25 dezembro 2024

"O Auto da Compadecida 2" - uma sequência de nostalgia, diversão e uma forte amizade

Matheus Nachtergaele e Selton Mello retornam com seus carismáticos personagens João Grilo e Chicó
(Fotos: Laura Campanella)


Maristela Bretas


Passados 25 anos desde o filme original, estreia nesta quarta-feira de Natal a tão esperada produção "O Auto da Compadecida 2". Mesmo não havendo uma sequência da obra literária de Ariano Suassuna, o novo filme buscou no original - "O Auto da Compadecida" (2000) - o que havia de melhor. 

A começar por João Grilo (Matheus Nachtergaele) e Chicó (Selton Mello), que retorna com mais emoção, piadas, golpes e uma amizade ainda mais forte. A dupla entrega tudo o que era esperado, com ótimas atuações, criando situações cômicas e emocionantes que fazem até um cisco cair nos olhos. 


Nem o tempo foi capaz de separar estes dois carismáticos trambiqueiros. A cumplicidade e a sintonia dos dois atores é o forte de toda a história. Desaparecido por 20 anos desde que partiu após sua ressurreição graças à intervenção de Nossa Senhora, João Grilo retorna a Taperoá e encontra o velho companheiro Chicó. 

Ele vive da venda de santinhos esculpidos em madeira e de versos que contam a história do milagre do amigo que voltou da morte e agora é considerado quase um santo pelo povo. É Chicó quem narra toda a trama, em prosa e verso.


A dupla vai aproveitar para tirar proveito disso, se envolvendo na política local, usando umas "técnicas" novas que João Grilo aprendeu durante o tempo que viveu no Rio de Janeiro. Tudo com muito humor, piadas novas e velhas e a simplicidade que é a marca dos dois personagens.

A fama de João Grilo passa a ser cobiçada pelos dois políticos que disputam a prefeitura da mítica cidade, Coronel Ernani (Humberto Martins) e o comerciante Arlindo (Eduardo Sterblitch) como principal cabo eleitoral.


Já Chicó continua com suas mentiras e assumidamente um covarde de carteirinha, sempre se envolvendo em confusões amorosas perigosas e de sua capacidade de fazer todo "causo" virar um verso. Como "não sei, só sei que foi assim". 

Os diretores Guel Arraes e Flávia Lacerda utilizam muito bem os efeitos gráficos para apresentar a literatura de cordel nas histórias "espantosas, divertidas, trágicas e jamais imaginadas" de Chicó.


Além destes novos integrantes, o elenco também recebeu novos personagens e perdeu grandes nomes do filme anterior. Nossa Senhora/Compadecida agora é interpretada por Taís Araújo, que substitui Fernanda Montenegro. A atriz tem boa atuação, mas a responsabilidade de ocupar o lugar da maior atriz brasileira é grande demais.

Também estão no elenco Virgínia Cavendish, como Rosinha, mulher de Chicó; Fabiúla Nascimento, a Clarabela, filha do Coronel Ernani; Luis Miranda, no papel de Antônio do Amor, amigo carioca e trambiqueiro de João Grilo, entre outros. 


Outro que retorna, com mais destaque e boa atuação é Enrique Diaz, o Joaquim Brejeiro, agora capanga do Coronel após a morte do cangaceiro Severino, interpretado por Marco Nanini. 

Apesar de seguir bem a fórmula do primeiro, o brilho não é o mesmo, possivelmente por causa da troca do elenco e de ser uma história que não foi criada por Suassuna. Mas nem por isso o roteiro deixa de seguir a cartilha crítica e cômica de Ariano, explorando questões sociais profundos do cotidiano do povo do sertão nordestino, como a miséria e a exploração da fé.


Outro ponto forte do filme é a belíssima trilha sonora, composta por João Falcão e Ricco Vianna, que conta com Maria Bethânia interpretando lindamente a canção "Fiadeira", do pernambucano Juliano Holanda. "Canção da América", de Milton Nascimento e Fernando Brant, em gravação inédita na voz do pernambucano João Gomes, também é outro destaque. 

Até "Como Vai Você", sucesso de Roberto Carlos, cantada por Chico César (mas sem o romantismo do Rei) está entre as composições, que passam pelo baião, forró e samba-choro, muitas delas gravadas por artistas nordestinos.

"O Auto da Compadecida 2" é bacana, divertido e vale pela emoção do reencontro dos personagens de Matheus e Selton, que recebem um encerramento digno da obra do grande escritor e filósofo paraibano. 


Ficha técnica:
Direção: Guel Arraes e Flávia Lacerda
Roteiro: Guel Arraes e João Falcão, com colaboração de Adriana Falcão e de Jorge Furtado
Produção: Conspiração, H2O Produções, Guel Produções
Distribuição: H2O Films
Exibição: nos cinemas
Duração: 1h54
Classificação: 12 anos
País: Brasil
Gêneros: comédia, drama

20 dezembro 2024

"Mufasa: O Rei Leão" - uma emocionante história de legado e pertencimento

Live-action supera a produção anterior e entrega uma narrativa original e bem estruturada, com elementos inéditos (Fotos: Walt Disney Pictures)


Marcos Tadeu
Parceiro do blog Jornalista de Cinema


Com direção de Barry Jenkins, estreou nos cinemas "Mufasa: O Rei Leão" ("Mufasa: The Lion King"), o live-action da Disney tão esperado para este ano. Explorando a história de origem do icônico pai de Simba, o filme se propõe a aprofundar a mitologia por trás do universo iniciado com "O Rei Leão" em 2019. 

A narrativa acompanha Mufasa em sua juventude, superando uma infância difícil para se tornar o lendário líder da Pedra do Reino. Órfão e sem rumo, ele forma uma amizade improvável com Taka, um carismático herdeiro real. 


Juntos, eles enfrentam desafios que moldam suas personalidades e definem seus futuros. Essa relação, além de revelar as semelhanças e diferenças entre os dois, dá origem a eventos que culminam no conflito central da franquia.

O diretor acerta ao trazer novidades para a franquia, corrigindo os erros do remake de 2019, com uma narrativa original e bem estruturada. O filme apresenta elementos inéditos, como a criação da Pedra do Reino, a transformação de Taka em Scar e o início do relacionamento de Mufasa com Sarabi. Esses detalhes são trabalhados de forma orgânica, enriquecendo a história e oferecendo novas camadas ao universo já conhecido.


As vozes do elenco da versão original são um dos destaques, incluindo Aaron Pierre, como Mufasa; Beyoncé (Nala); Mads Mikkelsen, como o vilão Kiros; Tiffany Boone (Sarabi), além da dupla Seth Rogen (Pumba) e Billy Eichner (Timão); Blue Ivy Carter, a filha de Beyoncé (dando voz a Kiara); Kelvin Harrison Jr. (Taka/Scar); John Kani (Rafiki) e Donald Glover, como o jovem Simba.

O roteiro de Jeff Nathanson utiliza paralelos com a obra original para desenvolver seus personagens. A amizade entre Mufasa e Taka, por exemplo, remete à relação de Simba e Nala, mas com um tom mais maduro e dramático. 

Essa construção cuidadosa destaca como desafios e escolhas moldaram não apenas os protagonistas, mas todo o cenário político e emocional da Pedra do Reino.


A fotografia de James Laxton é um dos pontos altos do filme, com paisagens exuberantes e detalhes impressionantes dos felinos, enquanto a direção de arte de Dan Webster presta uma bela homenagem ao clássico. Os cenários e a ambientação são ricos em detalhes e ajudam a transportar o público para o coração da savana.

Barry Jenkins explora temas importantes como legado e pertencimento, centrando a narrativa na busca de Mufasa por propósito e unidade em um mundo cheio de desafios. O vilão Kiros, também se destaca ao trazer complexidade e ambição à trama.

Mesmo seguindo a fórmula clássica de vingança da franquia, ele se apresenta como um adversário formidável para Mufasa, com uma história bem construída que sustenta suas motivações.


No entanto, o filme apresenta algumas falhas. As músicas adicionais interpretadas por Lin-Manuel Miranda, embora agradáveis, não têm o mesmo impacto memorável das trilhas sonoras das produções anteriores. 

Além disso, as intervenções cômicas de Timão e Pumba, embora divertidas, muitas vezes quebram o ritmo emocional da história com o personagem título.

Outro ponto fraco é a relação de Simba com Kiara, que deixa lacunas no roteiro, especialmente nos momentos envolvendo a leoa e sua família.


Apesar desses problemas, "Mufasa: O Rei Leão" entrega uma experiência criativa e emocionante, expandindo a mitologia da franquia de forma ousada. É um presente para os fãs e um exemplo de inovação, diferente de sequências como "Divertida Mente 2" e "Moana 2" que seguiram fórmulas previsíveis.

Ao explorar as origens de Mufasa, a Disney demonstra que ainda  há espaço para surpresas e histórias envolventes nesse universo tão amado.


Ficha técnica:
Direção: Barry Jenkins
Roteiro: Jeff Nathanson
Produção: Walt Disney Pictures, Fairviem Entertainment
Distribuição: Disney Pictures
Exibição: nos cinemas
Duração: 1h58
Classificação: 10 anos
País: EUA
Gêneros: live-action, aventura, musical, família