09 março 2024

"Ficção Americana" é uma crítica à exploração de clichês e estereótipos negros

Filme baseado no romance "Erasure" (2001), de Percival Everett, tem Jeffrey Wright como protagonista e concorrendo ao Oscar 2024 (Fotos: Amazon Prime)


Silvana Monteiro e Jean Piter


Com uma perspectiva étnico-racial, "Ficção Americana", disponível no Prime Vídeo, busca entreter por meio de sátira e crítica aos clichês e estereótipos negros explorados pela indústria cultural para atrair público e alcançar sucesso. As brilhantes atuações renderam reconhecimento do longa, dirigido por Cord Jefferson, em importantes categorias do Oscar 2024, com indicações para Melhor Filme, Melhor Roteiro Adaptado e Melhor Trilha Sonora Original.

Com um enredo envolvente e peculiar, "Ficção Americana" retrata a luta de Thelonious "Monk" Ellison (interpretado por Jeffrey Wright), um brilhante escritor negro em busca da forma ideal para entrar no fluxo editorial que o leve a ser mais valorizado. 

A habilidade de Wright em dar vida a Monk é impressionante, o que lhe rendeu uma indicação ao Oscar de Melhor Ator. O diretor Cord Jefferson soube explorar com louvor as expressões, sentimentos e conexões sociais do protagonista.


Outro que merece destaque é Sterling K. Brown, indicado na categoria de Melhor Ator Coadjuvante. O ator é conhecido por sua excepcional performance como Randall Pearson na série "This is Us" (2016-2022), em exibição no Star+. 

São marcantes também as presenças de Issa Rae, a poderosa criadora da série da HBO, "Insecure”, de Erika Alexander (2016-2021), e Tracee Ellis Ross, da série “Black-Ish” (2014-2022), exibida no Disney+, que elevam a narrativa a outros patamares.

O filme é baseado no aclamado romance "Erasure" de Percival Everett, publicado em 2001. Monk cada vez mais frustrado com sua carreira e enfrentando desafios com sua mãe, recebe a ordem de escrever algo "mais negro" e decide redigir um livro sob um pseudônimo. 


Nessa obra, ele explora, ao extremo, todos os clichês e estereótipos negros, seguindo uma fórmula que observou ter funcionado para outros escritores negros, como Sintara Golden, interpretada por Issa Rae. 

No entanto, para sua surpresa e conflito moral, aquilo que ele escreveu com deboche, proporciona sucesso estrondoso a seu livro e faz com que ele se torne "a obra do ano".

"Ficção Americana" cativa os espectadores com uma narrativa poderosa, abordando críticas étnico-raciais e socio-raciais, além de dilemas moral e ético. É um filme que desafia convenções e levanta questões importantes sobre a representação do negro, sobretudo nos mercados editorial e cinematográfico, e a exploração dessa temática em busca de sensacionalismo e sucesso hollywoodiano.


A narrativa aborda, de maneira sutil, a questão da diversidade e inclusão, consideradas como a nova responsabilidade social. O chamado “tokenismo”, em que os mercados cultural e editorial enfatizavam a inclusão de negros, porém, muitas vezes, com a presença de apenas um indivíduo, e frequentemente retratado com estereótipos. 

A obra é uma crítica aberta à chamada “lavagem da diversidade”, quando essas iniciativas são tratadas de maneira superficial, como mera obrigação legal, sem um compromisso real com a diversidade e inclusão.

Há também o destaque à linha tênue entre o mercado cultural e de entretenimento, destacando que o segundo busca apenas lucro, sem preocupação com a quebra de estereótipos ou reflexões mais profundas. Isso é evidenciado na forma como as editoras e produtoras buscam apenas o lucro ao adaptar obras para o cinema, sem considerar aspectos culturais mais profundos.


O filme também critica a forma como se espera que as histórias escritas ou protagonizadas por negros sejam limitadas a estereótipos, sem espaço para narrativas que fujam desses padrões. 

A genialidade da trama reside nos recursos inventados por Monk para se manter oculto como autor da aclamada obra, e nos desafios complexos que ele enfrenta como consequência da piada que o torna famoso.

As cenas discursivas com diálogos afiados e satíricos são elementos marcantes que permeiam toda a narrativa. Laura Karpman, a mente por trás da trilha sonora, adotou uma abordagem inovadora ao se inspirar no livro que deu origem ao filme. Ela incluiu trechos instrumentais melancólicos conexos a pitadas de jazz. Uma escolha musical que se integrou perfeitamente à atmosfera do filme. 

"Ficção Americana" vale muito a pena, para negros e não negros, mas principalmente para aqueles que desejam ampliar seu letramento racial e apreciar enredos provocativos.


Ficha técnica
Direção: Cord Jefferson
Produção: MGM Studios
Exibição: Prime Video
Duração: 1h58
Classificação: 16 anos
País: EUA
Gêneros: comédia, drama

06 março 2024

Comédia “Os Farofeiros 2” aposta na popularidade do primeiro filme

A viagem do grupo de amigos de empresa para um resort na Bahia tem tudo para dar errado
novamente (Fotos: Camisa Listrada)



Eduardo Jr.


Após uma viagem recheada de problemas, Lima, Alexandre, Rocha e Diguinho estão de volta. Em “Os Farofeiros 2”, o diretor Roberto Santucci agora coloca os quatro colegas de trabalho e suas famílias em uma viagem à Bahia. Distribuído pela Downtown Filmes, o longa chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (7), trazendo piadas que fazem o público se identificar. 

A equipe do Cinema no Escurinho acompanhou a pré-estreia em uma das salas da rede Cineart, e observou uma plateia reagindo bem ao roteiro de Paulo Cursino - que também escreveu para o primeiro filme da franquia. 

Desta vez, a trama tem como ponto de partida a tentativa de Alexandre (Antônio Fragoso) de resgatar a popularidade junto à sua equipe de trabalho, e assim conseguir um cargo mais alto na empresa. 


Ao ganhar uma viagem, o gerente é convencido pela chefe a dividir o prêmio com os colegas, como forma de reconquistá-los. E claro, a temporada em um resort de luxo se transforma em uma farofada (daquelas com situações com as quais muita gente vai se identificar). 

Mas a comédia demora um pouquinho pra conquistar as primeiras risadas, porque começa com os filhos dos protagonistas na escola, convocados pela diretora para explicar porque apresentaram redações idênticas sobre suas férias. Serão eles os narradores dos eventos na Bahia. 

Do conhecido elenco, Lima (Maurício Mafrini), Jussara (Cacau Protásio) e Rocha (Charles Paraventi) conduzem muito bem a comédia. Danielle Winits segue como a madame histriônica, usando caras e bocas (até demais, diga-se de passagem). 

Em contrapartida, o Alexandre vivido por Fragoso não arranca risos. Seu resgate de popularidade fica em segundo plano. 


O mesmo acontece com as personagens Vanete (Elisa Pinheiro), Ellen (Aline Campos) e Diguinho (Nilton Bicudo). Este último está altamente paranoico com a pandemia - deixando margem para questionamentos sobre fazer piada com o Covid-19. 

Outro ponto de gosto duvidoso é a construção de piadas sobre a personagem Darcy (Sulivã Bispo). A despachada gerente do resort é uma mulher trans, e a direção optou por tentar fazer graça com a dificuldade das famílias em saber qual pronome usar para se referir a ela, e sobre o incômodo das esposas em dividir espaço na sauna com a funcionária. 


Apesar desses pontos que podem soar como “contras” da produção, as piadas “de tiozão”, a entrada de figuras como o ótimo personagem Edvan e o uso de paródias de outros filmes colocam “Os Farofeiros 2” com grandes chances de repetir o sucesso de bilheteria do primeiro longa e de cair nas graças do público. 

Curiosidades

- "Os Farofeiros", de 2018, esteve no topo das bilheterias, atraindo mais de um milhão de espectadores. 

_ O primeiro filme estreou há exatos seis anos e repete agora o mesmo elenco. 

- O diretor Roberto Santucci também assina este longa, além de outros sucessos da comédia nacional como “De Pernas para o Ar” (2010), "O Porteiro" (2023) e a trilogia “Até Que a Sorte nos Separe” (2012 a 2015).


Ficha técnica:
Direção: Roberto Santucci
Produção: Camisa Listrada, com coprodução Globo Filmes, Globoplay, Telecine e Panorama Filmes
Distribuição: Downtown Filmes
Exibição: nos cinemas
Duração: 1h44
Classificação: Livre
País: Brasil
Gêneros: Comédia, família