a vida de Vili Fualaau.

Os dois protagonizaram um dos maiores escândalos sensacionalistas estadunidenses dos anos 1990. Mary Kay e Vii se conheceram em 1991, quando ele tinha apenas oito anos e estudava na mesma escola em que Mary era sua professora numa cidade ao sul de Seattle. 

Ao conhecer mais profundamente aquele garoto, ela buscou estimulá-lo, já que ele vinha de uma família desestruturada, com 17 irmãos. Porém, cinco anos mais tarde, o que era cumplicidade ganhou outros rumos. 

Fualaau apostou com uma prima que conseguiria conquistar a professora e passou a “cantá-la” em um acampamento de verão. Mary, com 35 anos, consentiu e a relação mudou de status, virando um romance. 

O casal Mary Kay e Vii (Reprodução/Youtube)

Eles viveram em segredo até que em meados de 1996 um policial descobriu o casal. Ele patrulhava uma rua e verificou um carro suspeito, descobrindo a relação. Eles tentaram negar o caso, mas Steve, o marido de Mary, encontrou os bilhetes românticos, denunciando a então esposa à polícia.

Mary foi presa, acusada de estupro de vulnerável. Ela chegou a fazer um acordo com a promotoria e ficou somente seis meses presa, quando avisou que estava grávida. Ela cumpriu só metade da pena, com a condição de não ver mais Vii. Porém, ao sair, se reaproximou do rapaz, o que fez com que pegasse sete anos de prisão, após anunciar nova gravidez.

Quando Mary foi solta, os dois se casaram, já que Fualaau era maior, vivendo 12 anos juntos e se separando em 2017, a pedido de Vili. No ano seguinte, Mary foi diagnosticada com câncer de cólon, e dois anos depois, em 2020, faleceu aos 58 anos.


Ficha técnica:
Direção: Todd Haynes
Produção: Killer Films, May December e Netflix Productions
Distribuição: Diamond Films Brasil
Exibição: nos cinemas
Duração: 1h57
Classificação: 16 anos
País: EUA
Gêneros: drama, comédia

17 janeiro 2024

"Mergulho Noturno" - um terror que decepciona

A história gira em torno dos quatro integrantes de uma família e os ataques vindos de uma entidade que habita a piscina da casa deles (Fotos: Universal Pictures)


Maristela Bretas


Uma boa proposta que afunda na própria piscina e decepciona. Este é "Mergulho Noturno" ("Night Swim"), que estreia nos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (18). O filme entrega poucas cenas de terror, tem um monstro tosco que só assusta na primeira aparição (o único berro de susto ouvido por todos na sessão de pré-estreia foi de uma amiga) e mais nada. 

Produzido pela Blumhouse, a mesma responsável por títulos do gênero como "A Freira" (2018), "M3gan" (2022) e “Five Nights at Freddy's - Pesadelo sem Fim" (2023), o longa, dirigido por Bryce McGuire é inspirado no curta-metragem homônimo de 2014. Difícil acreditar que uma produção de terror que tem como produtores James Wan e Jason Blum poderia se tornar o desperdício de um tema que tinha tudo para agradar quem gosta deste tipo de filme. 


"Mergulho Noturno" conta a história de Ray Waller (Wyatt Russell, de "Operação Overlord" - 2018) um ex-jogador de beisebol que foi forçado a se aposentar precocemente em função de uma doença degenerativa. Ele se muda com a esposa Eve (Kerry Condon, de "Os Banshees de Inisherin" - 2022), o filho Elliot (Gavin Warren) e a filha adolescente Izzy (Amélie Hoeferle, de "Jogos Vorazes: A Cantiga dos Pássaros e das Serpentes" - 2023) para uma casa nova. Só não contavam com as forças sobrenaturais que habitavam justamente o local favorito das crianças: a piscina. 


O início do filme é até promissor. O diretor Bryce McGuire cria uma atmosfera de suspense e tensão, com imagens sombrias e uma trilha sonora inquietante. O público é rapidamente envolvido pela história e começa a se perguntar o que está acontecendo com a família.

Mas antes da metade do filme, o suspense já deixa de existir e as cenas de terror, já fracas, se tornam cada vez mais escassas, mesmo o diretor tendo afirmado em recente entrevista que o filme faria o público "perder o fôlego e roer as unhas nos cinemas".


Os jump scares, usados de forma excessiva, são previsíveis, não causam nenhum impacto e acabam perdendo a eficácia. O filme também peca por ser muito previsível, com uma reviravolta que é facilmente adivinhada. 

Apesar de ser um gênero que deveria causar susto e medo, o longa se concentra mais nas reações dos Waller ao que está acontecendo. E é a ótima atuação do elenco, especialmente da família, o ponto positivo de destaque. 

A piscina vilã, centro das atenções do filme, é pouco explorada e acaba ficando em segundo plano. A reviravolta é facilmente adivinhada, o filme dá pistas demais e tira o impacto. "Mergulho Noturno" pode até divertir os fãs do terror, mas é improvável que surpreenda ou assuste.


Ficha técnica
Direção e roteiro: Bryce McGuire
Produção: Atomic Monster e Blumhouse Productions
Distribuição: Universal Pictures
Exibição: nos cinemas
Duração: 1h39
Classificação: 14 anos
País: EUA
Gêneros: terror, suspense