23 janeiro 2024

Animação “Bizarros Peixes das Fossas Abissais” entrega a estranheza que o título sugere

Estreia do animador Marão na direção de um longa tem vozes de Guilherme Briggs, Rodrigo Santoro e Natália Lage (Fotos: Pedro Gallo) 


Eduardo Jr.


O título é bem exótico. E o que se vê na tela é igualmente estranho. Mas a mensagem chega ao destinatário e até diverte o público durante esse trajeto. O filme “Bizarros Peixes das Fossas Abissais” marca o primeiro passo do diretor e animador Marão no mundo dos longas-metragens, e chega aos cinemas no dia 25 de janeiro. A distribuição é da Vitrine Petrobras, em parceria com a Boulevard Filmes. 


O título se refere ao destino das personagens, as profundezas do mar, onde esperam encontrar um segredo oculto por um mapa. Nessa jornada, que vai da baixada fluminense até a Sérvia, três personagens se unem: uma mulher que transforma seus glúteos em um primata bom de briga ao pronunciar a frase “minha bunda é um gorila” (oi?), uma tartaruga com transtorno obsessivo-compulsivo (que é ótima!) e uma nuvem com incontinência urinária - ou melhor, pluviométrica (eu juro, é isso mesmo que você leu). 


Toda essa esquisitice chega ao espectador vestida em traços rústicos como rascunhos, em piadas nonsense e ironias sobre o universo dos heróis. Na dublagem, nomes de destaque como Natália Lage, Guilherme Briggs e Rodrigo Santoro. E o que parece ser limitação é, na verdade, uma escolha. Marão, que roteirizou o longa, decidiu trabalhar com apenas dois nomes, já velhos conhecidos do diretor: Rosaria e Fernando Miller. 

Talvez por isso tenha levado dez anos para concluir a obra. Foram quatro anos para captar recursos e outros seis para desenhar e animar tudo. A história foi ganhando vida em ordem cronológica, em formato 2D, utilizando a técnica full animation, na qual os personagens se movem por inteiro, e não algumas partes. 


A animação dialoga com jovens adultos, e nela há pautas como amizade, a força do coletivo, a coragem para enfrentar seus medos, valores de vida e resiliência. Abordagens presentes também em outras obras, como “Chef Jack” (2023), um dos representantes deste momento de ascensão da animação brasileira.    

Mesmo que a proposta seja duvidosa, as credenciais do longa vão se acumulando. Marão e seu “Bizarros Peixes das Fossas Abissais” receberam Menção Honrosa na Première Brasil - Novos Rumos no Festival do Rio; prêmio de Melhor Longa pelo júri popular do Monstra Festival, em Lisboa; prêmio de Melhor Longa de Animação do City Film Festival Stockholm, na Suécia; além de integrar a programação da 47ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo e do Festival Internacional Del Nuevo Cine Latinoamericano de Havana. 

Diretor e animador Marão

Mostras de cinema não são uma novidade para Marão, que tem passagem por 667 festivais e 127 prêmios. Entre seus 15 filmes, há, sim, curtas mais interessantes do que “Bizarros Peixes”. Mas a experiência de conhecer o trabalho do diretor e animador pode ser interessante. 

As cidades com exibição confirmada do longa são Aracaju, Belém, Belo Horizonte, Brasília, Cuiabá, Curitiba, Fortaleza, Goiânia, João Pessoa, Maceió, Manaus, Niterói, Palmas, Porto Alegre, Recife, Rio Branco, Rio de Janeiro, Salvador, São Paulo e Vitória. 


Ficha Técnica:
Direção e roteiro: Marão
Animação: Marão, Rosaria e Fernando Miller
Produção: Letícia Friederich
Distribuição: Vitrine Filmes e Boulevard Filmes
Exibição: nos cinemas
Duração: 1h15
Classificação: Livre
País: Brasil
Gêneros: comédia, animação

19 janeiro 2024

"Sobreviventes - Depois do Terremoto" explora ética e moral da sobrevivência e da coexistência

A escolha de tons mais escuros e sombrios ajuda a transmitir a sensação de desespero dos personagens diante da devastação de Seul (Fotos: Lotte Entertainment)


Silvana Monteiro
@silmontheiro


"Sobreviventes - Depois do Terremoto" ("Concrete Utopia"), dirigido por Tae-hwa Eom, que assina o roteiro com Lee Shin-ji, traz análise e crítica socioambiental, escancarando as várias faces da natureza humana, principalmente frente aos desafios e à escassez de recursos e de habitação. 

O filme, que entrou em cartaz nos cinemas, começa com cenas inofensivas que demonstram a verticalização e a grande quantidade de pessoas em busca de uma chance para adquirir um apartamento em Seul, capital da Coreia do Sul.


Um cataclismo de proporções avassaladoras se desencadeia, deixando para trás uma paisagem desolada. O caos se instala e a esperança parece um fio tênue prestes a se romper. Em meio à devastação, apenas um imponente arranha-céu, o Hwang Gung Apartments, emerge como um farol solitário de resistência.

No inverno implacável, o prédio se torna uma colmeia humana, abrigando uma miríade de histórias, dores e esperanças. No entanto, a harmonia é rapidamente ameaçada à medida que a capacidade do edifício é ultrapassada.


Incomodados com aqueles "sobreviventes invasores", os "sobreviventes proprietários", tomam uma medida extraordinária para preservar a ordem. Mas como estabelecer tais regras em um lugar onde a própria vida é uma exceção, frágil e incerta? 

Na imensidão do caos, alguém é dono de algo? Quem tem domínio sobre a própria vida? O dilema moral surge, desafiando a noção de justiça em meio à adversidade.

Entre paredes marcadas pela tragédia, segredos são revelados, alianças são formadas e o destino de todos fica suspenso no fio da balança. Nesse turbilhão de emoções e dilemas morais, uma única certeza prevalece: coexistir em meio ao caos é enlouquecedor. Ser e ter se confundem.


Fotografia e cinematografia

As cenas fazem com que o espectador mergulhe profundamente na experiência dos sobreviventes. A fotografia com uma paleta de cores contrastantes, alternando entre tons claros antes do terremoto e tons mais sombrios, fortes e marcados após a catástrofe, reforça o realismo distópico da obra.

Essa escolha estética intensifica o impacto emocional de "Sobreviventes - Depois do Terremoto", transmitindo a sensação de desespero e desolação dos personagens. Os movimentos demonstram as tensões em busca de sobrevivência e convivência, o que proporciona uma experiência cinematográfica emocionalmente carregada.


Enredo e atuações

O diretor entrelaça diferentes histórias pessoais, algumas vezes com um certo desequilíbrio, o que pode causar confusão no fio condutor. Isso exige do espectador fixação total na tela. 

Os destaques da atuação vão para os atores Park Seo-joon ("Parasita" - 2020) como Min Sung, e Park Bo-young (Myung Hwa) que vivem os recém-casados da trama. Os dois dão o toque Dorama ao longa e nos remetem ao lado solidário da humanidade. Ambos permeiam a luta para salvar os sonhos e aspirações de um casal com cenas intimistas e propósitos de resiliência.


Lee Byung-hun, que já atuou em vários filmes e séries de televisão, incluindo "Sete Homens e Um Destino" (2016) , "O Bom, o Mau e o Bizarro" (2008), "Mr. Sunshine" (2018) e "Round-6" (2021), também se destaca. Ele dá o toque visceral e personifica a insurgência, nem vilão e nem mocinho, agindo como uma espécie de síndico, disposto a tudo para salvar seu teto e sua pele.

"Sobreviventes - Depois do Terremoto" peca na duração e no excesso de incidentes fragmentados no caos. Na visão desta cronista, a trama poderia ser mais coesa para prender melhor o público, porém ainda é um prato cheio para quem gosta de ficção científica e distopia, de reflexão e de debate sobre os caminhos e destinos da humanidade.


Ficha técnica
Direção:
Tae-hwa Eom
Produção: Climax Studio e BH Entertainment Co.
Distribuição: Paris Filmes
Exibição: nos cinemas
Duração: 2h09
Classificação: 16 anos
País: Coreia do Sul
Gêneros: drama, ficção científica, suspense