08 janeiro 2025

“Baby” marca retorno de cineasta mineiro em obra tocante

Produção vem conquistando diversas premiações em festivais nacionais e internacionais (Fotos: Aline Arruda e Joana Luz )


Eduardo Jr.


O diretor mineiro Marcelo Caetano está de volta às telonas, sete anos depois. Desta vez, “Baby” é o nome da obra, que tem estreia prevista para o dia 9 de janeiro de 2025, com distribuição pela Vitrine Filmes. 

“Baby” é uma ficção que mostra a busca por um lugar no mundo do jovem Wellington (João Pedro Mariano), de 18 anos, recém-saído de um centro de detenção juvenil. 

É quando conhece Ronaldo (Ricardo Teodoro), um garoto de programa que dá a ele o apelido de Baby, o ensina como sobreviver nas ruas e se torna para ele um símbolo de relacionamento (ou de paternidade).  


Assim como em “Corpo Elétrico” (2017), primeiro filme de Caetano, “Baby” também é um drama de cotidiano. Sem a localização da família, Baby só tem os amigos das ruas, a comunidade LGBT. 

Está aí um dos méritos do longa: apresentar a luta diária do grupo por respeito e sobrevivência, sem repetir abordagens já desgastadas. 


Apesar de o cenário ser constituído, em boa parte, por recortes que criam uma São Paulo hostil, as personagens não exprimem a maldade do ambiente. 

Trazem até o elemento da espontaneidade na interpretação, o que parece ser algo que o diretor admira, já que se pode observar isso também nas atuações do elenco de “Corpo Elétrico”. 


Vale destacar que essa espontaneidade de parte do elenco não compromete a obra. João Pedro Mariano e Ricardo Teodoro imprimem na medida necessária o drama, a ira, a doçura, a frustração, o ciúme, a cumplicidade… 

Talvez essa variedade de sentimentos, de possibilidades, explique um pouco o sucesso do longa, que já vem colhendo prêmios por aí. 

"Baby" foi selecionado para a 63ª Semana da Crítica do Festival de Cannes em 2024. Mas já garantiu várias premiações a seus integrantes. Marcelo Caetano foi vencedor de Melhor Direção no Festival do Rio e nos festivais queer MixBrasil e LesGaiCineMad (Madri). 


João Pedro Mariano foi escolhido Melhor Ator no Festival do Rio e Melhor Interpretação no Mix Brasil. Já Ricardo Teodoro levou a estatueta de Ator Revelação na Quinzena dos Cineastas de Cannes e Melhor Ator Coadjuvante no Festival de Huelva. 

Esta não é uma produção a disputar espaço numa lista de Oscar como “Ainda Estou Aqui”, mas é tocante, entretém, cativa e pode ser mais um exemplo de como o cinema nacional pode ser importante para debater pautas como ressocialização, solidariedade, combate a preconceitos e novas configurações familiares (evidenciado pelo núcleo da ótima - e quase irreconhecível - Bruna Linzmeyer).  


Ficha técnica:
Direção: Marcelo Caetano
Roteiro: Marcelo Caetano e Gabriel Domingues
Produção: Cup Filmes, Desbun Filmes, Playeau Produções, Still Moving (França), Circe Films, Kaap Holland (Holanda)
Coprodução: SPCine, Vitrine Filmes, Canal Brasil, Telecine
Distribuição: Vitrine Filmes
Classificação: 18 anos
Duração: 1h47
Exibição: Una Cine Belas Artes
Países: Brasil, França, Holanda
Gêneros: drama, romance

07 janeiro 2025

A histórica e inédita conquista do Globo de Ouro 2025

Elenco e diretor do filme na cerimônia de entrega do Globo de Ouro (Fotos: Globo de Ouro - Shayan Asgharnia)


Silvana Monteiro

Em 1986, Fernanda Torres alcançou um feito histórico ao conquistar o prêmio de Melhor Atriz no Festival de Cannes, tornando-se a atriz brasileira mais jovem a receber essa honraria. Sua performance visceral no filme 'Eu Sei Que Vou Te Amar", dirigido por Arnaldo Jabor, conquistou não apenas o coração dos jurados, mas também deixou uma marca indelével no cenário do cinema internacional. 

Quase quatro décadas depois, em 2025, Fernanda adicionou outro marco memorável à sua história ao vencer o Globo de Ouro. No domingo, 5 de janeiro de 2025, a atriz foi consagrada como Melhor Atriz em Filme de Drama no Globo de Ouro por sua interpretação de Eunice Paiva em "Ainda Estou Aqui". 

                  

Único filme nacional entre o top 10, com mais de 3 milhões de ingressos vendidos, fechou 2024 como a quinta maior bilheteria do ano. Leia a crítica no blog clicando aqui.

Essa conquista histórica foi celebrada com ares de festa nacional e gerou especulações imediatas sobre sua possível inclusão na lista de indicados ao Oscar. 

Embora o Globo de Ouro tenha perdido parte de sua relevância como termômetro para o Oscar - ultrapassado pelas premiações dos sindicatos de atores, produtores, roteiristas e diretores -, é inegável que a vitória trouxe visibilidade global para a atriz brasileira.

Fotos do filme "Ainda Estou Aqui": Alile Dara Onawale

A caminho do Oscar?

Historicamente, apenas duas vencedoras de Melhor Atriz em Filme Dramático no Globo de Ouro ficaram fora da lista final do Oscar: Shirley MacLaine por "Madame Sousatzka" (1989) e Kate Winslet por "Foi Apenas Um Sonho" (2009). 

No entanto, a ausência de Fernanda Torres nas indicações ao Critics Choice Awards e na pré-lista do BAFTA lança uma dúvida sobre sua presença na cerimônia da Academia de Hollywood. Ainda assim, sua atuação em "Ainda Estou Aqui" é amplamente reconhecida como uma das mais impactantes do ano. 


Uma carreira repleta de marcos

Filha das lendas da dramaturgia brasileira Fernanda Montenegro e Fernando Torres, Fernanda cresceu imersa em um ambiente artístico. Desde cedo, demonstrou que o talento corria em suas veias. Sua estreia no cinema aconteceu com "A Marvada Carne" (1985), obra que já evidenciava sua habilidade em interpretar personagens complexos e autênticos.

Foi em "Eu Sei Que Vou Te Amar", porém, que Fernanda consolidou seu lugar entre os grandes nomes do cinema mundial. Contracenando com Thales Pan Chacon, deu vida a uma mulher que revisita sua relação amorosa em uma narrativa crua e intensa. Sua atuação, cheia de nuances, encantou audiências e críticos, rendendo comparativos com grandes estrelas do cinema europeu.

"Eu Sei Que Vou Te Amar" (Divulgação)

Conexão pessoal com o Globo de Ouro

A vitória de Fernandinha no Globo de Ouro por "Ainda Estou Aqui" é um testemunho de sua versatilidade e habilidade de transitar entre gêneros como drama, comédia e teatro.

Além disso, a conquista carrega um simbolismo especial: 25 anos atrás, sua mãe, Fernanda Montenegro, esteve entre as indicadas ao mesmo prêmio por Central do Brasil, mas não levou a estatueta. Agora, a filha fecha esse ciclo com uma memorável vitória.

Walter Salles e Fernanda Torres

Multifacetada e inquieta

Ao longo de sua trajetória, Fernanda Torres acumulou experiências que vão além da atuação. Seja na TV, no teatro ou no cinema, ela continua sendo uma referência para novas gerações de artistas. Recentemente, também tem se destacado como escritora, trazendo ao público textos que combinam humor e reflexão sobre a sociedade contemporânea.

Se o Globo de Ouro celebra trajetórias icônicas e talentos únicos, Fernanda Torres representa exatamente isso. Com a estatueta agora em sua prateleira, sua experiência, respaldada pela conquista, de fato transcenderá o tempo e as fronteiras.


O valor histórico e social de "Ainda Estou Aqui"

Adaptado do livro homônimo de Marcelo Rubens Paiva, "Ainda Estou Aqui" é uma obra que resgata a importância da memória, da família e da resiliência. Mesclando autobiografia e biografia, o filme retrata a história de Eunice Paiva, mãe do autor, enquanto reflete sobre o contexto histórico e social brasileiro.

A narrativa relembra os anos de chumbo da ditadura militar no Brasil, expondo o impacto pessoal e familiar da repressão. Eunice enfrentou a perda do marido, Rubens Paiva, um político torturado e desaparecido pelo regime militar. 

Mesmo diante dessa tragédia, ela mostrou coragem ao criar os filhos sozinha e lutar por justiça. A história ressalta o papel das mulheres na resistência e reconstrução social.


O filme também explora a relação de Marcelo com sua mãe durante sua batalha contra o Alzheimer, sensibilizando o público para a importância do cuidado com idosos e da empatia diante de doenças neurodegenerativas.  

Além disso, faz um apelo pela busca da verdade e reparação em relação aos desaparecidos políticos, reforçando a importância de manter viva a memória histórica para evitar a repetição de erros no futuro.

"Ainda Estou Aqui" transcende sua condição de uma história íntima e se torna um retrato do Brasil, da luta por direitos humanos e da capacidade de seguir em frente mesmo nas situações mais adversas.