06 abril 2024

"A Saudade que Fica" é amor transcendental e o poder transformador da arte e do cinema

Drama japonês dirigido por Michihito Fujii emociona e nos faz questionar os limites entre a vida e a morte (Fotos: Netflix)


Silvana Monteiro


Procura um filme que, com certeza, vai te fazer chorar? Então vale a pena conferir "A Saudade que Fica" ("The Parades"). Dirigido por Michihito Fujii e exibido na Netflix, o longa japonês aborda temas como amor transcendental, separação terrena, luto, perdão e cura dos traumas materiais e espirituais, com sensibilidade e profundidade.

A narrativa nos faz questionar os limites entre a vida e o que ocorre após morrermos. Como seria se pudéssemos continuar algumas atividades após a morte? E se fosse possível proteger os entes queridos, pedir perdão ou perceber aspectos que não foram vistos em nossa personalidade?


Após uma calamidade devastadora, Minako (Masami Nagasawa) procura pelo filho desaparecido, até descobrir que está morta. Ela embarca em uma jornada emocional em busca de seu filho, Ryo. Sua inquietação é marcada por sua incapacidade de interagir com os vivos, o que intensifica sua dor.

Minako é resgatada e levada a um bucólico "parque de diversões” de um vilarejo remoto, onde encontra outros espíritos “vivenciando” situações que os mantêm ligados a esta dimensão. A conexão entre eles resulta em uma colaboração mútua e ajuda emocional. Será que Minako vai encontrar Ryo? Ele está vivo? Onde ele está? Como vai ser esse encontro?


Aos poucos, de uma forma surpreendente, o enredo vai revelando acontecimentos paralelos à peregrinação noturna dessas almas. É interessante como não se formam vilões e nem heróis. O drama humaniza as ações e reações, o que o torna especial. 

As tramas intricadas e os planos mirabolantes do cineasta Michael (interpretado por Lily Franky), as observações e escritos do jovem Akira (Kentaro Sakaguchi), a contemplação familiar de Kaori (Shinobu Terajima), o passado conturbado de Shori (Ryūsei Yokohama) e as angústias da jovem Nana (Nana Mori) são apresentados com uma sensibilidade tão envolvente que até os eventos mais intensos são suavizados para o espectador.


O ponto alto reside nas narrativas entrelaçadas, que se desdobram como histórias dentro da história. Através de uma sessão de cinema e da produção de um filme, as narrativas desses espíritos são revividas, reinterpretadas e libertas. Um plot twist arrebatador diferencia o filme das abordagens convencionais sobre temas espíritas.

A fotografia é espetacular com destaque para as cenas que mostram o mar e o ambiente confortavelmente iluminado e bucólico onde se encontram os espíritos.


Apesar das mais de duas horas de filme, as referências entre nossas vidas e a construção e finalização de uma obra cinematográfica deixam tudo mais leve e saboroso. 

"A Saudade que Fica" é um testemunho do poder do cinema em explorar temas profundos e complexos, oferecendo uma perspectiva única sobre a vida, a morte e o que pode existir além. Sente-se confortavelmente e prepare os lenços.


Ficha técnica:
Direção e roteiro: Michihito Fujii
Produção: Babel Label
Exibição: Netflix
Duração: 2h12
Classificação: 14 anos
País: Japão
Gêneros: drama, família

04 abril 2024

"Uma Família Feliz" - Não se deixe enganar pelas aparências

Grazi Massafera e Reynaldo Gianecchini protagonizam este thriller nacional muito bem produzido
 (Fotos: Globo Filmes)


Marcos Tadeu
Narrativa Cinematográfica


Grazi Massafera e Reynaldo Gianecchini são as estrelas do ótimo longa "Uma Família Feliz", que estreia nesta quinta-feira (4) nos cinemas brasileiros, sob a direção de José Eduardo Belmonte. Ele conta com o escritor e roteirista Raphael Montes (da série "Bom Dia, Verônica") como diretor-assistente. O filme, com produção da Barry Company, tem coprodução com a Globo Filmes e Telecine e distribuição da Pandora Filmes.

Na trama, conhecemos Eva (Massafera), uma artista que cria bebês realistas como forma de arte, enquanto Vicente (Gianecchini) é um corretor bem-sucedido no mercado de ações. O casal tem duas filhas fofas, Ângela e Sara, e Eva está à espera de Lucas. A artista se depara com a angústia da depressão pós-parto em meio a uma vida burguesa supostamente perfeita.


Desde o início, a fotografia e o design de produção destacam como essa família aparenta viver bem e feliz, com um ambiente limpo, jantares fartos, coisas grandes e um carro espaçoso - um modelo de vida perfeita que toda família deseja ter. 

No entanto, as coisas começam a desmoronar quando ferimentos são encontrados no pequeno Lucas e em uma das filhas, levando Eva a questionar sua conduta como mãe e suas relações com os filhos. 

O bebê começa a preferir o pai e rejeita até o leite de Eva. A matriarca, apresentada com uma potência corporal marcante na história, decide tomar medidas para descobrir quem está prejudicando sua família, transitando entre a loucura e a vida perfeita mostrada para a sociedade. 


Grazi Massafera entrega uma de suas melhores atuações após o sucesso na série de TV "Verdades Secretas", com sua personagem Larissa. Reynaldo Gianecchini como Vicente é o típico "paizão", porém passivo-agressivo com sua esposa. A combinação dos dois funciona muito bem e eleva ainda mais a qualidade da obra. 

O filme possui todos os elementos de suspense e mistério de um thriller americano, com o final no começo, um mistério a ser resolvido e as entrelinhas das relações entre os personagens transmitindo muito com poucas palavras. 


Além disso, a questão de uma família burguesa e idealizada com pompa, mas disfuncional devido aos seus mistérios e entrelinhas é outro charme da história. 

No fim das contas, trata-se de questionar que nem tudo é o que parece e que as aparências realmente enganam. Belmonte conduz esses elementos com maestria em uma sinfonia de pompa e caos ao mesmo tempo.

"Uma Família Feliz" sem dúvida entra para a lista dos bons thrillers nacionais e, arrisco dizer, em listas de melhores do ano para aqueles que apreciam o cinema brasileiro. Um filme que questiona os ricos e seus modelos familiares, que vale o ingresso, a pipoca e a discussão pós-filme.


Ficha técnica:
Direção: José Eduardo Belmonte
Roteiro e história original: Raphael Montes
Produção: Barry Company, coprodução da Globo Filmes e Telecine
Distribuição: Pandora Filmes
Exibição: nos cinemas
Duração: 1h57
Classificação: 16 anos
País: Brasil
Gêneros: suspense, drama