03 fevereiro 2024

"Argylle - O Superespião", um filme de muita ação, reviravoltas e boatos nas redes sociais

Longa conta com ótimo elenco e entrega doses de humor, romance e até sedução (Fotos: Universal Pictures)


Maristela Bretas


O diretor Matthew Vaughn não economizou nos efeitos visuais, na pancadaria e, menos ainda, no orçamento (US$ 200 milhões) para entregar o filme de "Argylle - O Superespião" ("Argylle"). O longa está em cartaz nos cinemas e, em breve, no canal da Apple TV+, que é a produtora.

Com muita ação, reviravoltas e ótima trilha sonora, a produção ainda conta com um atrativo para atrair público. Boatos polêmicos na internet, recheados de pistas bem "imaginativas", dão conta de que a misteriosa escritora Elly Conway, cujo livro homônimo deu origem ao filme, seria o pseudônimo usado pela cantora Taylor Swift para lançar a obra literária. 


Não são poucas as "teorias da conspiração" criadas pelos fãs nas redes sociais, que incluem semelhança de com personagens, roupas e objetos da famosa cantora. Sobrou até para o coitado do gato que, na verdade, pertence à esposa do diretor.  

Outro ponto que chama atenção em "Argylle" são as cenas mais "calientes", na abertura do filme, entre o Superman, Henry Cavill, e a bela Dua Lipa, ao som do grande sucesso "My First, My Last, My Everything", na voz do inesquecível Barry White. Nada como um helicóptero para criar um clima. Quem assistir vai entender.


Dua Lipa, agora loira, está em seu segundo filme (o primeiro foi uma rápida aparição em "Barbie"). Ela entrega uma interpretação bem convincente como a espiã LaGrange que seduz o espião Argylle (Cavill, que já fez papel semelhante em "Missão Impossível: Efeito Fallout" - 2018 e "O Agente da U.N.C.L.E." em 2015.

"Argylle" é divertido apesar de longo (2h20), cheio de reviravoltas, com um elenco de peso e explorando vários gêneros cinematográficos. Além de muito tiro, porrada e bomba, o público ainda recebe doses de comédia e até romance. 

O longa é baseado na obra homônima da escritora norte-americana Elly Conway. No filme, Elly (interpretada por Bryce Dallas Howard, da saga "Jurassic World" de 2015 a 2022) é uma renomada autora que ficou conhecida por uma série de romances de espionagem sobre o agente Argylle. 


Partindo para o quinto livro, Elly passa a ter dificuldade em dar sequência à trama de seu sua personagem. Ela sai em busca de inspiração e acaba sendo envolvida no mundo da espionagem que ela só conhecia de sua imaginação. A escritora se torna a peça-chave ao guardar informações que interessam a duas organizações secretas. 

Para solucionar o problema, ela vai contar com a ajuda do espião Aiden Wilde (Sam Rockwell, de "Três Anúncios Para um Crime" - 2018) e de seu fiel companheiro, o gato Alfie. Difícil para ela será separar seu mundo de ficção do real.


As cenas de ação predominam, mas a comédia inserida no roteiro dá um toque diferenciado. Henry Cavill como o agente arrumadinho e esticadinho (nem um fio sai do lugar durante as lutas), é quase um James Bond, com olhares e frases feitas, bem clichês, que ficam engraçadas. 

Destaque para Sam Rockwell, que faz um agente que gosta de uma boa briga, mas adora dançar (o ator sempre insere uma cena de dança em seus filmes). Sempre com uma cara boa, às vezes até boba, quando está perto de Elly.

Bryce Dallas Howard está muito bem no papel e também dá um bom toque de humor. Mas seu dublê teve bastante trabalho nas cenas de luta. A atriz, que estaria em sua terceira gravidez, segundo tabloides norte-americanos, apresenta todos os sinais de gestação, que vão se tornando cada vez mais evidentes à medida que o filme avança para o final. 


Não bastassem as fofocas e os protagonistas para atraírem o público, o longa conta ainda com um bom elenco, com nomes como Bryan Cranston (série "Breaking Bad" - de 2008 a 2012 e "Asteroid City" - 2023), Sofia Boutella ("Rebel Moon: Parte 1" - 2023), John Cena ("O Esquadrão Suicida" - 2021), Samuel L. Jackson (toda a saga com os heróis "Vingadores", desde 2008 até 2023, incluindo "Ultimato" - 2019), Ariana DeBose ("Amor, Sublime Amor" - 2021) e Catherine O'Hara ("Os Fantasmas Se Divertem" 1 e 2, que será lançado este ano).

Sofia Boutella e Samuel L. Jackson inclusive já trabalharam com o diretor Matthew Vaughn em "Kingsman: Serviço Secreto" - 2015. Ele também dirigiu "Kingsman: o Círculo Dourado" (2017) e "Kings's Man: A Origem" (2022).


Além do elenco e dos bons efeitos especiais (mesmo quando se tornam cansativos, como na luta da fumaça colorida), "Argylle - O Superespião" conta com uma ótima trilha sonora que dá o reforço necessário ao roteiro. 

Estão também entre as músicas, "Let's Dance", de David Bowie, o remix de "Suspicious Minds", de Elvis Presley e "Now and Them", dos Beatles.

O diretor Matthew Vaughn tenta novamente combinar os gêneros comédia e ação, mas desta vez ficou limitado. O roteiro de Jason Fuchs (criador da ideia original de "Mulher Maravilha" - 2017) não é tão bom como o de "Kingsman" (que inclusive é lembrado no filme), mesmo com o esforço do elenco. 

Mas vale como um bom entretenimento e para o público conferir todas as teorias loucas dos boatos sobre Taylor Swift. Alerta: tem cena pós-crédito.


Ficha técnica
Direção: Matthew Vaughn
Roteiro: Jason Fuchs
Produção: Apple Original Films, Marv Films e Cloudy Productions
Distribuição: Warner Bros. Pictures
Exibição: nos cinemas
Duração: 2h20
Classificação: 14 anos
País: Reino Unido
Gêneros: ação, suspense, comédia, espionagem

31 janeiro 2024

Destaque em premiações, “Anatomia de uma Queda” apresenta trama densa e arrebatadora

Ao suscitar reflexões complexas sobre a busca pela verdade, longa de Justine Triet vai muito além de um clássico drama de tribunal (Fotos: Diamond Films)


Carolina Cassese


Palma de Ouro em Cannes, duas estatuetas do Globo de Ouro e cinco indicações ao Oscar - inclusive o de Melhor Filme. "Anatomia de uma Queda" ("Anatomie d’une Chute"), o longa mais recente da francesa Justine Triet, definitivamente conquistou a aprovação da crítica e tem sido um dos destaques da atual temporada de premiações. Centrado na investigação de um crime, o drama, que já pode ser visto nos cinemas brasileiros, surpreende por reunir atuações ímpares e uma história arrebatadora.

Na primeira cena, vemos a autora Sandra Voyter (Sandra Hüller) falar sobre seu trabalho para Zoé (Camille Rutherford), uma estudante de pós-graduação. Enquanto isso, Samuel (Samuel Theis), o marido da escritora, está no andar de cima do chalé rústico, ouvindo música num volume ensurdecedor. Tal interferência é bastante reveladora: ele não está fisicamente na sala de estar, mas impõe sua presença ao atrapalhar a conversa das duas com o som. 


Pouco tempo depois, o marido é encontrado morto na neve, após ter aparentemente caído do sótão onde trabalhava. Porém, após investigações da polícia local, uma pergunta passará a ecoar por todo o longa: Sandra matou Samuel ou ele se jogou pela janela?

Não demoramos a ficar sabendo que o marido havia sido diagnosticado com depressão e vivia angustiado. O casal chegou a atravessar um significativo drama familiar: enquanto Samuel deveria estar vigiando o próprio filho, o menino Daniel (Milo Machado-Graner) sofreu um acidente e passou a ter complicações na visão. 


Considerando a importância do conceito de justiça para a narrativa, podemos, quem sabe, associar a limitação visual do garoto com a imagem desse princípio, que carrega uma venda nos olhos - simbolizando a imparcialidade. Mas é realmente possível (e até mesmo desejável) ser “neutro”? Ou, ao julgarmos uma situação, precisamos constantemente tomar decisões, que acabam nos comprometendo com determinado lado? 

Essas são apenas algumas das muitas perguntas que emergem a partir dos desdobramentos da trama, cujo título remonta ao clássico "Anatomia de um Crime" (1959), de Otto Preminger.

Ao longo do filme, vamos descobrindo outras informações que deixam a narrativa mais intrincada e repleta de nuances. Esse, aliás, é um dos principais méritos da produção de Triet: a história é realmente complexa e não pretende apresentar respostas prontas ou reviravoltas sem propósito. 


Muitos filmes de Hollywood nos viciaram em esperar por plot twists incessantes e extremamente reveladores; essa narrativa francesa, no entanto, nos obriga a fazer as pazes com várias camadas do indecifrável.

Nesse sentido, se os filmes "Vidas Passadas" e "Folhas de Outono" (produções que também têm se destacado na presente temporada de premiações deste ano) subvertem clichês da comédia romântica, podemos dizer que "Anatomia de uma Queda" também não se encaixa num mero estereótipo do gênero, já que o longa é muito mais do que uma típica disputa de tribunal. 

Por sinal, os franceses parecem ter uma habilidade especial para conduzirem narrativas intensas e complexas sobre julgamentos: o recente filme "A Acusação" (2022), de Yvan Attal, também apresenta cenas de tirar o fôlego e é bastante eficiente em capturar a atenção do espectador. Nos dois casos, os respectivos casos analisados servem como ponto de partida para a discussão de temas mais amplos.


Como já foi mencionado, "Anatomia de uma Queda" tem marcado presença nas premiações. No caso do Oscar, o filme foi indicado às categorias de Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Atriz, Melhor Roteiro Original e Melhor Edição. É válido assinalar ainda que a produção levou um par de estatuetas do Gotham Awards (roteiro e longa-metragem internacional) e conquistou o prêmio internacional no New York Film Critics Circle Awards. 

Boa parte da crítica destacou o trabalho de Sandra Hüller e, vale dizer, a atriz de fato impressiona ao entregar uma personagem que consegue ser, ao mesmo tempo, impetuosa e significativamente indecifrável.

A duração do filme extrapola muito as duas horas, mas há boas chances de que o público sinta esse tempo passar num piscar de olhos. O tribunal chega a um veredito, mas o espectador não necessariamente irá se convencer de que tem todas as respostas. No entanto, tal sensação não faz com que o longa seja menos satisfatório - ao embarcarmos na intensa jornada de "Anatomia de uma Queda", logo entendemos que não saber faz parte do processo.


Ficha técnica
Direção e roteiro: Justine Triet
Produção: MK2 Films, Les Films Pelléas e France 2 Cinéma
Distribuição: Diamond Films Brasil
Exibição: nos cinemas
Duração: 2h30
Classificação: 16 anos
País: França
Gêneros: crime, suspense, policial, drama